Histórias ao longo do dia
Em Londrina, a jornalista e empresária Stella Meneghel (na foto com os filhos), 38 anos, procura passar aos filhos a satisfação que sente a partir da leitura. A estratégia tem dado certo. "Eles já pegam os livros sozinhos. Isso fica ao alcance deles. Começamos brincando porque as crianças têm muito essa coisa do lúdico", conta. Em casa, Manuela, 4 anos, e Cassiano, 1 ano, têm prateleiras mais baixas com seus livros preferidos e a oportunidade de escutar as histórias ao longo de diferentes momentos do dia. Pode ser na hora de dormir ou na cadeirinha do almoço, entre uma colherada e outra. "Fomos trabalhando alguns aspectos e a maior já sabe algumas letras, como as do nome dela e do meu. O livro é um somatório para o desenvolvimento deles", define a mãe.
Hábito
Algumas ações podem ajudar a despertar o interesse da criançada pelos livros ainda na primeira infância. Veja as dicas das professoras Elisa Dalabona, do Departamento de Técnica e Prática de Ensino da UFPR, e Vera Lúcia Gran Dal Molin, gerente dos Centros Municipais de Educação (CMEIS) de Curitiba:
Deixe os livros ao alcance das crianças assim como os demais brinquedos. Não tema que as páginas rasguem ou ganhem rabiscos.
Faça do momento de ler histórias uma oportunidade para se aproximar. Procure organizar isso de acordo com a rotina da casa.
A leitura pode acontecer na hora de dormir, mas não precisa ser deixada apenas para a noite. Há famílias que levam livros com materiais plásticos para o banho e hora das refeições.
Os gibis podem ser uma alternativa inicial. Com o passar do tempo, é interessante que os pais também busquem formas mais elaboradas de leitura.
Histórias com musicalidade e rimas costumam ser bem aceitas por crianças menores.
Busque livros que ofereçam boas ilustrações e materiais que ajudem a chamar a atenção dos baixinhos. Isso pode incluir fantoches e histórias impressas em tecido e plástico.
Mostre interesse pelo conteúdo de volumes infantis.
Leia. Procure dar o exemplo sempre.
No caminho
Castro teria implantado a primeira bebeteca do país
A criação de espaços exclusivos para a leitura voltados para bebês já é uma prática adotada em algumas cidades do Paraná. Em Castro, o projeto foi criado pela prefeitura em 2007 e atende 167 crianças do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Cavalinho de Pau. A "bebeteca" é considerada a primeira a ser criada no país.
"Temos mais de 500 livros divididos por faixa etária, próprios para bebês. São livros com sons, que podem ser mordidos ou tem figuras em relevo", relata a diretora do CMEI, Maria Isabel de Oliveira. De acordo com ela, parte dos investimentos no acervo local vem do governo federal. Os recursos são enviados através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
A instituição oferece momentos diários de leitura para a criançada. Em geral, os alunos visitam o espaço em grupos de seis a oito crianças, a fim de ouvir histórias e explorar o ambiente.
Noroeste
Em Mandaguari, a implantação de uma bebeteca se deu a partir dos esforços da Comunidade Social Cristã Beneficente (CSCB). Chamado de Bebeteca Papai Quinha, o espaço existe desde 2010 e atende crianças de zero a 5 anos, de oito creches da prefeitura. A bebeteca também tem à disposição em torno de 500 obras.
Era uma vez uma criança que convivia com livros desde os primeiros anos de vida. Folhear títulos infantis e se encantar com ilustrações fazia parte da brincadeira, banho ou hora de dormir. Desenvolvida desde o nascimento, a prática colaborou para o desenvolvimento da linguagem e aquisição de capacidades socioemocionais. A constatação, longe dos contos de fada, é tão real que médicos estão prescrevendo livros para as crianças durante as consultas. A ação faz parte de uma recomendação da Academia Americana de Pediatria (AAP) e também já é adotada por especialistas brasileiros.
De acordo com a AAP, uma parte importante do cérebro dos bebês se desenvolve nos três primeiros anos de vida e a leitura de histórias com regularidade para crianças, desde o nascimento, pode favorecer esse processo. Ler para bebês ainda pode abrir portas para o mundo das artes, facilitar o aprendizado da leitura e fortalecer as relações entre pais e filhos.
A prescrição, avalia a médica Ana Maria Costa da Silva Lopes, do Departamento de Pediatria do Comportamento e Desenvolvimento, da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), se faz necessária do ponto de vista neurológico e em relação à formação da vida psíquica do bebê. "A criança, mais adiante, terá um momento de alfabetização a partir do sexto ano de vida, mas o incentivo da leitura deve ser contínuo", defende.
Família
Para Ana Maria, os pais precisam ser os mediadores desse processo. É através da voz deles que o bebê descobre enredos, ilustrações e até mesmo o cheiro do papel. "Infelizmente, os médicos estão tendo de prescrever o básico da relação humana. Coisas que já fizeram parte de uma tradição e que não deveriam ter sido perdidas", pondera.
Doutora em Educação, a professora Elisa Dalabona, da UFPR, argumenta que esse tipo de estímulo pode fazer a diferença na vida das crianças. Entre os benefícios, ela cita a ampliação do repertório imaginário, melhor desenvolvimento da oralidade e da interlocução com o adulto. Ao mesmo tempo, lembra, a leitura abre espaço para trabalhar com emoções, como o medo, nas histórias do Lobo Mau, ou a rejeição, como no caso das irmãs de Cinderela. "Quando a criança sente o prazer da família em contar aquela história, ela retribui isso", salienta.
Leitura para envolver pais e filhos
Quanto mais leitura, melhor a escrita, defende o gerente de Conteúdo do movimento Todos Pela Educação, Ricardo Falzetta. Na última edição da Avaliação do Ciclo Final de Alfabetização, a Prova ABC, aplicada em 2012 pela organização em escolas públicas e privadas do país, 56% das crianças que cursavam o 3.º ano do ensino fundamental apresentavam leitura inadequada e 70% também não dominavam bem a habilidade de escrever. Ao todo, 54 mil crianças de 600 municípios brasileiros foram avaliadas.
Para Falzetta, a escola precisa estar apta a oferecer leitura de qualidade às crianças, principalmente quando os alunos vêm de famílias em situação de vulnerabilidade. "Essas famílias também precisam ser conquistadas. Elas podem valorizar os livros que os filhos levam para casa, perguntar sobre o que leram na escola ou fazer essa leitura juntos com eles", assinala.
Em Curitiba, esse trabalho já vem sendo feito na rede pública. A gerente dos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEI) de Curitiba, a professora Vera Lúcia Gran Dal Molin, explica que as unidades têm a leitura como orientação de prática permanente. Os berçários contam com cantos para a leitura e os bebês são estimulados a ter contato com os livros assim que conseguem segurar os materiais, relata. As crianças também podem fazer empréstimos para ler com os pais.
Exemplo
O acervo do CMEI Doutor Arnaldo Carnasciali, no Sítio Cercado, tem à disposição das crianças livros com materiais especiais para bebês, como pano e plástico. Tudo fica em sacolas ao alcance dos baixinhos. Um trenzinho com cerca de 200 volumes , em exposição na entrada do centro infantil, oferece unidades para levar para casa. "Também direcionamos uma estante com livros para empréstimos dos adultos. Não fazemos controle do que direcionamos a eles", observa a diretora do CMEI, Vanessa Martinez.
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