O julgamento de Beatriz Cordeiro Abagge no Tribunal do Júri, no Centro Cívico, em Curitiba, será retomado neste sábado (28), às 8h30. Nesta sexta-feira (27), após serem ouvidas sete testemunhas, a defesa da ré solicitou que o Tribunal fosse esvaziado para o interrogatório de Beatriz. O depoimento começou por volta das 20h15 sem a presença de jornalistas no local e foi encerrado às 21h30.
O depoimento das sete testemunhas terminou por volta das 17h40. A sessão teve início às 9 horas, segundo o Ministério Público do Paraná, foi interrompida para o almoço por volta do meio-dia e retomada por volta das 14 horas. Última testemunha, delegado Luis Carlos de Oliveira levantou hipótese de manipulação de provas no caso.
Beatriz e outras seis pessoas são acusadas de ter matado Evandro Ramos Caetano, de 6 anos. O crime ocorreu em 1992, em Guaratuba, no litoral do Paraná.
Inicialmente estavam previstos os depoimentos de oito testemunhas, quatro de defesa e quatro de acusação. Como uma das testemunhas de acusação não apareceu para depor, apenas sete prestaram depoimento.
Duas testemunhas prestaram depoimento pela manhã. O primeiro a falar foi o perito criminal Arthur Drischel, que fez o levantamento no local onde o corpo que seria de Evandro foi encontrado. Mesmo arrolado pela acusação, o depoimento de Drischel acabou servindo à defesa. Ele disse que o corpo encontrado no terreno media 1,19 metro, o que não estaria de acordo com um garoto de 6 anos de idade.
Em seguida foi a vez da perita Beatriz Sotille França falar pela acusação. A dentista diz que tem 99% de certeza que a arcada dentária analisada era de Evandro.
A primeira testemunha a depor durante a tarde, ao contrário do que informamos anteriormente, foi Roberto Dalcol, que era promotor do caso na época e disse que Celina e Beatriz Abagge confirmaram participação no crime em uma conversa informal. A segunda a depor foi Maria José da Conceição, que trabalhou como secretária de Celina Abagge, mãe de Beatriz, na administração de creches em Guaratuba. No depoimento, ela voltou a afirmar o que já havia dito no julgamento realizado em 1998.
Maria José garante que chegou cedo na casa dos Abagge no dia do desaparecimento de Evandro. Ela afirma que acordou Beatriz que dormia na casa dos pais, o que indicaria que ela não tem relação com o crime.
Depois foi a vez do delegado Adalto Abreu, que chefiava o Grupo Tigre na época. No depoimento, ele forneceu indícios de que teria havido tortura contra a ré. Na sequência a ex-delegada Leila Aparecida Bertolini, sub-chefe do Grupo Tigre, também prestou depoimento em defesa de Beatriz.
O delegado Luis Carlos de Oliveira, responsável pelas investigações na época, iniciou o depoimento criticando o Judiciário e o Ministério Público e chegou a mencionar uma suposta manipulação de provas. Amigos e familiares de Beatriz que acompanham o julgamento aplaudiram e o juiz pediu para que o comportamento não se repetisse.
Oliveira argumentou que os acusados no caso sofreram tortura física ou psicologicamente para confessar o crime. O clima esquentou com o depoimento do delegado. A promotoria perguntou sobre a relação dele com o ex-deputado Aníbal Khury. Mas no primeiro julgamento ele já havia confirmado que o político não pediu uma investigação paralela sobre o caso.
Oliveira ainda afirmou que houve dois exames periciais não conclusivos e, posteriormente, foi enviado outro material conclusivo. Ele questionou como foi coletado o material que foi enviado a perícia como conclusivo.
O promotor perguntou se o delegado não queria sentar no banco dos advogados de defesa e informou que são dois laudos conclusivos e um inconclusivo. Terminado o depoimento de Oliveira, às 17h40, foi iniciado um pequeno intervalo.
Por volta das 18h foi iniciada a leitura das peças e do laudo de exame de necropsia. As leituras terminaram por volta das 19h20. A sessão foi suspensa temporariamente e retomada por volta das 20h10 para que Beatriz fosse ouvida. O depoimento foi encerrado às 21h30.
A sessão deverá ser retomada neste sábado (28), às 8h30, e nesse intervalo os jurados devem ficar incomunicáveis e serão encaminhados para um hotel, de acordo com o MP-PR.
Sete jurados, entre um corpo de 25 pessoas, foram sorteados para compor o conselho de sentença. Quatro homens e três mulheres serão responsáveis por proferir a sentença culpada ou inocente. No caso de ser considerada culpada, o juiz irá fixar a pena.
Manifestações
Faixas e cartazes foram colocados nas grades do Tribunal do Júri em defesa de Beatriz Abbage, nos quais constavam frases afirmando que ela é inocente.
No plenário do tribunal algumas pessoas vestiam camisetas com a frase "não à tortura". Muitas pessoas compareceram ao Tribunal do Júri para acompanhar a sessão e senhas foram distribuídas pela manhã.
Julgamento anterior
Beatriz e a mãe Celina Abagge foram julgadas pela primeira vez em 1998. Elas foram consideradas inocentes porque não ficou comprovado que o corpo encontrado era de Evandro. O Ministério Público (MP) recorreu da decisão e pediu um novo julgamento alegando que a perícia da arcada dentária e o exame de DNA que provavam que o corpo era do menino foram desconsiderados no julgamento. Quase um ano depois, em março de 1999, o júri que absolveu Beatriz e Celina foi anulado pelo Tribunal de Justiça (TJ) do Paraná.
O novo julgamento já havia sido marcado por duas outras vezes, em novembro de 2010 e em abril deste ano. Mas, nas duas ocasiões, foi adiado devido à troca do advogado de defesa. Beatriz alega em sua defesa que a confissão do crime foi extraída mediante tortura.
Celina não será julgada. A lei brasileira estabelece que o prazo máximo de prescrição de um crime é de 20 anos e que, quando o réu faz 70 anos, o prazo conta pela metade, caso da mãe de Beatriz. Como se passaram mais de dez anos entre os julgamentos, Celina não pode mais ser punida por este crime.
Outros julgamentos
Além das Abagge, outras cinco pessoas foram julgadas por envolvimento no crime. O pai de santo Osvaldo Marcineiro, o pintor Vicente Paulo Ferreira e o artesão Davi dos Santos Soares foram julgados e condenados em 2004. Marcineiro e Ferreira receberam cada uma pena de 20 anos e dois meses de prisão, por homicídio triplamente qualificado e sequestro. Soares foi condenado por homicídio simples, com pena de 18 anos. Já Francisco Sérgio Cristofolini e Airton Bardelli dos Santos foram absolvidos em 2005.
Desaparecimento e corpo encontrado
O menino Evandro desapareceu no caminho entre a escola e sua residência, em 6 de abril de 1992. Beatriz e a mãe foram acusadas de sequestrar a criança e também de ter participado do ritual de magia negra em que Evandro teria sido morto.
O corpo foi encontrado cinco dias depois do crime em um matagal da cidade. As vísceras e o coração tinham sido retirados e as mãos e os pés tinham sido cortados.