Há mais de cinco meses as mulheres grávidas conquistaram o direito de receber a pensão alimentícia antes mesmo do nascimento do filho. O benefício seria direcionado para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez, como consultas médicas e alimentação especial. No ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei 11.804/08, que determina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele é exercido, mas segundo as Varas da Família de Curitiba, há poucos processos em andamento, correndo sob o segredo de Justiça.
A Gazeta do Povo procurou cinco escritórios de advocacia que atendem os casos de Justiça de Família e quatro advogados responderam que ainda não conhecem a lei profundamente. Um outro não quis se manifestar. De acordo com o vice-presidente do Instituto de Registro Civil de Pessoas Naturais do Paraná (Irpen), Arion Toledo Cavaleiro Júnior, desde a aprovação da lei houve apenas consultas.
"Pode até ter algum processo em andamento, mas eu não tive conhecimento e não soube de nenhuma decisão", diz. Segundo ele, o fato de a lei ser recente pode ser uma das explicações para a pouca procura. "Muitas mulheres ainda não conhecem a lei e há advogados que podem também estar orientando as clientes para que esperem o nascimento do filho", afirma. A dúvida sobre a paternidade real do bebê ou o medo de ingressar em uma causa baseada em uma lei nova e que renderia pouco retorno financeiro seriam possíveis causas.
M., 28 anos, não quer ter o nome divulgado. Assim que a lei foi sancionada, ela procurou um advogado e entrou na Justiça. A filha Sofia já tem um mês e M. ainda não teve nenhuma resposta. "Eu guardei as notas fiscais de tudo que gastei com a gravidez e nascimento e quero que o pai dela divida comigo todas as despesas", disse. Mas ela conta que as dificuldades com o processo começaram há muito tempo. "Demorei para encontrar um advogado que tivesse interesse em estudar a lei e me ajudar. Eu é que tive que contar para ele o que poderíamos fazer", lembrou.
Críticas
Antes de ser aprovada, a lei recebeu diversas críticas, a maior delas refere-se à possibilidade de ser fixada a pensão, sem que haja a comprovação biológica de paternidade.
De acordo com a advogada Caroline Said Dias, o fato de a decisão ser baseada em indícios de paternidade pode trazer complicações futuras. "Os alimentos são irrepetíveis, ou seja, não podem ser devolvidos e com isso muitas situações injustas poderão ser causadas", afirma.
A advogada e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família, Maria Berenice Dias, ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, diz que a legislação é adequada às necessidades. "Não entendo porque houve essa reação contrária. As mães não são inconsequentes, ninguém vai entrar na Justiça se não tiver certeza de quem é o pai", afirma.
Inicialmente, a lei previa o exame de DNA durante a gestação, mas essa questão foi vetada. Para o doutor em Biotecnologia Marcelo Malaghini, apesar de oferecer o mesmo grau de confiança que um teste de paternidade comum, trata-se de um exame que é feito por meio do líquido amniótico e pode acarretar riscos à gestante ou ao feto. "É mais adequado aguardar o nascimento, quando é feita apenas uma picadinha no calcanhar para a coleta de algumas gotas de sangue."
Para a promotora de Justiça Swami Mougenot Bonfim, da Promotoria de Justiça nas Comunidades do Ministério Público do Paraná, a possibilidade de alguma pessoa procurar a Justiça agindo de má-fé não pode prejudicar todos os ganhos que a nova legislação trouxe. "Todas as leis podem ser utilizadas por pessoas que querem abusar ao invés de usá-las por uma necessidade real, mas para isso é que existe o juiz. Se houver mulheres tentando abusar da lei, os excessos serão suprimidos", diz.
Decisão favorável
No Rio Grande do Sul, a sugestão de um aborto feita por uma mensagem enviada pelo celular bastou para que Joana (nome fictício), cliente da ex-desembargadora Maria Berenice, comprovasse à Justiça o relacionamento que tinha com o pai de seu filho. "Minha cliente também contou com o depoimento de pessoas que sabiam da relação entre eles, mas o recado enviado pelo pai foi determinante", diz Maria Berenice. Com a decisão judicial favorável, Joana passou a receber R$ 4 mil por mês, para as despesas com alimentação, medicamentos, consultas e parto.