Filipe Martins com sua mulher, Anelise Hauagge, na saída do Complexo Médico Penal de Pinhais.| Foto: Marcelo Elias/Especial para a Gazeta do Povo
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Seis meses depois de ter sido preso preventivamente a mando de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Filipe Martins, um dos principais assessores de Jair Bolsonaro durante sua Presidência, foi liberado nesta sexta-feira (9).

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O caso acumula ilegalidades, como explicou a Gazeta do Povo nos últimos meses. E a liberdade provisória de Martins foi condicionada a uma série de medidas cautelares que, de acordo com juristas consultados pelo jornal, agregam mais elementos de abuso ao processo.

As medidas incluem a proibição a Filipe Martins de sair de sua comarca e a obrigação de recolhimento em casa durante a noite, além do uso obrigatório de tornozeleira eletrônica. Martins também está proibido de sair do país e precisará entregar seus passaportes e cancelá-los.

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Ele não poderá usar redes sociais, sob pena de multa diária de R$ 20.000 por postagem. Martins está também impedido de se comunicar com outros investigados do caso, incluindo figuras como Bolsonaro, Anderson Torres e Walter Braga Netto.

O descumprimento de qualquer uma dessas medidas resultará na imediata revogação de sua soltura e em nova prisão​.

Confira a lista completa de medidas cautelares a que Filipe Martins ficará submetido:

  • Proibição de ausentar-se de sua comarca, com recolhimento domiciliar no período noturno e nos finais de semana.
  • Uso obrigatório de tornozeleira eletrônica.
  • Obrigação de apresentar-se semanalmente à Vara de Execução Penal de sua comarca.
  • Proibição de deixar o país, com a entrega obrigatória de seus passaportes e o cancelamento de todos os passaportes emitidos em seu nome.
  • Suspensão imediata de quaisquer documentos de porte de arma de fogo em seu nome e proibição de realizar atividades relacionadas a colecionamento de armas, tiro desportivo e caça.
  • Proibição de utilizar redes sociais, sob pena de multa diária de R$ 20.000 por postagem.
  • Proibição de comunicar-se com outros investigados mencionados na petição, por qualquer meio, incluindo o presidente Jair Bolsonaro.

Algumas dessas medidas cautelares não constam em nenhuma lei brasileira, de acordo com Rodrigo Chemim, professor de Processo Penal da Universidade Positivo e doutor em Direito do Estado. Cancelar passaportes, suspender armas de fogo e proibir o uso de redes sociais, afirma ele, são medidas que "não têm previsão legal".

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Bruno Thiele, especialista em Direito Penal e Criminologia pela UFPR, afirma que, entre as medidas da lista, a mais incomum é a proibição de uso de redes sociais.

Especialista em liberdade de expressão, o jurista André Marsiglia classificou essa restrição como "chocante". "Censura, sob a ótica do próprio STF, que decidiu várias vezes que presos podem se manifestar por cartas e entrevistas. Se preso pode, abusivo que alguém solto não possa", afirmou na rede social X.

Alessandro Chiarottino, doutor em Direito Constitucional pela USP, destaca que independentemente da legalidade das restrições, a determinação da prisão e o próprio inquérito são abusivos desde o começo.

Filipe Martins reencontra sua mulher após ser liberado do Complexo Médico Penal de Pinhais | Foto: Marcelo Elias/Especial para a Gazeta do Povo

Filipe Martins foi preso por viagem que nunca fez em processo que acumula ilegalidades

Martins é investigado por sua suposta participação no caso da minuta de um decreto que, entre outras coisas, previa a convocação de novas eleições presidenciais em 2022.

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Ele foi preso no dia 8 de fevereiro deste ano porque seu nome estava em um documento editável encontrado no computador do tenente-coronel Mauro Cid com uma lista de passageiros de um voo presidencial com destino a Orlando (EUA) marcado para o dia 30 de dezembro de 2022. A Polícia Federal (PF) e o ministro Alexandre de Moraes usaram esse documento editável como prova de que Martins estaria tentando evitar um processo fugindo do país.

Desde o início da prisão preventiva, a defesa apresentou provas cabais de que Filipe Martins não tinha embarcado nesse voo e estava no Brasil na data. A base para a sua prisão foi, portanto, uma viagem que ele nunca fez.

Mesmo com um parecer de março da Procuradoria Geral da República (PGR) favorável à soltura de Martins, o ministro manteve o ex-assessor de Jair Bolsonaro encarcerado por meses, entre pedidos ignorados da defesa e solicitações frequentes de novas diligências. Para a defesa, o objetivo do ministro foi prolongar a prisão para forçar uma delação sobre a suposta tentativa de golpe de Estado feita por Bolsonaro e seu entorno político.

Filipe Martins com parentes, amigos e assessores após ser liberado do Complexo Médico Penal de Pinhais| Foto: Marcelo Elias/Especial para a Gazeta do Povo

O processo até a soltura de Martins acumulou ilegalidades:

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  • Não houve denúncia contra Filipe Martins;
  • Moraes inverteu o ônus da prova, exigindo que Martins, uma vez preso, prove que não viajou aos EUA;
  • Moraes ignorou as provas apresentadas pela defesa, que são evidências cabais de que Martins não viajou aos EUA;
  • Moraes feriu o princípio da presunção de inocência;
  • Moraes passou por cima das regras para a prisão preventiva previstas na legislação brasileira, prolongando o tempo da medida de forma injustificável, mesmo se a prisão fosse legal;
  • Moraes ignorou o primeiro parecer da PGR a favor da liberação de Martins e ainda não agiu em relação ao segundo.