Terreno próximo ao Parque Mata dos Godoy, onde poderá ser construído um aeroporto de cargas em Londrina| Foto: Roberto Custódio/Gazeta do Povo

Projeto

Definições devem sair até o final do mês

Com custo inicialmente estimado entre R$ 1 bilhão e 2 bilhões, os estudos de viabilidade técnica e econômica da implantação de um aeroporto de cargas na zona sul de Londrina devem ser financiados pela Agência dos Estados Unidos para o Comércio e Desenvolvimento (Ustda), órgão de fomento do Congresso Americano. A comitiva norte-americana que esteve na cidade em fevereiro para avaliar o projeto visitou, neste mês, a Secretaria Estadual de Infraestrutura e Logística. "Nossa expectativa é que a resposta venha até o fim do mês", afirma Marcelo Mafra. Já a visita de um grupo de empresários italianos, no mês passado, ainda não rendeu respostas concretas. "Soubemos que a repercussão foi boa, mas não houve manifestação oficial de interesse."

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"É como um cristal, se quebrar, não se recompõe. No futuro falarão ‘Ah!’, todos esses ‘Ahs!’ que vemos hoje, os americanos reclamando que não têm floresta. A Mata Atlântica é a maior biodiversidade do mundo."

Maria Helena Godoy, moradora da fazenda onde está prevista a passagem das pistas do aeroporto de cargas do projeto Arco Verde.

Remanescente florestal mais importante do Norte do Paraná, o Parque Estadual Mata dos Godoy, na zona sul de Londrina, está ameaçado. Segundo estudiosos, o ecossitema de uma área de 690 hectares de Mata Atlântica, que abriga 200 espécies de árvores nativas, 300 de aves e 60 de mamíferos, pode entrar em colapso caso um aeroporto de cargas seja construído nas imediações.

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Integrante do projeto Arco Norte – que prevê a criação de infraestrutura para a atração de indústrias nos municípios de Londrina, Ibiporã, Cambé, Rolândia, Arapongas e Apucarana – o aeroporto está previsto para uma área ao lado da reserva. Preocupados com a ameaça que a obra representa à biodiversidade, ambientalistas e estudiosos do parque criaram o movimento "Arco Norte Sim, perto da Mata Não!"

O doutor em Ecologia e professor do Laboratório de Biodiversidade e Restauração de Ecossistemas (Labre), da UEL José Marcelo Torezan afirma que o aeroporto é incompatível com a sobrevivência da mata. "É tanto ruído e tanta poluição atmosférica que as aves deixariam de se reproduzir e, com isso, as plantas também deixariam de se reproduzir", aponta o pesquisador, que se dedica à Mata dos Godoy desde 1984. Além da regulação do clima local, a floresta – que abriga 28 animais ameaçados de extinção – tem influência na captação de água que abastece parte de Londrina e de Arapongas. "Não temos muitas alternativas de água, já que o Aquífero Guarani está sob ameaça de contaminação".

O gestor ambiental Gustavo Góes, da ONG Meio Ambiente Equilibrado (MAE), revela que o local faz parte de uma zona de amortecimento, que totaliza 3 mil hectares de Mata Atlântica. "Essa complemento é previsto em lei, tudo é um sistema único. Pelo nosso levantamento inicial, existem cinco alternativas melhores na Região Metropolitana de Londrina, áreas sem tensão ambiental", defende.

Os idealizadores do projeto Arco Norte classificam a área como "preferencial" para a instalação do aeroporto por causa da localização estratégica. "Todas as cidades distam 16 quilômetros daquela região. Estamos pensando em um processo ordenado de desenvolvimento, com a otimização dos recursos e a redução de custos", explica Marcelo Mafra, consultor do Arco Norte ligado à Associação Comercial e Industrial de Londrina (Acil).

Mafra admite que o fator ambiental será considerado apenas em um segundo momento e que locais alternativos ainda não foram pensados. "Isso são suposições, as aves sofrem adaptação. Não é só porque estudaram a mata que tudo o que dizem é sagrado. Hoje em dia é possível conviver pacificamente. Já temos know how para isso", defende.

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Filha de pioneiro teme prejuízos para a região

Foi por volta de 1920 que Olavo Godoy e seus irmãos, vindos de Campinas, adquiriram uma concessão de terras da coroa inglesa no Norte do Paraná. Pioneiros, decidiram deixar um pedaço de mata nativa em volta de todas as estradas que construíram. "Eles tinham paixão especial pela natureza, não gostavam que ninguém caçasse ou pescasse já naquela época, que não existia essa maturidade ambiental", recorda Maria Helena Godoy, herdeira de Olavo – falecido em 1996 – e presidente da Associação dos Amigos da Mata dos Godoy.

Em 1989, a mata preservada por Godoy tornou-se Unidade de Conservação Integral e foi transformada em Parque Estadual. Além da biodiversidade, o aeroporto de cargas do Arco Norte ameaça a história da família, já que as pistas para aviões devem passar dentro da fazenda onde ela Maria Helena nasceu. "Eles dizem que não há projetos, não nos comunicaram de nada. Ouvi falar que construiriam um aeroporto ali, fui atrás de pesquisar, e descobri que passaria na minha propriedade e na de uma vizinha."

Ela teme que o empreendimento afete de forma negativa até mesmo a vida dos moradores da cidade. "Teriam que criar rodovias, atravessar o parque, acabaria com tudo. A mata atua no nosso clima, regula a temperatura, purifica o ar, age de forma generosa na nossa qualidade de vida. Seria um retrocesso para Londrina", afirma.

Atendendo à recomendação do Ministério Público, em março, o prefeito de Londrina, Alexandre Kireeff (PSD), revogou o decreto de utilidade pública da área ao lado da Mata dos Godoy, destinada ao aeroporto de cargas do Arco Norte. Na ocasião, porém, Kireeff admitiu que a revogação não é garantia de que a obra não seja executada no local. "Ainda corremos o risco, porque a Acil está engajada em arrumar patrocinadores para o aeroporto", lamenta Maria Helena. "Se formos pensar, qual o benefício imediato disso? O que temos para exportar em aviões? Eles acham que é um chamariz para a indústria, mas existem várias outras opções."

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