A mancha de poluição no Rio Tietê dobrou de tamanho em apenas um ano, aponta relatório da Fundação SOS Mata Atlântica, divulgado nesta quarta-feira (23). Monitoramento feito pela entidade em 109 pontos de coleta distribuídos em 26 cidades e 78 corpos d’água mostra que o trecho considerado “morto” do principal rio paulista cresceu de 71 km de extensão em 2014 para 154,7 km neste ano, um aumento de 118% que rompeu os limites da Grande São Paulo.
Agora, o trecho no qual a qualidade da água é classificada como ruim ou péssima vai de Mogi das Cruzes, a 60 km da nascente, em Salesópolis, até o município de Cabreúva (a 214,7 km da nascente), no interior, um retrocesso ao cenário de 2012. O monitoramento foi feito ao longo de 576 km do rio, entre Salesópolis e Barra Bonita, de setembro de 2014 a agosto deste ano. No relatório anterior, a mancha anaeróbica ia de Guarulhos a Pirapora do Bom Jesus.
No início do projeto de despoluição do Tietê, em 1993, a mancha de poluição estava em 530 km, de Mogi das Cruzes até Barra Bonita. No fim de 2010, ao término da segunda etapa do Projeto Tietê, o trecho era de 243 km, de Suzano até Porto Feliz. O novo cenário apontado pelo levantamento mostra que a meta de universalização do saneamento em São Paulo e recuperação dos rios até 2020 ficou mais difícil de ser atingida.
Coordenadora da Rede das Águas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro atribui o retrocesso na despoluição do Tietê, cujo projeto foi iniciada em 1993, a três fatores: 1) os eventos climáticos extremos ocorridos entre 2014 e 2015 (temporais e estiagem); 2) a paralisação de programa Córrego Limpo, parceria entre a Prefeitura de São Paulo e a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp); 3) o aumento dos lançamentos de esgoto nos cursos d’água em cidades com empresas próprias de saneamento, como Guarulhos e Mogi das Cruzes. “Os eventos climáticos extremos afetam diretamente a qualidade da água do rio, principalmente a seca, que diminui drasticamente a vazão do rio e, com isso, aumenta a concentração de poluentes. Já a paralisação do programa Córrego Limpo eleva os índices de qualidade da água ruim nos principais afluentes do Tietê, enquanto que o aumento dos lançamentos de esgoto nesses municípios que não são operados pela Sabesp tornam ainda mais difícil a missão de despoluir o rio”, explica Malu Ribeiro.
Ela destaca ainda que abertura das comportas na barragem de Pirapora feita em novembro de 2014 e em setembro deste ano pela Empresa Metropoliana de Águas e Energia (EMAE), do governo estadual, por causa das fortes chuvas na região, também aumentaram significativamente a descarga no rio de uma grande quantidade de sedimentos contaminados por metais pesados, bactérias e matérias orgânica em decomposição, com alta demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO).
“O impacto dessa operação resultou nos mais graves danos ambientais do rio Tietê desta década e na mortandade de mais de 40 toneladas de peixes no município de Salto. Destacamos que desde 2006 não foram registradas ocorrências de morte de peixes no Médio Tietê, fato que voltou a ocorrer em novembro de 2014”, afirma o relatório. “Os custos diretos desse impacto ambiental, com a retirada de peixes mortos, de toneladas de lixo e lama contaminada foram assumidos exclusivamente pela Prefeitura Municipal de Salto e resultaram em auto de infração da Cetesb (Companhia Ambiental de São Paulo) à EMAE e ao DAEE (Departamento de Aguas e Energia Elétrica de São Paulo)”, completa.
Ainda de acordo com a SOS Mata Atlântica, o excedente de esgoto sem tratamento de Mogi das Cruzes, Suzano, Guarulhos e outras cidades do Alto e Médio Tietê “resultaram em impactos diretos na qualidade da água medida em 16 pontos de coleta no rio Tietê e em outros 53 pontos distribuídos nas bacias hidrográficas, que registraram médias de qualidade da água ruim e péssima”.
O documento aponta também que além das variações climáticas extremas, da operação das barragens e da paralisação de programas de limpeza de córrego “houve desaceleração, por 120 dias, em 50% no ritmo de investimentos do Projeto Tietê, em execução pela Sabesp, em razão da crise hídrica”.
Sabesp
Em nota, a Sabesp informou que “o processo de despoluição do Rio Tietê é gradual e depende não apenas das ações da companhia como também das prefeituras de municípios da bacia”. A estatal cita como exemplo a cidade de Guarulhos, que possui autarquia municipal de saneamento e coleta 84% de esgoto, mas trata apenas 1,38%, segundo dados divulgados pela Cetesb em maio deste ano.
“A empresa lembra que, com a primeira e segunda fases (1992-2008), o esgoto gerado por uma população de 8,5 milhões de pessoas passou a ser tratado. Ou seja, em menos de 20 anos, a Sabesp passou a tratar os dejetos de uma população equivalente à de Londres. Vale lembrar que o Tâmisa, rio que corta a capital inglesa, foi despoluído em cem anos e o mesmo processo no rio Sena, em Paris, demorou 70 anos. São rios com características muito diferenciadas, mas que tinham grau de poluição semelhantes”, afirma a Sabesp.
Ainda segundo a companhia, quando o programa teve início, o sistema de saneamento era capaz de remover apenas 19% da carga orgânica dos esgotos gerados na Grande São Paulo, enquanto que hoje 87% do esgoto são coletados e 68%, tratados. “A terceira fase do Projeto Tietê foi iniciada em 2010 e está em andamento. Com essa etapa, estima-se que mais 1,5 milhões de pessoas passem a ter os esgotos de suas moradias coletados e que os esgotos gerados por mais 3 milhões de pessoas sejam encaminhados para tratamento”, afirma.
Guarulhos
Já o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) de Guarulhos informou que a coleta de esgoto na cidade saltou de 65% na década passada para 83,99% hoje. “De janeiro de 2001 a março de 2015 foram executados 487,12 quilômetros de redes e 58.860 ligações de esgoto. Além disso, o Saae entregou os subsistemas de tratamento São João, Bonsucesso e Várzea do Palácio em setembro de 2010, dezembro de 2011 e junho de 2014, respectivamente, e estabeleceu em 2014 uma parceria com a iniciativa privada, na modalidade concessão administrativa, para complementação dos sistemas de tratamento de esgoto”.
Procurados, a Prefeitura de São Paulo e o Serviço Municipal de Águas e Esgoto de Mogi das Cruzes (Semae) não se manifestaram.
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