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Uma milagreira aclamada por várias classes sociais
O túmulo de Maria Bueno recebe devotos não só de Curitiba como de Santa Catarina e outras regiões do país e até do mundo. Diariamente cerca de cem pessoas passam pelo cemitério só para ver seu túmulo. "Ela deixou de ser santa de apenas uma classe social. Primeiramente foi santa de negros e mulatos, porque teria ascendência africana. Como gradativamente foi adquirindo uma representação de branqueamento, que é típica de Curitiba, outras religiões a adotaram", afirma a antropóloga Sandra Jacqueline Stoll.
Primeiramente a santa foi enterrada em uma cova rasa na Rua Vicente Machado (na época, um lugar distante do centro). Mas, por causa da romaria intensa ao local, depois de entraves eclesiásticos, o corpo foi transportado para o Cemitério Municipal, onde está enterrada desde 1961.
Além de Curitiba, outras cidades, como Paranaguá e Morretes, têm capelinhas em homenagem à Maria Bueno. Apesar de ser chamada de santa, porém, ela nunca foi canonizada pela igreja católica.
A capelinha de Curitiba, embora esteja sempre sendo cuidada pelos fiéis, deve passar por uma reforma, ainda sem data definida, para conter as infiltrações e os alagamentos.
Negra
Maria Bueno era "morena-clara" e não negra, como acredita-se. Tinha cabelos pretos e cacheados, olhos negros e boca bem feita, segundo descrição da polícia. Portava roupas de bom tecido e cores bonitas. Além disso, tinha vários cortes na mão e no rosto.
É uma missão quase impossível falar da história de mulheres como Maria Bueno, que viveu em Curitiba no século 19 e pouco se destacou na sociedade de sua época (o que explica a falta de registros). Depois que morreu, porém, se tornou conhecida e admirada por devotos de distintas religiões. É a partir daí, 1893, ano de seu assassinato, que surgem notícias dela na imprensa. Mas muitos relatos são pouco confiáveis.
A verdade é que Maria Bueno ganhou fama depois de uma tragédia, assim como tantas outras santas de cemitério "beatificadas" por populares. São mulheres que morreram brutalmente, vítimas de estupro ou da tentativa dele. E que em função do assassinato causaram comoção popular. "Elas se tornam conhecidas a partir da devoção. Pessoas começam a acender velas para a vítima e rezar onde a pessoa morreu [costume da época]. Então aparecem relatos dos primeiros "milagres" e a fama se espalha", explica a antropóloga Sandra Jacqueline Stoll, que junto com outras pesquisadoras acaba de lançar um livro sobre o assunto intitulado Maria Bueno: santa de casa.
O jornalista Octávio Secundino, já falecido, foi um dos que deixou informações importantes sobre Maria Bueno, cobrindo notícias sobre a mulher que viraria santa. Mariana Alípia Bueno teria nascido na Lapa. Não se sabe ao certo por que razão e como ela chegou a Curitiba. O certo é que vivia na casa de uma ex-escrava chamada Mariana da Silva Pinto, para a qual lavava roupa. "Oficialmente ela não é nada disso que afirmam [uma meretriz]. Pelos registros de Octávio, o que se percebe é que Maria levava o que para a época era uma vida fácil, digamos assim. Ela caía na conversa do namorado, Inácio José Diniz", explica o historiador e pesquisador do assunto Valério Hoerner, que teve acesso às anotações do jornalista Octávio.
Diniz, que era uma espécie de soldado, convidou a namorada para sair e Mariana a teria alertado para não aceitar o convite. "A questão é que ela caiu na história de Diniz e decidiu sair com ele", diz Hoerner. Maria Bueno foi encontrada morta na Rua Vicente Machado, onde até hoje pessoas devotas se dirigem para rezar. A lavadeira foi degolada.
Sentença
Diniz foi preso e morto pelo chefe dos maragatos, Gumercindo Saraiva. E é aí que a história se intensifica. Maria morreu em 1893, no período da Revolução Federalista. Diniz estava preso por causa do assassinato, mas Curitiba acabou ficando sem o governador (Vicente Machado) e sem o comandante do batalhão, porque os dois fugiram e entregaram a cidade aos maragatos. Todos os presos, na época, escaparam da cadeia.
Diniz voltou ao trabalho no quartel do 13.º regimento, que estava sob o comando de Gumercindo. Em uma das rondas que fazia com outro soldado, o assassino roubou o dinheiro e a mula de um cidadão e o degolou. O sogro do assassinado viu Diniz com a mula e a reconheceu. Perseguiu o soldado e viu que ele entrou com o animal no quartel. Ali, pela porta da frente, o homem fez a acusação de roubo e morte para Gumercindo. "O maragato pediu para o homem identificar quem era o ladrão e, quando o homem apontou para Diniz, Gumercindo mandou fuzilá-lo", explica Hoerner.
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