Se a mancha de lama que foi observada na região do Arquipélago de Abrolhos for mesmo a resultante do rompimento da barragem de minérios da Samarco, o impacto sobre a biodiversidade que vive ali pode ser catastrófico. Essa é a avaliação de cientistas que trabalham no local.
O alerta de que a pluma de resíduos poderia ter atingido uma das áreas de maior diversidade de corais do Atlântico Sul foi feito anteontem pelo Ibama, com base em imagens de satélite e observações aéreas.
Ontem, o secretário estadual do Meio Ambiente da Bahia, Eugênio Spengler, também sobrevoou o local e disse que o arquipélago em si “está sem mancha aparentemente”, mas que no mar mais próximo da costa a água está bastante turva e, ao norte de Abrolhos, em direção a Porto Seguro, foram vistas manchas escuras.
Spengler não descartou que a lama da Samarco possa ter chegado ali. “É temerário dizer que é, mas também é temerário dizer que não é”, afirmou ao Estado. Ele encomendou análises de amostras do material paralelas às que também estão sendo feitas pela Samarco, por determinação do Ibama.
Mas o secretário disse que, ao menos para a área mais próxima da costa, o motivo da turbidez pode ser as chuvas que caíram na região nos últimos dias, que poderiam ter levado mais sedimentos para o mar.
Para o pesquisador Ronaldo Francini-Filho, da Universidade Federal da Paraíba, que há 15 anos monitora espécies de peixes e de corais de Abrolhos e tem acompanhado a movimentação da pluma de rejeitos de minério, se for confirmada a suspeita, pode acontecer uma mortandade em massa dos corais. O maior risco é que a lama cause um sombreamento na área. Em outros pontos por onde os rejeitos avançaram desde Minas Gerais, pelo Rio Doce, até desaguar no mar, observou-se que a luz não passa de 10 centímetros de profundidade. “Sem luz, os corais morrem por não fazer fotossíntese”, afirma.
Para o biólogo também há o risco, dependendo da densidade da pluma, de os sedimentos cobrirem os corais. “Se isso acontecer, fica mais difícil a recuperação, porque inibe o recrutamento de novos corais.”
Ele concorda, porém, que, por enquanto, é difícil ter certeza de que se trata da lama, visto que as chuvas recentes deixaram as águas da região mais turvas. Segundo Francini-Filho, a região do arquipélago é de altíssima sedimentação e costuma ter maior turbidez em situações de frentes frias, tempestades e muito vento. Portanto, diz, há uma possibilidade de se tratar de sedimentação natural.
Berçários
E mesmo se a lama não tiver atingido o Parque Nacional de Abrolhos, há outros recifes no entorno, principalmente mais perto da costa, alerta o pesquisador, que são importantes berçários de vida marinha, e podem já estar sendo afetados.
Rodrigo Leão de Moura, coordenador executivo da Rede Abrolhos, ressalta também que, mesmo se a suspeita não se confirmar agora, a ameaça de contaminação pode continuar pelos próximos anos. “Essa situação pode se tornar crônica. A lama é formada por um material muito fino, que se espalhou por uma área enorme, e que, depois de depositado, pode ser suspenso novamente a cada chuva e voltar a se deslocar. Então, se não for agora, a lama ainda pode chegar a Abrolhos.” Para ele, é fundamental que seja reforçado o monitoramento, visando a uma melhor resposta se o pior cenário acontecer.
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