Criado em 2006, o Observatório Social de Maringá surgiu como uma resposta da sociedade aos casos de corrupção na prefeitura, como o desvio de recursos dos cofres municipais, que superou os R$ 100 milhões. Em seis anos, o grupo criado dentro da Sociedade Éticamente Responsável (SER) se tornou uma referência nacional na fiscalização da gestão de recursos públicos, tendo o modelo seguido por quase 60 cidades. Uma das pessoas que colaboraram para que esta experiência se tornasse bem sucedida foi o professor Carlos Anselmo Corrêa.
Nascido em Sarandi em 1960 (quando a localidade ainda era um distrito de Marialva), Anselmo é o nono filho de uma família de trabalhadores rurais. Aos 15 anos, passou a trabalhar como mensageiro na Universidade Estadual de Maringá (UEM), mesma instituição onde anos mais tarde se formaria em Geografia e atuaria como professor.
Durante sua vida acadêmica passou a integrar vários grupos ligados ao setor da educação e da igreja. Participou do Movimento Familiar Cristão e esteve presente no processo de fundação do Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino de Maringá (Sinteemar) e do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares do Noroeste do Paraná (Sinepe). Também presidiu os conselhos municipais do trabalho e de segurança. "Sempre tive esse escopo de participar de entidades da sociedade civil que tivessem o objetivo do desenvolvimento, sem qualquer comprometimento político partidário", declarou.
No comando do Observatório Social desde 2010, Corrêa entrega a presidência da entidade este ano. No entanto, ele disse que vai permanecer trabalhando no comitê gestor do grupo. "O Observatório Social é uma causa apaixonante para quem tem o verdadeiro conceito de cidadania."
Gazeta Maringá - Como foi o início do Observatório Social?
Carlos Anselmo Corrêa No início deste trabalho, eu era membro da diretoria da Acim [Associação Comercial e Empresarial de Maringá] e presidente do Sinepe. Maringá vivia um momento muito triste com casos gravíssimos de corrupção na prefeitura. Neste contexto, lideranças se mobilizaram para repensar a cidade, criando a SER [Sociedade Eticamente Responsável], mostrando que era possível transformar a sociedade com pequenos gestos. Dentro deste processo, surgiu o Observatório Social.
A criação do Observatório foi espelhada em algum trabalho que já existia naquela época?
Uma experiência que nos chamou a atenção foi o trabalho da Amarribo [Associação dos Moradores e Amigos de Ribeirão Bonito], formada em São Paulo pelo Antonino Trevisan. É um grupo que também tem um processo de controle das contas públicas, mas com uma metodologia diferente da do Observatório, trabalhando com auditorias sobre os relatórios apresentados.
E no que o Observatório Social se difere?
Nosso acompanhamento é feito em tempo real para evitar que os gastos públicos sejam feitos sem o devido retorno para a população. Acompanhamos os editais de licitação desde o processo de confecção, passando pelo preço efetivo do produto, sua qualidade e utilização. O Observatório é a parte mais visível de um processo de controle social. O nosso trabalho mostra de forma bem prática como o dinheiro está sendo aplicado. No entanto, o Observatório só se torna eficiente, eficaz e duradouro se tiver paralelamente um trabalho de educação fiscal para transformar a sociedade, algo que é feito pela SER em Maringá.
Quais foram os momentos mais marcantes da história do Observatório Social?
De início, cito o momento de conscientização do poder público e da população de que era preciso corrigir muitas questões em Maringá. Logo de imediato, tivemos a diminuição do preço nas licitações, a devolução de dinheiro aos cofres públicos, a devolução de mercadorias que haviam sido adquiridas fora do processo legal. O momento que vivemos hoje, com a ação do observatório no Legislativo, talvez seja o mais importante dentro deste processo de mudança social. Eu não conheço nenhuma outra cidade que faça o acompanhamento da produção legislativa.
E qual a consequência deste acompanhamento?
É maravilhosa. A nossa câmara é de muita qualidade em termos de sensibilidade ao posicionamento da sociedade. Isso foi mostrado no número de cadeiras que o legislativo terá na próxima gestão e na revisão dos subsídios definidos a toque de caixa. Maringá pode se orgulhar de ter um processo democrático mais amplo em função desse trabalho junto ao legislativo.
Você acredita que os vereadores estão votando de acordo com os anseios da sociedade?
Não em todos os casos. Eles têm atendido nos casos em que a sociedade de mostra participativa no processo. Nos demais, eles votam de acordo com seus interesses. A maior parte da sociedade ainda não sabe que a Câmara vive alterando o planejamento da cidade em termos de organização de espaço, por exemplo. Temos ruas construídas para serem de eixo residencial que são transformadas em eixo comercial. E existe especulação imobiliária em cima disso.
Estamos em um ano eleitoral. O trabalho do Observatório fica prejudicado de alguma forma?
Não. Os relatórios divulgados anteriormente estão disponíveis ao cidadão no nosso site, permitindo que o eleitor faça análise do desempenho de quem quer se reeleger. No entanto, como não temos nenhum comprometimento partidário e para evitar que os dados sejam utilizados politicamente, não divulgaremos nenhuma informação a partir do segundo semestre até que seja feita a eleição.
Quais foram as maiores dificuldades enfrentadas pelo observatório?
Primeiro foi o processo de conscientização por parte de servidores públicos e ocupantes de cargos eleitos de que nós não temos nenhum interesse partidário. A segunda questão é a escassez de recursos. Somos uma ONG que não capta nenhum tipo de recurso público, então é necessário um esforço muito grande dos segmentos empresariais para sustentar o Observatório.
Qual seria a estrutura ideal para o Observatório Social?
O ideal seria termos uma equipe para cada secretaria e outra para a Câmara. Infelizmente, nós somos em apenas quatro colaboradores contratados e 60 voluntários, o que é muito pouco. Poderíamos ser um observatório regional se tivéssemos mais recursos. Na nossa região temos municípios pequenos que não são auto-sustentáveis e onde a gestão nem sempre é de melhor qualidade.
O senhor já sofreu algum tipo de ameaça ou teve algum prejuízo com sua atuação no Observatório?
Acho que o grande prejuízo é o sentimento da minha família. Alguns vereadores personificam o observatório na pessoa de quem está ocupando sua presidência. Acabam atacando a pessoa sem discutir a causa. Isso pega muito mal para meus filhos e minha esposa. Eles me perguntam porque me exponho, mas respondo que esse é o preço que temos de pagar para chegarmos a uma sociedade mais desenvolvida, com menos filas nos hospitais, com menos mortes no trânsito e com recursos públicos sendo utilizados a serviço de todos.
O senhor assumiria algum cargo público se fosse convidado?
Sob hipótese alguma, é uma questão de princípios. Se eu substituísse esses valores por algo que poderia ser benéfico em um determinado momento, deixariam de ser princípios para se tornar conveniência. Em hipótese alguma assumira algum cargo público. Eu devo satisfação à sociedade, mas jamais a qualquer cargo hierárquico.
O que o senhor espera para as eleições deste ano?
Espero que o cidadão incorpore o conceito de voto consciente. Não é aquele voto que se faz em outubro quando teclamos na urna eletrônica, mas sim o voto que começa com a análise do candidato e do comprometimento com a causa que ele defende. É acompanhar suas ações durante os quatro anos de mandato. Votar consciente não é escolher o melhor candidato, é ingressar no processo democrático.
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