Um líder dos índios guarani-caiová de Mato Grosso do Sul, ator de filme sobre a causa indígena, foi morto esfaqueado em sua casa, no território chamado Guyraroká, em Caarapó (277 km de Campo Grande).

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Ambrósio Vilhalva, 53, ganhou projeção internacional em 2008, quando foi protagonista do filme "Birdwatchers" (ou "Terra Vermelha"), que narrou a retomada de terras dos ancestrais dos guaranis. O filme, uma produção ítalo-brasileira, foi destaque na mostra de Veneza daquele ano.

O homicídio ocorreu na madrugada de ontem. A Polícia Civil suspeita que o crime tenha sido motivado por brigas internas na aldeia, impulsionadas pelo consumo elevado de álcool entre os índios.

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A polícia prendeu em flagrante o sogro de Vilhalva, Ricardo Quevedo, apontado como autor do homicídio - Quevedo nega.Segundo o delegado Antônio Carlos Videira, chefe da delegacia regional de Dourados (MS), o líder guarani tinha três mulheres, sendo duas delas mãe e filha. Ambas, diz o delegado, afirmaram que viram Quevedo --respectivamente pai e avô delas-- entrando na casa de Vilhalva naquela madrugada e depois saindo correndo.

Ainda conforme o delegado, momentos antes do crime, os dois consumiam álcool com outros índios em Guyraroká. Ele disse ainda que há boatos de que a vítima provocava vários conflitos na aldeia e tinha inimigos.Repercussão

A morte do líder guarani provocou manifestações de ONGs ligadas ao movimento pela retomada de terras indígenas, como o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), braço da Igreja Católica no Brasil para temas indígenas.

Na opinião do cientista político Egon Heck, assessor do Cimi, a despeito de eventuais motivações pessoais para o crime, o homicídio de Vilhalva não é um caso isolado. Relaciona-se, afirma Heck, ao ambiente tenso provocado pelo "confinamento dos índios" a pequenos espaços.

Ao "aperto" de grupos indígenas em poucos hectares somam-se problemas como alcoolismo, subnutrição e altas taxas de suicídio, diz Heck.

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"O desfecho dessa morte é uma consequência de elementos regionais. Fazemos um apelo para que os governos resolvam as conjunturas de fundo desse problema", disse o assessor. Ele refere-se à necessidade de expulsar os cultivos de cana e soja e a criação de gado das áreas indígenas.

Histórico

Há 45 mil guaranis-caiovás nas diversas aldeias de Mato Grosso do Sul, segundo o Cimi. Só os do território Guyraroká, de Vilhalva, são entre 80 a 100 pessoas.Ao longo do século 20, os guaranis do Guyraroká viveram restritos em uma reserva indígena, misturados a outras etnias. Mas em 1990 eles decidiram sair da reserva e se instalar em uma área já habitada por seus ancestrais. O trecho ocupado, em parte de uma fazenda, tinha 60 hectares (algo como 78 campos de futebol de 7.700 m2).

Eles chegaram a ser expulsos e permaneceram por quatro anos na beira de uma estrada, retornando à área. Mas em 2009, ainda segundo o Cimi, o Ministério da Justiça reconheceu como território dos guaranis do Guyraroká uma área de 12 mil hectares - o equivalente a 76 parques como o Ibirapuera, em São Paulo, que tem 1,6 milhão de m2.

Atualmente, conforme Heck, os índios do Guyraroká vivem em condições precárias. Dependem de cesta básica, já que o plantio de feijão, batata e outros alimentos não é suficiente. Há problemas de alcoolismo e suicídio.

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No ano passado, outra comunidade de índios guarani-caiová de Mato Grosso do Sul ganhou projeção nacional, com apoio nas redes sociais. Depois de a Justiça determinar sua retirada de uma área, a comunidade de uma aldeia da cidade de Iguatemi escreveu uma carta em que pedia que fosse decretada a morte coletiva do grupo.