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Ensino a distância

MEC ameaça cursos 100% a distância; faculdades pressionam governo a separar o “joio do trigo”

O ministro da Educação, Camilo Santana, considera o cenário dos cursos de ensino superior EaD "alarmante e desafiador". As entidades que representam as universidadese particulares concordam com o diagnóstico, mas cobram do MEC medidas que atinjam apenas as instituições de baixo rendimento. (Foto: )

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O Ministério da Educação (MEC) adotou diversas medidas na tentativa de diminuir o crescimento das graduações a distância neste ano. O ministro Camilo Santana abriu consultas públicas para ouvir o setor, mas tem decidido na direção oposta do que os representantes de universidades particulares desejam. Santana anunciou a suspensão de 17 cursos na modalidade EaD e, recentemente, adiantou que todos os cursos de licenciatura não poderão ser mais realizados a distância. Apesar de as entidades que representam instituições particulares concordarem que deve haver melhorias, elas cobram do MEC iniciativas que avaliem a qualidade dos cursos e medidas que atinjam apenas as instituições de baixo rendimento. A criação de uma agência reguladora é considerada uma solução pelos dois lados, mas ainda é preciso discutir como se dará a atuação da autarquia.

Durante a divulgação do Censo de Ensino Superior, o ministro afirmou que o cenário do ensino EaD é "alarmante e desafiador". "O papel do MEC é esse: de coordenar e regular isso [crescimento dos cursos EaD]. Então exige um sinal vermelho aceso para que a gente possa tomar medidas", ressaltou Santana.

Nos últimos oito anos, houve um aumento de 87% nos cursos de EAD, segundo dados do Censo de Ensino Superior de 2022. Um crescimento estrondoso que dificultou o acompanhamento por parte do MEC e que, segundo Santana, a pasta não possui condições de fazer. O Ministério da Educação confirmou que está cogitando a criação de uma agência reguladora para fiscalizar as universidades.

“Qual foi a última vez que o MEC visitou um polo para avaliá-lo? Falar em qualidade sem avaliação é lançar suposições ao vento”, afirma Elizabeth Guedes, presidente da Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup). Para ela, há muitos cursos EaD ruins que devem ser descredenciados, mas há também instituições que oferecem um ensino de qualidade. Por isso, Guedes acredita que o MEC deve avaliar a qualidade antes de tomar qualquer iniciativa.

Com a suspensão da oferta de cursos a distância, instituições com ou sem qualidade são tratadas da mesma forma. “O MEC está tratando isso de forma superficial e injusta. Porque cita o ensino a distância como se fosse um desserviço ao Brasil, quando muitos alunos e muitas escolas têm feito o uso dessa modalidade para progredir nos estudos”, completa Guedes.

A Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) acredita que os cursos de graduação são de grande importância para o acesso de jovens e adultos que moram fora dos grandes centros. Além de profissionais que estão no mercado de trabalho e possuem limitações para promover a formação acadêmica.

Agência reguladora de ensino superior é considerada pelo MEC

“No caso do EaD, precisamos calibrar a dimensão prática da formação, melhorar a qualidade das condições do trabalho docente; aprimorar os processos de avaliação discente; submeter o sistema a avaliações externas mais constantes”, aponta Rodorval Ramalho. O sociólogo e professor da Universidade Federal de Sergipe ainda afirma que “o Brasil precisa, urgentemente, de uma reforma universitária. Nosso sistema é disfuncional e caro”.

O MEC confirmou que Camilo Santana quer criar uma agência para fiscalizar universidades, com autonomia para aplicação de multas e até descredenciamento de cursos.  Para a instalação da autarquia, o MEC precisará da aprovação do Congresso Nacional. Ainda segundo o órgão, o governo deve tentar aproveitar um projeto de lei, apresentado em 2012 pelo governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

A criação de uma agência reguladora vai na linha do que é pedido pelos representantes das universidades. Apesar disso, Elizabeth Guedes afirma que o texto do projeto de lei que o MEC deseja reaproveitar está ultrapassado. “O texto trata de um Brasil de 12 anos atrás. Nós precisamos de uma agência de regulação moderna. Que leve em consideração todos os avanços da tecnologia, a inteligência artificial. Por que não começar olhando para frente?”, questiona.

A expansão do EaD nos últimos anos

Até 2017, para abrir um polo de educação a distância, era necessária a visita do MEC como parte do processo de autorização. Diante da alta demanda, o órgão ficou impossibilitado de realizar todas as visitas.

Neste contexto, foi publicada uma portaria que facilita a implementação de polos para oferta de ensino a distância. Segundo o documento, a quantidade de polos abertos por ano seria definida de acordo com a nota da instituição que desejaria abri-lo. Anualmente, as instituições com nota 3 podem abrir 50 polos, as de nota 4 têm direito a 150, e as de nota 5 têm autorização para 250.

A resolução de 2017 continua em vigor. Com a pandemia da Covid-19, na qual os serviços remotos foram ainda mais procurados, o crescimento se tornou incontrolável. De 2020 a 2022, houve um aumento de 1,2 milhão nas matrículas em cursos de graduação EaD. Já na modalidade presencial foi registrada uma queda de 460 mil matrículas.

Segundo dados do Censo de Ensino Superior de 2022, o número de professores nas instituições privadas (151.425) é menor do que os professores da rede pública (173.373), sendo que as instituições particulares representam 89% dos graduandos. A quantidade de professor por aluno é muito maior na modalidade EaD. As universidades públicas possuem 12 docentes por aluno, no geral. Mas o número chega a 174 professores por estudante nos cursos a distância de instituições privadas.

Para as particulares, é preciso avaliar qualidade e descredenciar instituições ruins

“O MEC fica em uma posição muito confortável, jogando pedra nos cursos EaD e não fazendo o trabalho dele”, afirma Elizabeth Guedes. Para a presidente da Anup, o órgão deveria revogar a portaria de 2017 e impedir a criação de novos polos, ao invés de suspender cursos na modalidade. “Freia o crescimento agora, para com a abertura automática de polo, avalia, coloca em supervisão, descredencia todo mundo que está com nota 1 e 2”, sugere.

Segundo ela, hoje não há nenhum instrumento de avaliação, nem visita em polos EaD. “O primeiro passo deveria ser uma ampla avaliação de tudo o que está acontecendo, de todos os polos. Vamos ver quais são os polos que estão oferecendo cursos de qualidade e aqueles que não estão serão fechados”, reforça Guedes.

A ABMES possui um posicionamento semelhante à Anup e cobra do MEC a promoção da “melhoria das condições de oferta desses cursos, com modernização da avaliação, regulação e supervisão dessa modalidade”.

“Esse ar de escândalo com o EaD parece esquecer que existem problemas semelhantes no sistema presencial”, afirma Rodorval Ramalho. Ele acredita que o ensino superior como um todo está precário. “Não podemos usar o padrão de qualidade do EaD para nos esquivarmos da discussão sobre o nosso sistema universitário presencial, que aparece em situação vergonhosa nos rankings internacionais”, complementa.

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