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Elon Musk e Alexandre de Moraes
Elon Musk, dono do X, e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.| Foto: EFE/Tolga Akmen-POOL/Isaac Fontana

A possibilidade de derrubada da plataforma X no Brasil, suscitada por uma intimação do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, coloca a ordem jurídica do país em uma encruzilhada, na visão de juristas, tornando praticamente ilusória a existência de algumas garantias constitucionais no país.

Moraes exige que o X nomeie um representante no país, sob pena de suspensão do serviço. A ameaça é vista por juristas como mais um avanço em direção a um estado comandado pelo poder arbitrário da cúpula do Judiciário.

As ilegalidades começam pela própria existência dos inquéritos que perseguem pessoas por manifestações legítimas de opinião, passam pelo pedido ilegal de censura prévia de usuários da rede e, no caso específico do mandado de intimação feito na quarta-feira (28), incluem:

  • A intimação judicial ocorreu por meio de rede social, o que não é permitido;
  • A intimação foi dirigida a Elon Musk, mas deveria ser destinada à CEO do X, Linda Yaccarino;
  • Há desproporcionalidade da medida de suspender uma plataforma usada como meio de comunicação por milhões de brasileiros por descumprimento de uma ordem judicial;
  • A ordem para nomeação de um novo representante legal da empresa no Brasil ocorreu em circunstâncias que tornam essa exigência inviável, já que o representante foi ameaçado de prisão pelo próprio STF há duas semanas;
  • Houve violação de súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determina que este tipo de intimação deve ser entregue em mãos;
  • Houve violação de tratados de cooperação internacional sobre como devem ocorrer intimações que envolvam estrangeiros.

Para a consultora jurídica Katia Magalhães, vivemos um novo patamar de autoritarismo. "É tudo muito novo. Estamos construindo um novo pensamento jurídico em torno de situações que nunca se imaginaram, para situações com as quais a gente não tinha deparado até então, e que, a meu ver, exigem uma coragem dos agentes políticos – em particular, de cada um dos 81 senadores", afirma.

Rodrigo Marinho, mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor), concorda com o diagnóstico. "É só ver os países em que o X foi bloqueado: todos eles são ditaduras, todos eles são regimes totalitários. Estamos caminhando para isso. Felizmente, ainda não é o Executivo com as Forças Armadas que têm todo esse poder. É um ministro com a conivência dos demais ministros que tem cometido abusos processuais violentos, descumprindo a lei e os princípios constitucionais. Acho importantíssima a manifestação popular pedindo o impeachment deste senhor e de outros membros do STF nas próximas manifestações de rua marcadas para o dia 7 de setembro", afirma.

Rafael Domingues, doutor em Direito do Estado pela USP, diz que o país está numa encruzilhada entre a institucionalidade e o "decisionismo", isto é, a primazia das decisões de juízes sobre os procedimentos estabelecidos pela Constituição e pelas leis.

"A falta de institucionalidade está chegando a tal ponto que o rito processual está se tornando completamente esquizofrênico, verdadeiramente kafkiano. Isto não se sustenta com o tempo porque é insano. O decisionismo não se sustenta. Só o institucionalismo se sustenta a médio e longo prazo. Uma hora, isto tudo vai ruir, mesmo com muita gente fazendo vista grossa", comenta. "Todos, inclusive os próprios ministros, estamos correndo riscos incalculáveis, inclusive no que toca à própria preservação da democracia", acrescenta.

Intimação a X é inválida por diversas razões

A intimação, segundo os juristas, é inválida sob vários aspectos, a começar pelo meio inusitado utilizado, uma rede social. Houve, além disso, uma violação de tratados de cooperação internacional sobre como devem ocorrer intimações que envolvam estrangeiros. Domingues explica que qualquer intimação ou citação de pessoa fora do país deve ser feita por carta rogatória ou outro ato de cooperação dirigido ao país onde a pessoa está localizada – e, em tese, pode ser recusada pela Justiça daquele país.

Katia Magalhães lembra que, de acordo com o Código de Processo Civil, a intimação precisa ser feita pessoalmente aos advogados constituídos. "Aí vem um problema muito sério: há duas semanas atrás, nós vimos aquela decisão do ministro de impor a retirada de perfis de usuários sob pena de multa diária exorbitante e prisão da representante legal da empresa. Qualquer empregador razoável decidiria: 'vou tirar meu escritório daqui'. Porque deixar um escritório com funcionários aqui seria expor os prepostos do X a degola, a um risco concreto de prisão", comenta.

Para ela, há nesta circunstância um "fato do príncipe", conceito jurídico usado para descrever situações em que um ato de uma autoridade cria uma condição extraordinária que impede o cumprimento de uma obrigação legal. A obrigação de ter um representante legal, embora exista na lei, torna-se inviável diante da ameaça de Moraes.

"A empresa estrangeira tem que ter representante no Brasil? Tem, sim. Agora, há circunstâncias excepcionais em que essa lei não pode nem deve ser cumprida", afirma.

Outros juristas também se manifestaram sobre o tema via X. O ex-procurador Deltan Dallagnol criticou o que chamou de "várzea no Supremo", mencionando que Moraes errou ao chamar Musk de CEO do X, o que, para ele, é uma prova de que a decisão é mais política do que técnica.

André Marsiglia, advogado especialista em liberdade de expressão, lembrou que não é totalmente inédito o uso de meios digitais para intimações, mas que isso deveria ser uma última tentativa e jamais envolvendo obrigações como a nomeação de um representante.

Ele também lembrou que a súmula 410 do STJ afirma que, em casos como este, a intimação tem de ser pessoal, entregue em mãos, sob pena de nulidade. "Ou seja, por qualquer ângulo, a intimação é nula, e qualquer ordem de suspensão da rede decorrente dela será ilegal", afirmou.

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