Há 70 anos o Brasil se preparava para entrar na 2.ª Guerra Mundial. Vinte e cinco mil homens da Força Expedicionária Brasileira (FEB) foram convocados a enfrentar o exército alemão na Itália. Apesar do improviso e da falta de estrutura bélica, os brasileiros venceram oito batalhas. Após oito meses de luta, os febianos retornaram ao Brasil com poucas perspectivas: foram pressionados pelo Exército a não falar sobre a guerra. A maioria deixou a carreira militar.
A 2.ª Guerra se estendeu de setembro de 1939 a agosto de 1945. O torpedeamento de navios brasileiros, a partir de 1941, fez a população ir às ruas no Rio de Janeiro para pedir um posicionamento do presidente Getúlio Vargas. Ele declarou guerra em agosto de 1942, porém, a partida do primeiro navio de brasileiros para a Itália se deu em 2 de julho de 1944. A demora é representada no símbolo da FEB uma cobra fumando. Na época, se dizia que era mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil entrar no conflito.
A campanha brasileira começou em setembro de 1944 e encerrou em maio de 1945, quando a Alemanha se rendeu. Nas batalhas, os febianos capturaram cerca de 14 mil soldados inimigos, armamentos e perto de 4 mil cavalos, que foram úteis para o transporte durante o conflito, lembra Marco Stancik, professor de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Foram 239 dias de combate. Dos 25 mil brasileiros, 443 morreram e cerca de 3 mil se feriram. O Paraná contribuiu com 1.542 combatentes, dos quais 28 morreram.
A participação da FEB na guerra, no entanto, é um assunto pouco familiar ao brasileiro. "Foi uma guerra que não aconteceu aqui. Além disso, os pracinhas se fecharam em associações. Não houve participação civil", lembra a doutora em História Cultural e presidente da seção regional da Associação Nacional dos Veteranos da FEB em Curitiba, Carmen Rigoni. Hoje, há 44 regionais da Associação Nacional dos Veteranos. O número de pracinhas vivos, no entanto, é desconhecido. No Paraná, a maior parte do acervo desse período está no Museu do Expedicionário, em Curitiba.
Impacto
Para os brasileiros dos anos 40 e 50, sobrou o efeito negativo na economia. Dennison de Oliveira, professor de História da Universidade Federal do Paraná, reforça que a crise econômica na ditadura varguista se agravou. "A dívida acumulada com o financiamento da guerra só foi finalmente paga em 1957." Para muitos ex-combatentes, o reconhecimento só veio em forma de lei em 1990, com a aposentadoria especial dos pracinhas.
Uma ficha limpa e vitoriosa no Exército
Odorico Dias de Góes, morador de Ponta Grossa, entrou no Exército por acaso. Estava insatisfeito com o trabalho numa serraria quando ouviu um anúncio no rádio que convocava jovens para o antigo 13.º Regimento de Infantaria (RI). Na serraria, recebia o ordenado de 3 mil réis e como soldado ganharia 19 mil.
Largou o que estava fazendo e arriscou ser soldado. Gostou. Ficou 31 anos no Exército. "Nunca recebi uma punição", diz o major, que coleciona medalhas e diplomas. O expedicionário desafia a idade 93 anos e detalha sua participação na 2.ª Guerra Mundial.
"Saí do 13.º RI com um contingente de 334 homens, entre soldados, cabos, sargentos e oficiais." Ele não imaginava encontrar um cenário tão devastador na Itália. "Nápoles foi destruída pelos alemães. Tinha gente morrendo de fome. Nós tínhamos bolacha e jogávamos para eles. A bolacha caía no barro, eles pegavam e engoliam do jeito que estava", afirma.
Em solo italiano, a ordem era de alerta. Odorico conta que não podia tomar água de nenhum riacho, porque poderia estar envenenada. "Ficávamos num buraco redondo, agachados o dia inteiro, não podia tirar a cabeça para fora porque o [soldado] alemão tinha uma metralhadora muito potente que dava 1,2 mil tiros por minuto", conta.
Lembranças
As duas cenas mais marcantes no front foram a rendição de um pelotão alemão frente ao comando brasileiro e o anúncio do final da guerra. "Os brasileiros jogavam seus capacetes para cima. Foi a maior festa. Estava todo mundo com saudade da família", diz.
Antes de voltar para o Brasil, Odorico foi escolhido entre os pracinhas para viajar a Lisboa. "Portugal queria prestar uma homenagem para a tropa. Ficamos dois dias em Lisboa. Anunciaram nossa chegada em um alto-falante. Tinha gente trepando em árvore para nos ver. A gente ia passando e as pessoas jogavam pétalas de rosas para nós", relata.
A melhor recepção, no entanto, foi na estação de Ponta Grossa. A esposa Anita tinha pedido para a banda do Exército tocar na chegada do ex-combatente. Ele não a via desde o casamento, ocorrido 28 dias antes da partida para a guerra.