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Estado resguarda patrimônio genético, considerado o passo mais difícil para garantir competitividade | Gilberto Abelha/Jornal de Londrina
Estado resguarda patrimônio genético, considerado o passo mais difícil para garantir competitividade| Foto: Gilberto Abelha/Jornal de Londrina

Gado zebu

Primeiros nelores viajaram 3 anos

Juliana Gonçalves

Sem a determinação e a ousadia do imigrante espanhol Celso Garcia Cid, o Paraná não teria formado seu rebanho de nelore e gir leiteiro. Ele teve de tomar fôlego para brigar contra proibições federais nas décadas de 1950 e 1960. Meio século depois, a Fazenda Cachoeira 2C é uma das poucas que ainda preservam animais puros de origem e um dos mais importantes criatórios de nelore do Brasil.

Em 1957, Garcia Cid decidiu ressuscitar a importação de zebu, proibida na década de 1920. Encomendou o gado e deixou para solucionar o problema burocrático mais tarde. Os animais ficaram um ano sob a inspeção do governo indiano e outro ano em viagem, com paradas em diversos portos para descanso. Só em 1960 o longo percurso chegou ao fim. O gado ficou cinco meses na Ilha das Cobras (RJ) antes de ser liberado e seguir para a Fazenda Cachoeira, em Sertanópolis, região de Londrina. Em 1962, Garcia Cid fez uma nova importação e, em 1964, o governo brasileiro reativou a proibição. Ao todo, o pecuarista conseguiu trazer 208 animais, relata sua família.

"A ideia dele era melhorar a pecuária nacional. Ele dizia que, se fosse só para ele, teria trazido só um boi e uma vaca", conta a filha Beatriz Garcia Cid, herdeira da fazenda. Hoje, meio século depois, ainda é possível conhecer um desses animais. O touro Krishna, que morreu em 1961, foi embalsamado e fica exposto na sala da sede da fazenda.

A força do gado de elite

Sem competir com o cultivo de soja, cana-de-açúcar ou com a própria criação extensiva de bovinos – por exigir pouco espaço –, o gado de elite garante a qualidade dos animais reprodutores do Paraná. São esses animais que elevam o faturamento dos leilões realizados na ExpoLondrina. Foram atingidos R$ 20,5 milhões no ano passado. Um único animal, a vaca nelore Suprema TE TH, alcançou R$ 540 mil, preço recorde do evento.

O diretor Agroindustrial da Sociedade Rural do Paraná (SRP), Luigi Carrer Filho, destaca que o melhoramento genético é fundamental na atividade pecuária, à medida que o gado se aprimora em ganho de peso, precocidade de abate e tem um melhor índice de conversão alimentar.

Além dos reprodutores da raça nelore – 82% do rebanho de corte do Paraná são dessa raça ou anelorados –, o estado avança na criação de angus, brahman, charolês, guzerá, limousin, machigiana, simental e caracu. Uma grande tendência no melhoramento genético é o chamado cruzamento industrial, em que são utilizados reprodutores de raças europeias (angus, charolesa, marchgiana, limousin, entre outras) em um rebanho de matrizes de sangue zebuíno, a maioria de base nelore.

  • Unidades pecuárias que registram e identificam animais com brincos ainda são exceção
  • Gustavo e Beatriz Garcia Cid, com descendentes dos primeiros nelores importados da Índia

Uma contradição impera na pecuária do Paraná. O estado reduziu as exportações diretas de carne bovina a praticamente zero nos últimos seis meses. O fechamento do último frigorífico exportador – o JBS, de Maringá (Noroeste) –, em setembro de 2011, foi atribuído à falta de carne com padrão e volume constante. Em meio às discussões que tentam reanimar o setor e atrair novas indústrias, a pecuária do Norte e do Noroeste coloca essa avaliação em xeque. Se há algum problema com a qualidade do gado de corte paranaense, isso não ocorre nos principais polos pecuaristas, afirmam os produtores.

As diretrizes do programa de revitalização da pecuária anunciado pela Secretaria da Agricultura e do Abastecimento (Seab) devem ser apresentadas durante a ExpoLondrina. O governo do estado mostra-se preocupado com a falta de penetração da carne paranaense no mercado internacional. Ainda não foi divulgado, também, o valor a ser investido no projeto. A eficiência da produção pecuária, por sua vez, terá debate especial dia 12 (veja programação na página 30).

Qualidade é uma questão de sobrevivência, segundo Alexandre Turquino, pecuarista de Bela Vista do Paraíso (Norte) que vende mais de 1 mil cabeças de gado por ano. "Com a terra cara que nós temos [um hectare passa de R$ 20 mil], ou você realmente investe na pecuária ou vira agricultor", diz.

Para abastecer o mercado europeu, por exemplo, é necessário mais do que isso. Os plantéis precisam estar registrados no Sistema de Identificação e Certificação de Bovinos e Bubalinos (Sisbov), que rastreia o gado. O índice de rastreabilidade do Paraná é dos mais baixos do país: apenas 245 mil das 9,5 milhões de cabeças estão cadastradas no programa, 2,6% do total, conforme o governo estadual.

O chefe de Rastreabilidade e Certificação da Seab, Antonio Minoro Tachibana, afirma que esses números não podem ser tomados como índice da qualidade do gado de corte paranaense. O fato de os frigoríficos não pagarem bônus pelos animais rastreados desestimula o cadastramento no Sisbov, aponta. Os produtores reivindicam adicionais de 3% e 10%.

O veterinário Fábio Mezzadri, do Departamento de Economia Rural (Deral) do Paraná, afirma que o gado paranaense, em aspectos sanitários, de manejo e qualidade genética, é exemplar. A produção é direcionada ao mercado interno, que não exige rastreabilidade.

O rebanho paranaense sofreu queda de 8,5% entre 2004 e 2010, com ligeira oscilação positiva (0,9%) em 2011. Na competição com a produção de grãos e cana, a pecuária derrapa, mesmo numa época de preços elevados. Ná há queda maior na criação de bois de corte – que correspondem a mais da metade do rebanho estadual – devido aos projetos de integração lavoura-pecuária.

Otimista, o veterinário do Deral afirma que a tendência de queda do rebanho bovino paranaense tende a acabar, já que o preço médio da arroba do boi gordo no estado teve significativo aumento de 18% de 2010 para 2011 (de R$ 81,12 para R$ 95,57) e segue em patamares remuneradores.

Segundo Turquino, é mais difícil produzir gado de qualidade do que simplesmente cadastrar os animais. O padrão alcançado no Norte do Paraná exige rigorosa seleção genética durante décadas. O setor segue aproveitando o potencial dos reprodutores de elite e o clima favorável às pastagens, considera.

O diretor Agroindustrial da Sociedade Rural do Paraná, Luigi Carrer Filho, afirma que a idade dos animais abatidos prova que o setor se especializou. O índice teria passado de 4,5 para apenas 2 anos, ou 25 meses. "Isso é resultado de aprimoramento genético. Estamos na primeira linha há muito tempo", diz.

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