A Delegacia do Consumidor (Delcon) de Curitiba instaurou inquérito para apurar o caso em que um policial civil de 33 anos foi atingido por um tiro disparado acidentalmente por uma pistola que caiu no chão. Segundo a polícia, a arma – uma Taurus 638, calibre .380 – estava com trava de segurança acionada, o que deveria ter impossibilitado o disparo. A principal hipótese da investigação é de que o tiro tenha ocorrido por uma falha do armamento. Na semana passada, uma audiência promovida pela Câmara dos Deputados abordou denúncias sobre defeitos em armas da Taurus, relatadas por policiais de vários estados.
A vítima do caso ocorrido em Curitiba foi o policial civil Daniel Luiz Godoy Dalacqua. Na sexta-feira (29), ele estava em uma reunião familiar na casa do pai. Dalacqua e a mulher – que é delegada – deixaram suas respectivas armas, travadas, sobre a geladeira, para mantê-las longe do alcance de crianças. Pouco depois, quando o policial foi abrir o eletrodoméstico para guardar uma garrafa de água, a pistola caiu e, ao atingir ao chão, disparou. O projétil desviou na geladeira e se alojou na mão direita do agente.
“Eu estava com a mão na altura do rosto. [O tiro] poderia ter acertado meu pescoço ou alguma outra parte vital do meu corpo. Foi algo grave, mas por sorte não foi ainda pior”, disse o policial.
No dia seguinte, Dalacqua passou por cirurgia para remover o projétil. Os médicos tiveram que reconstituir nervos de dois dedos das mãos do paciente, que ficará afastado do trabalho por pelo menos 60 dias. Hoje, ele está com a mão imobilizada e tomando medicamentos para amenizar a dor. “A minha vida não vai ser a mesma. Como você vai trabalhar, com uma arma que pode disparar a qualquer momento? Que segurança você tem pra fazer uma abordagem ou pra participar de uma operação?”, apontou.
A pistola e o projétil foram apreendidos pela Delcon e serão encaminhados a uma perícia, a ser realizada pelo Instituto de Criminalística (IC). Segundo o delegado Guilherme Rangel, o objetivo da investigação é elucidar o grau de responsabilidade da fabricante no caso. A empresa pode responder por crime contra o consumidor e por lesão corporal grave.
“Ao que tudo indica, a empresa induziu o consumidor ao erro, ao vender um produto que não tem a qualidade que se espera e, mais que isso, que afeta a segurança do consumidor e de outros”, apontou o delegado. “A arma não poderia ter disparado com a trava acionada. É um mecanismo de segurança fundamental”, completou.
Reclamações recorrentes
A Taurus é a principal fabricantes de armas do Brasil e uma das maiores fornecedoras de armamentos a forças policiais do país. O caso recente registrado em Curitiba está longe de ser um incidente isolado. No ano passado, a Gazeta do Povo mostrou uma série de falhas operacionais registradas por policiais civis e militares do Paraná, que usavam a pistola Taurus PT 840. Os relatos apontavam defeitos como “tiro em rajada” (em que a arma dispara várias vezes quando o gatilho é acionado); “chaminé” (quando o projétil encavala, obstruindo a arma) e disparos acidentais como o que vitimou Dalacqua. Na ocasião, as falhas levaram a Taurus a fazer um recall em 1,2 mil pistolas vendidas à Polícia Civil.
Na mesma época, circulavam por grupos de WhatsApp de policiais militares do Paraná vídeos em que as pistolas da Taurus falhavam. Mas as reclamações atingem muitos outros estados. Uma página na internet – a “Vítimas da Taurus” – compila vídeos e casos em que armamentos da fabricante falharam em uso.
Na última quarta-feira (3), a comissão de segurança pública e combate ao crime organizado da Câmara dos Deputados promoveu uma audiência pública, em que foram discutidos casos denunciados de falhas em pistolas fabricadas pela Taurus e fornecidas a policiais de vários estados.