“Para comprar a área de um proprietário, os moradores precisariam juntar a renda de várias famílias. Pela nossa metodologia, cada um paga a sua parte.” André Luís Cavalcanti de Albuquerque, advogado| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

Conciliar o interesse dos proprietários de terras invadidas e de quem ocupou o terreno. A tarefa não é simples, mas está no rol de serviços da Terra Nova Regularizações Fundiárias, sediada em Curitiba. Fundada em 2001, a empresa desenvolveu um método para agilizar o processo de regularização de posse de áreas e para indenização dos proprietários. Por esse motivo, a companhia venceu o prêmio Empreendedor Social deste ano, promovido pela Fundação Schwab e pelo jornal Folha de São Paulo. A empresa já assentou mais de 30 mil famílias – 4,5 mil no Paraná.

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Além de amenizar os ânimos das disputas, a Terra Nova investe parte do valor recebido em infra-estrutura. "Nós fiscalizamos os investimentos, mas a escolha das melhorias implantadas é da Associação de Moradores local", explica o advogado André Luís Cavalcanti de Albuquerque, o líder da empresa. O mercado de trabalho da Terra Nova é extenso. De acordo com o Ministério das Cidades, 12,6 milhões de brasileiros vivem em áreas sem serviços públicos e 3,1 milhões estão em assentamentos precários. Confira os principais pontos da entrevista com Albuquerque:

A Terra Nova é rentável mas tem fins sociais. Como é sua forma de operação?

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Até o surgimento da nossa empresa, a regularização só era feita pelo poder público. Para que o governo intervenha em áreas privadas, é necessário desapropriar, comprando áreas dos particulares e vendendo para quem a ocupava. E isso é muito caro. Nós encontramos uma maneira de fazer essa composição de forma amigável, amarrando por meio de acordos judiciais e fazendo a mediação entre o proprietário e os ocupantes. O proprietário prefere nos dar um porcentual do terreno a perder o valor total da área com invasão. E a população quer pagar, porque tem moradia consolidada e busca segurança.

Como funciona o método desenvolvido?

Trata-se de uma expropriação (destituir da mão de particulares terrenos com a finalidade de cumprir a função social) judicial, em vez de o governo desapropriar a área e pagar por isso. O juiz estabelece um preço pelo metro quadrado. E a expropriação divide no número de lotes possíveis para assentar as famílias. Isso é inédito. Não regularizamos ninguém em área de risco, onde estaria uma rua ou em Área de Preservação Permanente, por exemplo.

Como a Terra Nova se sustenta?

Na maior parte das vezes, é a proprietária da área que nos procura para fazer a mediação. E a Terra Nova recebe uma porcentagem variável do valor do terreno, dependendo do tamanho da área e número de famílias. Uma parte da quantia é usada para investimentos na infra-estrutura da área, definido pela Associação dos Moradores. E uma parte fica para a Terra Nova. O restante é pago pelas famílias ocupantes. A expectativa de ganho da Terra Nova não pode inviabilizar o processo, mas, em geral, 20% do valor vai para a empresa e 20% se destina à comunidade.

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De onde surgiu a idéia de criar uma empresa com essa forma de atuação?

Eu atuei na prefeitura de Pinhais para fazer a mediação de algumas áreas ocupadas no município. Porém, na troca de prefeitos, não segui no poder municipal. Como tinha negociado com os proprietários e o novo prefeito não daria seguimento ao trabalho, montei uma companhia que faria isso pela iniciativa privada. E a empresa, com fins sociais, cresceu e se tornou sustentável. A partir daí, dei-me conta do tamanho do mercado que eu tinha. Na Região Metropolitana de Curitiba, são 136 mil famílias em áreas irregulares.

Hoje, a Terra Nova atua no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Rondônia, no Distrito Federal e no Mato Grosso. Como foi essa expansão?

As empresas desses locais nos procuraram. Em Brasília, o Banco Mundial nos levou para lá. Cerca de 25% da população da cidade está em áreas irregulares. No Rio de Janeiro fomos contratados pela Light, concessionária de energia elétrica fluminense, que tinha um terreno invadido. Mas nem sempre o contato é feito pelos proprietários. Alguns moradores procuram a Terra Nova com a intenção de obter a regularização, sabendo que o governo não tem dinheiro para desapropriar. Para comprar a área de um proprietário, os moradores precisariam juntar a renda de várias famílias. Pela nossa metodologia, cada um paga a sua parte. Quem quita suas obrigações, ganha o título de posse.

Em sua opinião, quais as principais conquistas da Terra Nova?

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Acredito que uma das principais foi a institucionalização da técnica de acordo judicial. Amarramos em um artigo que nunca foi usado para isso (1228/02 do Código Civil). Esse molde foi homologado no Paraná, em São Paulo e em Porto Velho (RO). Também mostramos à sociedade que essa cultura do paternalismo nem sempre é eficaz. Nós fazemos com que a população contribua no processo de tal forma que se torna um exercício de cidadania. Quem ganha a terra, não valoriza da mesma forma do que quem compra.

Quais as perspectivas para o futuro da Terra Nova?

Em cinco anos, a meta é operar em todas as capitais brasileiras. E, depois, seguir para a América Latina e África, países em que o modelo desenvolvido pode ser reproduzido.