Vitor Hideki Tanaka, 11 anos, melhorou o desempenho em matemática depois que começou a frequentar aulas com método de ensino diferente| Foto: Hedeson Alves / Gazeta do Povo

Cálculos diários

Franco Iacomini, colunista de Finanças Pessoais

Quantos pães o senhor quer?

No supermercado, você para em frente à prateleira dos atomatados. A embalagem de 340 gramas do molho pronto Pomarola custa R$ 2,69; a de 520 gramas sai por R$ 3,98. Qual delas você leva?

Você está na fila da padaria e tem apenas R$ 2,20 no bolso. Dá uma olhada para o cartaz atrás do balcão, avisando que o quilo do pão custa R$ 4,80. Sabendo que cada pão pesa mais ou menos 50 gramas, quantos pães você pode comprar?

Os dois exemplos acima não foram tirados de livros escolares de matemática, mas de uma rápida visita a um mercado, aqui pertinho da redação. Eles servem como demonstração de como a matemática mais simples está no dia a dia do cidadão – e como a falta dela pode ser incômoda na hora de fazer as compras.

Quanto mais complexa a nossa vida financeira, mais dificuldades vão sendo adicionadas. E quem não teve um aprendizado razoável certamente terá dificuldades quando se defrontar com os juros cobrados nas compras a prazo, por exemplo. Estará sempre sujeito a tomar uma decisão errada por falta de conhecimento. Isso pode resultar em endividamento ou, por outro lado, em oportunidades desperdiçadas – o desconhecimento faz com que as pessoas ignorem, por exemplo, o efeito quase mágico dos juros acumulados ao longo do tempo, capazes de transformar uma aplicação modesta, de R$ 300 por mês, em meio milhão de reais depois de 30 anos, sem correr grandes riscos.

E o que dizer de outras proezas numéricas, cálculos formidáveis que nos permitem prever eclipses, programar máquinas, projetar estradas?

Como aluno mediano que fui nessa disciplina, não deixo de me admirar com tudo o que a matemática tornou possível na história da humanidade. Nem de ficar ansioso pelo que ela pode fazer pelo Brasil no futuro.

P.S. – Ficou curioso sobre as perguntas do início do texto? Respostas:

• a embalagem de molho com 520 gramas é mais econômica do que a de 340 gramas; R$ 0,03 mais barata a cada 100 gramas;

• peça 9 pães e espere um troco de mais ou menos R$ 0,04.

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Apesar do avanço notável na área educacional brasileira, de acordo com os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) divulgados ontem, o Brasil tem a matemática como o grande gargalo. Entre as três áreas avaliadas no teste, feito pela Orga­nização para Cooperação e Desen­volvimento Econômico (OCDE), a matemática é a que pontuou me­­nos (386), sem superar a barreira dos 400 pontos. Leitura ficou com 412 pontos e ciências, com 405.O Brasil ficou com média geral de 401 pontos, no 53.º lugar entre 65 nações avaliadas. Houve um progresso em relação à avaliação, feita em 2000, quando o país ingressou no teste. A média geral havia ficado em 368 pontos e o Brasil era o último colocado entre os 43 países participantes na época. No ano passado, participaram da pesquisa 470 mil estudantes, sendo 20 mil no Brasil. Na época, os avaliados estudavam em escolas públicas, públicas federais ou privadas e tinham 15 anos (nascidos em 1993).

Mesmo com uma má pontuação, a média em matemática é a que teve maior avanço no país. Com o exame feito a cada três anos, houve crescimento de 334 pontos, em 2000, para 386 neste ano. Para o ministro da Educação, Fernando Haddad, uma das explicações para o avanço dos estudantes em matemática é a consolidação e popularização da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep). Criado em 2005, o concurso contou, neste ano, com a participação de 19,6 milhões de alunos. "Eu era cético quanto ao impacto das olimpíadas no desempenho, mas já existem estudos que comprovam essa relação", declarou o ministro.

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O incremento de 16 pontos na pontuação do país em matemática, com relação ao levantamento de 2006, ainda é muito aquém da média da OCDE (de 497). O total brasileiro está 111 pontos abaixo. Grande parte dos estudantes no Brasil (69%) chegou apenas ao nível 1 de compreensão (em uma escola de 1 a 6), contra 73% em 2006. Esses jovens não conseguem ir além dos problemas mais básicos e têm dificuldades de aplicar conceitos e fórmulas. Na avaliação da OCDE, eles teriam inclusive dificuldades de tirar proveito de uma educação mais avançada.

Para o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Ângelo Souza, o problema maior no ensino de matemática é a formação pedagógica do docente. "As políticas de aprendizagem nos últimos 15 anos focaram a matemática e as olimpíadas são um bom exemplo. No entanto, temos de discutir melhor o perfil do professor, que tem grande conhecimento na área, mas uma formação didático-pedagógica inadequada".

Souza acredita ainda que, além do país lidar melhor historicamente com a área de linguagem, o Brasil precisa investir na formação de professores para ensinar as novas gerações de forma mais dinâmica. "No ensino básico temos professores de matemática tradicionais ou muito novos e inexperientes. Precisamos discutir esse conjunto de problemas".

Dificuldade

O estudante Vitor Hideki Tanaka, 11 anos, é um exemplo de aluno que ia mal em matemática e só conseguiu superar o desempenho ruim com aulas extras. Há quatro anos, ele frequenta aulas no Método Kumon (que busca formação de estudantes autodidatas). Antes das aulas, a mãe do menino Cristiane Sayomi Nakayama conta que ele não conseguia resolver as operações e chorava em todas as situações de dificuldade. "Hoje, o entendimento dele é impressionante. Ele nem precisa mais estudar para as provas da escola".

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A professora do método Neli Tamiko Uesu, que leciona há 16 anos, acredita que a melhora no desempenho de Vitor, e de todos os alunos que estudam o método, se deve à disciplina. "Os alunos brasileiros precisam de mais seriedade e vontade de estudar. Criar o hábito de que é preciso estudar um pouco, todos os dias, é fundamental". Concentração é outra atitude pontuada por Neli. "O aluno precisa sentar e terminar o exercício, e não se dispersar".

Países orientais são os que apresentam melhor desempenho em matemática. A China, por exemplo, obteve 600 pontos na área. O país foi o melhor colocado em todas as áreas.

Classificação geral

O último colocado do levantamento é o Quirziquistão, no Oriente Médio, com média de 325 pontos. Na América Latina, o Brasil é o 4.º colocado, atrás de Chile (439), Uruguai (427) e México (420). Entre os estados brasileiros, o melhor colocado é o Distrito Federal, com média 439. O Paraná ficou em 5.º, com 417 pontos. Alagoas teve o pior desempenho, com 354 pontos.

Comparar sistemas de ensino exige cautela

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Segundo o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Ângelo Souza, não é possível comparar o desempenho do Brasil com países que ficaram nas primeiras colocações do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa). A província de Shangai, na China, foi a 1.ª colocada, com 577 pontos, seguida por Hong Kong (546) e Finlândia (543).

Segundo ele, esses países têm, além de características culturais diferentes, um maciço investimento na área educacional. Além disso, Souza lembra que, se o Brasil fosse avaliado apenas com os números das escolas públicas federais, estaria entre os 10 melhores colocados. A média geral das públicas federais no país foi de 528 pontos – ficaria na frente do Canadá, em 7.º lugar (527 pontos).

Já o vice-presidente do Instituto Sangari no Brasil, Jorge Werthen, avalia que o avanço do Brasil no Pisa mostra um caminho "satisfatório" nas políticas públicas empregadas na área. "Toda modificação no sistema educacional é um processo lento". O ministro da Educação, Fernando Haddad, salientou que o "pior momento" da educação brasileira foi o início da década, quando o país ocupou a lanterna no ranking do Pisa. Segundo o ministro, essa tendência está revertida, porém, a escola não pode se ocupar somente com essas avaliações. "A educação não se reduz a isso. Os testes padronizados são importantes, mas não esgotam a questão", apontou.

Colaborou Aline Peres.