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A data de corte adotada na implantação do ensino fundamental de nove anos não deveria ser encarada com tanta polêmica. Essa é a opinião da assessora técnica da Secretaria de Educação Básica (SEB) do Ministério da Educação (MEC), Aricélia Ribeiro do Nascimento. Pedagoga e especialista em alfabetização, Aricélia participou do projeto de pesquisa que culminou na publicação Ensino Fundamental de Nove Anos: Orientações para a Inclusão da Criança de Seis Anos de Idade, distribuída pelo MEC aos municípios.

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No Paraná, uma liminar expedida em março pela 1.ª Vara da Fazenda Pública, por solicitação de uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual (MPE), derrubou a data de corte deliberada pelo Conselho Estadual de Educação do Paraná (CEE-PR). Com essa decisão, torna-se obrigatória a matrícula de todas as crianças do estado com mais de 5 anos (ou seja, 6 anos incompletos) no primeiro ano do ensino fundamental.

Para Aricélia, data de corte adotada em âmbito nacional é o início do ano letivo quando as crianças devem ter 6 anos completos. Ela explica que o Conselho Nacional de Educação (CNE) e a Câmara de Educação Básica (CEB) adotam essa data e ressalta que a lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, dispõe sobre a entrada da criança com 6 anos no ensino fundamental. " É com 6 anos, não 5 anos e um mês nem 5 anos e meio", afirma.

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A assessora técnica do MEC esteve em Curitiba durante a semana para participar de um debate sobre o ensino fundamental de nove anos. A discussão integrou o Fórum Estadual da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação do Paraná (Undime-PR), que contou com a presença de 184 representantes da área. Em entrevista concedida à Gazeta do Povo, Aricélia falou sobre a implantação do novo ensino fundamental no Paraná e no Brasil.

Na sua opinião, porque há tanta polêmica em torno da implantação do ensino fundamental de nove anos?Se pensarmos na entrada da crianças de 6 anos no ensino obrigatório, é uma coisa nova para praticamente 80% dos municípios brasileiros. Esse dado por si só já exige uma reflexão do que é o ensino fundamental e a educação infantil atual. Pedagogicamente nós temos muita demanda porque a nossa prática é de trabalhar com essas crianças na educação infantil. A expectativa é de repensar esse novo ensino fundamental, tarefa para alguns anos de trabalho.

O Paraná vive uma polêmica batalha jurídica, que agora dá o direito do ingresso de crianças com 5 anos no ensino fundamental de nove anos. Como fica a cabeça do aluno e da família nesse caso?Essa é uma situação séria. Entendo que uma criança de 6 anos é aquela que completa 6 anos no início do ano letivo. Se é estabelecido o ano letivo todo para o ingresso, então há uma desconsideração da orientação do Conselho Nacional. A ampliação do ensino fundamental de acordo com a lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, estabelece a entrada da criança de 6 anos. Não a de 5 ou 5 anos e meio. Na verdade, explodem nesse momento também datas aleatórias de corte que já existiam com a entrada antecipada da criança na educação infantil.

Esse é o caso do Paraná, por exemplo, no ensino fundamental, no qual, na prática, já entravam crianças com 6 anos de idade na primeira série?Exatamente. E quando o Conselho Nacional normatiza uma data de corte, coloca-se em discussão todas as outras que já existiam. Agora, o que se precisa analisar é quem está entrando no sistema, que nunca estudou, e as crianças que já estavam na escola. O que a gente diz é que as resoluções e as deliberações dos estados precisam prever um tempo de transição.

Na sua opinião, o Paraná poderia ter previsto um período de transição maior, uma vez que a legislação nacional coloca 2010 como o ano limite para a implantação do novo ensino fundamental?Não é só o Paraná. Enquanto houver crianças matriculadas no ensino fundamental de oito anos já existirá essa transição, que vai acontecer naturalmente. O que precisa estar é explicitado, escrito e registrado nas resoluções. Por exemplo, a educação infantil, se ela era de seis anos, agora passa a ser de cinco. E a data de corte na maioria das vezes não era a mesma que do ensino fundamental. Agora, é preciso ajustar isso, o que não acontece de uma hora para a outra.

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Temos então hoje, no Paraná, a possibilidade de crianças com 5 anos entrarem no ensino fundamental e muitos pais defendem que seus filhos já estão praticamente alfabetizados com essa idade. Qual a idade certa para a alfabetização?Para mim, esse não é um argumento plausível nem pedagógica, nem administrativamente. Nem legalmente. Se estamos ampliando o ensino fundamental na base, nós do Ministério da Educação assumimos que vamos ter um tempo mais largo para o trabalho da alfabetização, do letramento, do conhecimento lógico matemático e das outras linguagens e expressões. Antes, se tínhamos culturamente 200 dias na primeira série de oito anos, agora temos 400 dias para consolidar o trabalho da construção e elaboração da base alfabética. Pensamos ainda num tempo ideal, que seria os três primeiros anos do ensino fundamental, ou 600 dias, para a criança de fato estar alfabetizada.

A questão da data de corte está sendo amplamente divulgada para a sociedade. E o planejamento pedagógico, como fica? A comunidade escolar não deveria estar também preocupada com isso?Claro. Eu acredito que a ampliação do ensino fundamental para nove anos significa um repensar do ensino fundamental inteiro. De como trabalhar a infância e a adolescência nesse ensino. Os conteúdos, o currículo, a organização do tempo e espaço, a avaliação, a organização dos professores, dos gestores, as metodologias, ou seja, tudo aquilo que compõe o dia-a-dia da escola precisa ser repensado. A data de corte é uma deliberação administrativa. Tudo o que vem depois constitui esse novo repensar do ensino fundamental inteiro.

Podemos definir o ensino fundamental de nove anos como colocação de mais um ano nessa etapa da educação?Não. Isso é minimizar. Porque, com a ampliação do ensino fundamental para nove anos, a expectativa é de que seja revista a proposta pedagógica de escola, de secretaria, de município. O objetivo é qualificar o ensino e a aprendizagem, especialmente não dando a exclusividade do trabalho de alfabetização para 200 dias, mas ampliando esse tempo.