É uma palavra nova livreteria para um amor antigo: livros. Livreteria tem livros, assim como a sorveteria tem sorvete, explicam os criadores da Livreteria Popular Juraci Nascimento, um projeto que tenta estimular a leitura entre crianças e jovens dos morros do Complexo de São Carlos.
A livreteria, na verdade, é um triciclo ao qual foi acoplado um armário de metal vermelho com portas. É nele que os amigos Guilherme Vinicius Roberto, de 29 anos, e Luan Oliveira, 17, crias do Morro do Zinco, percorrem becos e ruas da região. No armário estão livros, quase todos infantojuvenis, para empréstimo.
A cada semana o triciclo escolhe uma parada, porque haja fôlego para subir e descer ladeiras carregando livros. Estaciona numa rua e as crianças vão chegando. O projeto começou há dois meses, e 30 pessoas, segundo Roberto, já se cadastraram e retiraram exemplares. Podem ficar com o livro por até três semanas. O acervo vem de doações.
"A gente queria mais do que uma livraria, que é um lugar ao qual o morador do morro não vai. E mais do que uma biblioteca, que fica parada. Aí surgiu a ideia de levar os livros até as pessoas", explica Roberto.
O nome do projeto homenageia Juraci Nascimento, líder comunitária do complexo que costumava reunir crianças para festinhas, teatrinhos, distribuição de doces e contação de histórias. Pela casa dela passaram várias crianças do morro, inclusive Roberto, que gostava de usar nariz de palhaço nas brincadeiras.
Juraci morreu sem saber da homenagem, mas parte da fantasia que ela criou sobrevive. "Aquela casa marcou muita gente aqui. Sempre amei os livros. Vejo que muitas crianças só fazem leitura obrigatória, isso quando fazem. Muito do que eu sou, muitas das escolhas que fiz, é por causa dos livros que li ", diz Roberto, que terminou os estudos numa escola mantida pela Fundação Bradesco, cursou jornalismo na PUC como bolsista e hoje trabalha numa empresa fazendo clipping de notícias.
Os rapazes do Zinco apresentaram a ideia da biblioteca ambulante à Agência de Redes para Juventude, programa do Avenida Brasil- Instituto de Criatividade Social, financiado pela Petrobras. A livreteria foi aprovada, e eles ganharam R$ 5 mil para começar o trabalho. O triciclo custou R$ 1,9 mil. O projeto prevê ainda um clube do livro, para estimular trocas entre os moradores.
Nem sempre é fácil atrair leitores. Gleison Oliveira, de 15 anos, no 9.º ano, diz que não gosta de ler, só de jogar futebol . Mas adora pedalar o triciclo vermelho junto com Michel de Souza,15. Michel ajuda a organizar os livros, gosta de teatro e de A culpa é das estrelas, sucesso entre adolescentes. Diz que Harry Potter é sempre procurado. E assim, de triciclo, histórias de bruxos, princesas, macacos e piratas sobem e descem as ladeiras do Complexo de São Carlos.