Som binaural
Música alucinógena é mito
Músicas que teriam o poder de alterar a frequência cerebral e fazer com que o ouvinte atinja diversos estados de consciência, como sono e euforia. Essa é a promessa das chamadas "músicas alucinógenas", que têm seu maior representante no site norte-americano I-Doser, que vende o download dessas "faixas musicais", com duração de 15 a 30 minutos, em média. As três primeiras são de graça, logo que o usuário faz o cadastro no site. Uma comunidade do site no Orkut tem 14.630 membros e algumas faixas, como Gates of Hades e Hands of God, já são populares entre os internautas.
A grande maioria das pessoas que experimenta e deixa seus comentários nos sites de relacionamento diz não ter sentido absolutamente nada. Outras aproveitam para fazer graça com o assunto. "A única coisa que me aconteceu foi entupir o meu ouvido", diz um internauta no Orkut. "Se vc curte o zunido binaural da geladeira e acha q dá até barato, join", diz a descrição de uma comunidade.
A "viagem" teria um fundo científico e seria formada de dois sons de frequências similares que se misturam e criam um terceiro, com uma frequência intermediária, que receberia o nome de som binaural.
Em agosto, a reportagem do Washington Post foi atrás de alguns especialistas para saber os reais efeitos da prática. Nada. A professora assistente da Universidade de Saúde e Ciência de Oregon, Helane Wahbeh, fez um estudo com quatro pessoas e não constatou qualquer mudança nas ondas cerebrais. O neurocientista Daniel Levitin, da Universidade McGill, de Montreal, no Canadá, também não sentiu nada. Ele mesmo experimentou algumas dessas músicas antes da entrevista. "A ideia de que esses sons binaurais causariam estados que imitariam os efeitos das drogas não tem qualquer fundamento científico. Simplesmente não existe qualquer mecanismo que fizesse isso funcionar", afirmou o especialista ao jornal.
Inconsequentes
Por que se arriscar assim?
Comportamentos típicos da fase adolescente, como a vontade de ser aceito em um grupo, ainda são uma das explicações para os jovens se arriscarem em experiências como o "vodka eyeballing". Para o psicólogo e professor da disciplina de Desenvolvimento do Adolescente do curso de Psicologia da Universidade Tuiuti do Paraná Luiz Henrique Ramos, a internet em si não é a vilã, mas um fenômeno contemporâneo e crescente, que tem pontos positivos e negativos. No aspecto negativo, é um meio que pode dar vazão a ações de pessoas transtornadas, adultas ou não, que tentarão influenciar outras. "E quem tem uma mentalidade frágil pode sucumbir a certas sugestões."
O psicólogo Antônio Carlos Moreira diz que a origem de uma mente frágil está na falta de limites, gerada por pais que se sentem culpados por estarem ausentes e dão abertura demais aos filhos. "A falta de diálogo leva o jovem a buscar respostas fora de casa. E hoje as influências mais próximas são o celular e a internet. Quando eles começam a enfrentar as dificuldades da vida adulta, percebem que os limites existem. A própria natureza, por vezes, se encarrega de mostrar esses limites." Para os dois profissionais, a construção de "anticorpos" para uma mente forte seria de responsabilidade da família. "A presença de pais é o fator fundamental para se criar um jovem com uma mente organizada", diz Ramos.
Que uma parte dos jovens é inconsequente e faz loucuras em busca de novas sensações todo mundo sabe. Mas que alguns realmente estejam aderindo a duas práticas bizarras, sugeridas na internet, parece mentira. Desde o início de 2010, uma atitude polêmica vem estampando jornais do Brasil e de fora: o "vodka eyeballing" ou ingestão de vodca pelo olho, o que daria "um barato" mais rápido.
Em uma busca rápida na internet, 65 vídeos com pessoas pingando vodca no olho ou discutindo sobre o ato aparecem no Youtube. No Orkut são 48 tópicos de discussão e uma comunidade sobre a prática. E no Facebook quase 100 pessoas "curtiram" um tópico sobre o assunto. A grande maioria brinca com o tema, mas não cogita experimentar.
A origem da prática é controversa. Jornais americanos apontam as faculdades e pubs londrinos. Os veículos do Reino Unido, por sua vez, indicam que a prática começou com garçonetes e atendentes de bares em Las Vegas, em busca por gorjetas.
O problema é que, ao contrário das chamadas "músicas alucinógenas", que surgiram na web há cerca de três anos e continuam a angariar curiosos (leia mais nessa página), o "vodka eyeballing" tem consequências sérias. No mês passado, dois jovens foram atendidos no Instituto Penido Burnier, instituição de Campinas, após terem derramado vodka nos olhos, influenciados por dezenas de vídeos no Youtube.
Há algumas semanas, a Agência Estado noticiou que um deles, um estudante de Economia de 23 anos, terá de fazer um transplante de córnea porque teve a visão reduzida a 5% após pingar vodca no olho com uma colher. Ele já estava bêbado quando pingou a bebida e diz não ter percebido nada na hora, pensou que a visão estivesse turva por causa do seu problema antigo de visão.
O outro foi um estudante de administração de 21 anos, que reclamou que estava com a visão turva. "Eu achei estranho, parecia uma queimadura. Mas eles não falavam o que houve. Espremi, espremi e depois de um tempo o garoto me contou", disse o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, que atendeu o estudante. O rapaz fez um tratamento com colírios anti-inflamatórios e lentes de contato terapêuticas, mas ainda não está enxergando 100%. Alguns meses antes, em maio, o Daily Mail, da Inglaterra, trouxe uma história parecida, de uma jovem de 19 anos que teria experimentado a "brincadeira" na universidade e agora sofre com dores e teve uma parte da visão do olho esquerdo perdida.
Curitiba
A prática parece não ter chegado por aqui ainda. Ao menos, nenhum caso foi registrado nos Centros Médicos de Urgência, segundo a Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, ou mesmo nos hospitais de pronto-atendimento, como o Cajuru, o Trabalhador e o Evangélico. No Hospital de Olhos, no Batel, especializado em oftalmologia, também não há nenhum registro. O médico oftalmologista da instituição, Eduardo Strobel Von Linsingen, não descarta, no entanto, que algum caso tenha passado pelo Hospital de Olhos. "Atendo no plantão e geralmente o paciente que vem em uma emergência vem com a família e acaba não contando a causa real do problema."
Linsingen explica que o suposto efeito de embriaguez pelo olho não existe, porque a absorção é mais lenta do que pelo estômago. E mais, que o contato da bebida com a córnea é bastante perigoso. "A maioria das reações químicas resulta em uma conjuntivite local, que melhora com um tratamento básico. No caso da vodca, o álcool presente na bebida pode gerar o descolamento entre o epitélio da córnea (a parte mais superficial) e a córnea, abrindo espaço para a entrada de agentes infecciosos. Há também a possibilidade de ceratite química, que é a inflamação da córnea pelo contato com o álcool, que tem o PH diferente, modificando a estrutura do órgão a tal ponto que um transplante seja necessário."
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Interatividade
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