Ponta Grossa - Por lei, Mirian Biancolini Nóbrega pode deixar de ser tenente-coronel e passar a ser tenenta-coronela. A mudança ainda depende da sanção do governador Roberto Requião, mas o projeto que prevê o uso de correspondentes femininos para ocupantes de cargos públicos já foi aprovado na Assembléia Legislativa do Paraná. Se sancionada, a nova legislação determinará que, em âmbito estadual, termos como soldada, sargenta e generala sejam usados em documentos oficiais.
Mirian é da primeira turma de policiais militares femininas do Paraná. Passou pelas funções de sargento, aspirante, tenente, capitão e major, até chegar, juntamente com outra colega, ao posto de tenente-coronel mais alta patente ocupada por uma mulher na PM paranaense. E afirma que nunca imaginou adotar o nome do cargo na forma flexionada. "Há uma portaria do comando-geral permitindo que seja utilizado o termo capitã, mas quando estava na função, nunca usei", diz.
Para Mirian, não há discriminação no fato de a denominação para os cargos privilegiar palavras masculinas. Ela avalia que, mantendo o mesmo termo, mulheres e homens se equiparam na corporação. Sargento, de qual sexo for, deveria ser simplesmente sargento e ponto final. "Mas, se virar lei mesmo, vamos ter de nos adaptar e aprender a lidar com essa novidade", diz.
Vitória mesmo, para a tenente-coronel (que prefere continuar sendo chamada assim), foi a possibilidade de mulheres ingressarem na Polícia Militar o que aconteceu na década de 70. "Isso sim foi muito difícil", afirma.
Já para a cientista política do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Patrícia Rangel, toda medida que vise a dar o espaço outrora negligenciado às mulheres é muito bem-vinda. "Equivale a dizer que todos os cargos podem ser ocupados por mulheres", declara. Para ela, a simples mudança na forma de tratamento motiva transformações institucionais que acabam acarretando comportamentos diferentes e uma nova cultura ao longo do tempo.
Patrícia alega que a língua portuguesa é machista e sexista. "Num grupo com um médico e quatro médicas serão chamados de os médicos porque há um homem presente", exemplifica.
O projeto foi iniciativa do deputado estadual Luiz Carlos Martins (PDT), que encaminhou a proposta a pedido de Albino de Brito Freire, da Academia Paranaense de Letras. Há um projeto semelhante tramitando no Senado. E uma lei federal, de 1956, já obriga ao uso de termos femininos, quando existirem, na comunicação oficial. Mas, como outras, ficou apenas no papel. Contudo, Freire argumenta que é preciso revitalizar a discussão. Ele faz questão de frisar que não se trata de um debate de gênero, mas de uma questão de educação.
Freire, que se auto-intitula apóstolo da simplificação da linguagem, argumenta que a lei estadual poderia ter efeito a médio e longo prazos, com a mudança forçada se transformando em costume. E o professor não vê motivos para que a flexão para o feminino seja relegada. "Soa melhor e não deixa dúvidas de que se trata de uma mulher. Como no caso de capitão e capitã", diz. E acrescenta: se não houvesse o termo deputada ou prefeita, por exemplo, causaria desconforto, mas a situação é impensada, nos dias atuais, graças ao fato de serem expressões comumente usadas. Mentor do projeto de lei, Freire acredita que o fato de a obrigação não prever qualquer tipo de punição para quem desrespeitá-la não a torna fadada à inocuidade. "A sanção será o ridículo de não fazer o que é certo", prevê.
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