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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que anulou a condenação de uma pessoa, presa com cocaína, por considerar que policiais violaram o sigilo de dados do celular de um traficante ao ler notificações em tela bloqueada. O acórdão do caso foi publicado em 14 de agosto.
A ocorrência ocorreu em Minas Gerais. Ao avistar, durante o patrulhamento, um traficante conhecido na garupa de um mototáxi, os agentes resolveram fazer a abordagem. Encontraram na operação uma sacola com 12 tabletes de maconha.
Ao deter o criminoso, viram na tela bloqueada do celular uma troca de mensagens com outra pessoa e resolveram ir até a residência dela para averiguar. Esse segundo suspeito, ao perceber a presença da polícia, tentou fugir e foi preso. No local, os policiais apreenderam cocaína.
A defesa desse segundo suspeito procurou a Justiça alegando que a prisão seria nula, pelo fato de a polícia ter violado o artigo 5°, inciso XII, da Constituição, que trata da inviolabilidade das comunicações. Ao analisar o caso, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) aceitou a tese e anulou as provas.
O Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) recorreu ao STJ argumentando que só haveria ilegalidade se os militares tivessem desbloqueado o celular e acessado informações e aplicativos do envolvido, pois só neste caso seria necessária a autorização judicial. O STJ não aceitou a tese do MP-MG e manteve a anulação das provas, mesmo com o flagrante da posse de cocaína.
Garantismo penal
Para o advogado criminalista, João Rezende, esse tema é sensível. Segundo ele, a 5ª e 6ª turma do STJ, que são as turmas que tratam de matérias criminais, estão mais “garantistas” - uma corrente jurídica que busca oferecer o máximo de respeito aos direitos fundamentais do réu e garantias processuais. Porém, essa aplicação tem se dado com mais frequência em crimes relacionado às drogas.
“Na minha visão, a decisão do STJ foi correta, pois para que haja uma intervenção estatal na vida privada da pessoa, como neste contexto, é necessária uma decisão judicial para decretar a quebra de sigilo de dados. Mas se fosse qualquer outro crime, de outra natureza, eu duvido que teriam também essa decisão porque não é isso que vem acontecendo. Na realidade, só vimos isso quando há prática de drogas”, aponta.
O pesquisador em segurança pública, Fabricio Rebelo, considera que decisões como essa ampliam a violação da quebra de sigilo e limitam cada vez mais a abordagem policial.
“Com certeza, esse tipo de garantismo vai gerando reflexos negativos na segurança pública. Quanto mais se criar dificuldades para as abordagens policiais serem validadas, menos traficantes serão presos. Porque a consequência dessa invalidação é considerar toda a cadeia de provas nula. E, sem provas, o traficante acaba ficando impune.”, prevê Rebelo.