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Rumo aos EUA

Cubano anuncia por rede social que abandonou Mais Médicos

Agência O Globo

O médico cubano Ortelio Jaime Guerra, participante do Mais Médicos, anunciou que abandonou o programa do governo federal. Em postagem na sua página do Facebook, ele disse que já se encontra nos Estados Unidos. O país possui um programa de vistos específicos para profissionais cubanos em missão no exterior que não querem retornar à ilha.

Guerra trabalhava em Pariquera-Açu, município de cerca de 20 mil habitantes no Vale do Ribeira, interior de São Paulo. A informação foi confirmada pelo secretário de Saúde da cidade, William Rodrigo Virgínio de Souza. O Ministério da Saúde, porém, ainda não oficializou a saída de Guerra do Mais Médicos.

Em sua página no Facebook, Guerra contou, na madrugada de ontem, ter deixado o posto em Pariqueira-Açu (SP) e já estar nos Estados Unidos. "Meus amigos de Pariqueira-Açu, eu preciso que vocês saibam que tive que ir embora de lá sem falar isso pra ninguém por questões de segurança", diz o médico na rede social, em um misto de português e espanhol.

"É uma questão humanitária", diz deputado

O deputado paranaense Abelardo Lupion diz que decidiu hospedar a médica cubana Ramona Rodríguez por uma "questão humanitária". Segundo o parlamentar, ela chegou a Brasília apenas com uma pequena mala e uma muda de roupa. "Tivemos de fazer uma vaquinha para ela conseguir comprar alguns produtos de higiene." A arrecadação entre deputados do DEM levantou até quinta-feira R$ 850, quase o mesmo valor que Ramona recebia de salário (R$ 900).

Além da hospedagem, o transporte de Ramona é feito por um carro particular de Lupion, cujo motorista é funcionário de seu gabinete. De acordo com o ato número 5 da Mesa Diretora da Câmara, de maio de 2011, o imóvel funcional "destinar-se-á exclusivamente à residência do deputado e de seus familiares, vedada a transferência a terceiros, a qualquer título."

O deputado nega irregularidades. "A partir do momento que a casa está à minha disposição e ao trabalho político que a mim é facultado, eu recebo quem eu quiser. Não vejo nada de mal, o recurso é do meu bolso", afirma Lupion.

Como foi a saída da cubana Ramona Rodriguez do Mais Médicos

Sábado (1/2)

Ramona deixa a cidade de Pacajá, no interior do Pará, onde trabalhava no programa Mais Médicos. Ela viaja para Brasília e se hospeda na casa de uma amiga.

Terça-feira (4/2)

A médica vai à embaixada dos Estados Unidos e pede asilo político. No mesmo dia, procura o deputado federal Ronaldo Caiado (DEM), principal crítico do Mais Médicos no Congresso, e é recebida na liderança do DEM na Câmara, onde passa a noite. Quarta-feira (5/2)

O DEM entra com pedido de refúgio político para Ramona no Comitê Nacional de Refugiados do Brasil. Ela passa a ter direito de morar e trabalhar no país até uma decisão. Depois disso, hospeda-se na casa do deputado Abelardo Lupion (DEM), onde permanece.

Sexta-feira (7/2)

Ramona consegue carteira de trabalho. Ela não pode trabalhar como médica no Brasil fora do Mais Médicos porque não teve o diploma revalidado, mas pode buscar outro emprego.

Ontem (10/2)

Na condição de testemunha, a médica presta depoimento ao Ministério Público do Trabalho em investigação que apura condições de trabalho de profissionais contratados pelo Mais Médicos. Outro cubano, Ortelio Jaime Guerra, deixa o programa.

Primeira cubana a deixar o programa Mais Médicos, Ramona Rodriguez permanece hospedada há seis dias no apartamento funcional do deputado federal Abelardo Lupion (DEM-PR). Com carteira de trabalho em mãos desde a última sexta-feira, ela espera conseguir em breve um trabalho no Brasil. E, caso não consiga asilo político nos Estados Unidos, planeja fazer a prova para revalidar o diploma e voltar a exercer a profissão.

Ramona concedeu entrevista exclusiva à Gazeta do Povo ontem à tarde, na casa de Lupion, em Brasília.

Falou sobre o medo de regressar a Havana e ser presa, classificou o Mais Médicos como "boa intenção", mas voltou a questionar o pagamento diferenciado aos cubanos. "Há muitos médicos que também pensam como eu, aos quais eu não quero comprometer. A decisão de cada um é pessoal."

Como a sra. vê a notícia de que outro cubano saiu do Mais Médicos?

Acabei de saber disso. Mas não tenho informações sobre as condições da saída. Também não o conheço, nem sei onde está.

Entre outros cubanos há revolta por causa da diferença de salário com relação ao pago para profissionais de outros países?

Não sei, porque desde que eu vim não tive mais contato com cubanos.

Quando a sra. descobriu essa diferença?

Descobri quando cheguei aqui, durante o curso preparatório de três semanas que nos deram, falando com médicos de outros países. Eles diziam que o salário era diferente, que as condições de trabalho eram diferentes. Eu investiguei e descobri que eles recebiam R$ 10 mil por mês. Foi só por isso que eu saí do programa.

Desde sexta-feira, após o pedido de refúgio no Brasil, a sra. tem carteira de trabalho e pode trabalhar aqui. Já recebeu algum tipo de proposta?

Até agora, não. Mas trabalhar é só o que quero. Tenho que viver, que trabalhar para me manter, até que saia o pedido de asilo que fiz à embaixada dos Estados Unidos. Não posso viver de ar.

Quanto tempo vai demorar a resposta sobre o asilo dos Estados Unidos?

Eles me disseram que de três a quatro meses.

E se a resposta dos Estados Unidos for negativa?

Então suponho que precisarei ficar aqui. O que eu não posso é retornar a Cuba. Lá eu serei presa.

A prisão seria certa?

Certa, certa.

Algo pode acontecer com sua família em Cuba?

Não fizeram nada. Legalmente não há o que fazer. Mas eu sempre temo algo. Eu me comunico todos os dias com minha filha e até agora está tudo tranquilo.

A sra. já trabalhou na Bolívia em outro projeto do governo cubano. Qual a diferença em relação ao Mais Médicos?

Este [Mais Médicos] é diferente, é um contrato. Quando eu estive em Bolívia foi por uma missão humanitária. Trabalhei como missionária.

Qual a sua impressão em relação ao Brasil?

É um país que tem leis, que defende tanto os brasileiros quanto os estrangeiros. É um país muito democrático e, principalmente, com total liberdade para todos.

O que a sra. pensa do Mais Médicos?

É bom. Tem uma boa intenção, sobretudo para levar saúde para os mais pobres. Eu não estou contra o programa. Sou contra o pagamento diferenciado aos médicos cubanos em relação aos médicos de outros países. Todos trabalhamos com as mesmas condições e o mesmo profissionalismo.

O que falaria para um companheiro de Cuba que estivesse vindo ao Brasil sobre o Mais Médicos?

Não falaria nada e nem tenho condições de falar. Legalmente, pelo ponto de vista de Cuba, eu sou uma traidora. Há muitos médicos que também pensam como eu, aos quais eu não quero comprometer. A decisão de cada um é pessoal.

O que é possível dizer sobre seu futuro?

Já lhe disse: quero trabalhar. Claro que, a princípio, não vai ser como médica, porque aqui há leis que exigem a revalidação do meu diploma. O trabalho é a fonte para que, a cada dia, uma pessoa tenha mais liberdade.

Caso não seja possível o asilo nos Estados Unidos, a sra. pensa em fazer a revalidação do diploma?

Claro, sou médica! Se não for possível o asilo, quero estudar, estudar e revalidar meu diploma.

Um deputado do Pará [Zé Geraldo (PT)] disse várias coisas negativas sobre a sra. e que as pessoas de Pacajá comemoraram sua saída do Mais Médicos.

Não ouvi nada disso. Ademais, não dou crédito a isso porque houve uma reportagem sobre meu desempenho na cidade de Pacajá, com pacientes que atendi, que falaram que meu trabalho era ótimo. Se houvesse argumentos para me expulsar do programa, isso teria acontecido antes de eu sair por conta própria.

Como a sra. vê a disputa política no Brasil entre partidos de oposição como o DEM e o governo sobre o Mais Médicos?

Dessa parte não me pergunte, nada porque eu não sei nada. Não sou política, sou médica.

Ainda há receio de ser alvo de alguma ação da Polícia Federal?

Agora não, mas antes eu tive sim. Quando eu deixei o programa, soube que eles foram me procurar. Eles dizem que não fizeram nada disso, mas bem.

Mas há algum tipo de medo?

Não com relação ao Brasil, às pessoas daqui. Mas há muitos cubanos aqui no Brasil. O pessoal daqui [do gabinete do deputado Lupion] cuida de mim dia e noite, mas sempre há algum temor. Tenho medo que aconteça algo.

Pelas mãos de quem?

De alguma pessoa cubana. Não dos brasileiros, esses me cuidam bem. As pessoas têm os seus medos, não é verdade?

Mas a situação aqui não é definitiva. Em quanto tempo é possível ter uma vida normal?

Não sei. O que sei é que não posso regressar a Cuba em nenhuma hipótese. O medo é que me deportem, ou que aconteça algo comigo aqui também.

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