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Polêmica

Volta da Estrada do Colono implica em múltiplas ameaças ambientais

Marcas da existência da estrada resistem apenas nas bordas do parque. Via, que nunca foi oficial, foi fechada em 2001 | Christian Rizzi/Gazeta do Povo
Marcas da existência da estrada resistem apenas nas bordas do parque. Via, que nunca foi oficial, foi fechada em 2001 (Foto: Christian Rizzi/Gazeta do Povo)

Passada uma década do fechamento da Estrada do Colono, no Parque Nacional do Iguaçu, a mata já retomou seu lugar. Árvores com até dez metros de altura ocupam hoje o que chegou a ser terra amassada por pneus. À exceção das marcas que ficaram nas duas extremidades dos 17 quilômetros em meio à floresta localizada no Sudoeste do Paraná, quase nada lembra que por ali havia uma passagem. É o que contam funcionários do parque e pesquisadores, preocupados com o impacto que a movimentação de pessoas e veículos poderia representar ao mais significativo remanescente de Mata Atlântica no Sul do Brasil. A possibilidade de reabrir a estrada está sendo discutida no Congresso Nacional.

Apolônio Rodrigues, vice-diretor do parque, reforça que não se trata de simplesmente voltar a usar um espaço já preparado para o trânsito. Seria necessário derrubar cerca de 170 mil metros quadrados de mata e fazer obras, como pontes. Depois do impacto de implantação viriam os danos decorrentes do uso. Rodrigues trabalha na unidade há 22 anos e assistiu de perto o que acontecia quando a passagem estava aberta. Caçadores, contrabandistas, traficantes, ladrões de carro e palmiteiros eram presença frequente. A passagem de veículos afastaria animais das proximidades da estrada, levando junto os predadores naturais, e assim romperia-se o equilíbrio ecológico do lugar.

"Eles iriam chegar mais perto de propriedades particulares, matando animais domésticos, e acabariam mortos", comenta Rodrigues. Atropelamentos de animais também podem aumentar. Uma estrada ainda traz mais riscos de infestação de plantas invasoras e de doenças para animais silvestres.

Pesquisadores alertam sobre pressão humana

A pesquisadora francesa Anne-Sophie Bertrand monitora a presença de mamíferos no Parque Nacional do Iguaçu desde 2006. A atenção se concentra em grandes felinos, que precisam de espaço para se desenvolver e caçar. Nas 68 mil fotos que coleciona, três vezes aparecem pumas. As câmeras instaladas na mata não flagraram nenhuma onça pintada. O monitoramento mostrou o ser humano como o "animal" que deixou mais marcas no parque (294 registros contra 158 do segundo animal mais abundante, o veado-mateiro). A pesquisadora argumenta que, se com a estrada fechada a presença humana já é forte, a abertura ampliaria o impacto no parque.

"A abertura da Estrada do Colono seria a última facada para a frágil vida encontrada no parque", lamenta. Anne-Sophie conta que frequentemente se depara com jiraus, cevas e saleiros ativos, estruturas deixadas na mata por caçadores e palmiteiros, além de várias picadas abertas e ativas. Para ela, o conceito científico de "floresta vazia", quase sem animais, está rondando o Parque Nacional do Iguaçu. "Desse jeito, meus filhos não vão ver onça pintada no parque", diz.

O professor Arnaldo Ricobom fez a pesquisa de mestrado no início dos anos 2000, com a Estrada do Colono ainda aberta. Ele, que trabalha no curso de Geografia da Universidade Federal do Paraná, avaliou aspectos de degradação ambiental no Parque Nacional do Iguaçu. A abertura da estrada representa, na avaliação de Ricobom, a exposição a problemas, como facilidade de acesso para infratores, circulação de animais carregados pelos veículos que levariam doenças às espécies nativas, poluição, animais atropelados e a infestação de plantas oportunistas.

Andamento

Um projeto de lei para tentar legalizar a abertura da Estrada do Colono está em análise na Câmara Federal. O projeto foi aprovado por uma comissão especial, formada por um número reduzido de parlamentares. Uma intervenção da deputada federal Rosane Ferreira (PV-PR), que reuniu assinatura de 85 deputados, exige que o projeto só siga adiante se passar pelo plenário, com aprovação da maioria dos 513 parlamentares.

Estrada-parque

O projeto de lei cria uma nova modalidade e altera a lei de unidades de conservação. Contudo, ambientalistas questionam o uso do termo estrada-parque para definir o que está sendo proposto. O modelo prevê a recuperação de áreas degradadas e não a intervenção em unidades protegidas – a transformação de estradas em parques e não de parques em estradas. Também só seria possível se a estrada tivesse uma beleza cênica excepcional, o que não é o caso.

Mobilização

O Parque Nacional do Iguaçu corre o risco de perder o título de Patrimônio da Humanidade. No início dos anos 2000, quando a questão da estrada estava novamente sendo discutida, a Unesco classificou a unidade como sítio ameaçado. Representantes de várias entidades ambientais se reuniram para evitar a reabertura da estrada. O Ministério do Meio Ambiente deve ser pressionado a se posicionar contra a intervenção.

Histórico

A Estrada do Colono nunca foi oficialmente aberta. Havia uma ligação de terra entre as cidades de Serranópolis do Iguaçu e Capanema, que o governo pensou até em asfaltar, na década de 80. Começou uma batalha judicial, com uma série de decisões favoráveis e contrárias à estrada. Em 2001, a passagem foi fechada pela Polícia Federal. Em 2003, acabou reaberta por moradores, mas novamente interrompida após alguns dias.

PosiçãoGoverno do estado diz que prefere aguardar desenrolar da discussão

O governador Beto Richa ainda não tem uma posição a respeito do assunto e prefere aguardar o desenrolar da discussão na Câmara Federal. Encaminhada por sua assessoria, a resposta do governo foi a seguinte. "É uma decisão que demanda muita responsabilidade, se preocupando com a questão ambiental e dos cidadãos do entorno". Já o secretário estadual de Meio Ambiente, Luiz Eduardo Cheida, se manifestou contrário à reabertura. "Ao abrir a estrada, estamos criando mais uma demanda para o precário sistema de gestão das unidades de conservação", afirmou.

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