Após mais de cem dias de interinidade, Michel Temer (PMDB) agora põe à prova uma percepção dele sobre ele mesmo, que tornou-se pública a partir de uma emblemática frase, em agosto de 2015, em meio ao agravamento das crises política e econômica. “É preciso que alguém tenha capacidade de reunificar a todos.” Foi a senha para Temer abandonar gradativamente sua habitual discrição e passar a trabalhar abertamente pelo afastamento de Dilma Rousseff (PT).
Foi o início do fim de uma aliança jamais bem resolvida. Uma relação que, no governo Lula, tinha jeito de namoro. E que virou casamento, quando PT e PMDB disputaram, em chapa única, a Presidência e a vice, em 2010, com Dilma e Temer. Dobradinha repetida, em 2014. Casamento desfeito, em 2015.
É preciso que alguém tenha capacidade de reunificar a todos.
Os movimentos que levaram ao “divórcio” e à acusação de traição por Dilma, no entanto, já se acumulavam, antes mesmo da mudança de tom do sempre discreto vice. À época, no começo de 2015, a Operação Lava Jato aproximava-se do governo, a economia desacelerava em ritmo frenético, a popularidade da petista despencava. Enquanto o governo rumava para o colapso, Temer já consultava seus advogados e assessores políticos para encontrar saídas que lhe possibilitassem sobreviver ao eventual ocaso de sua companheira de chapa.
Para o vice, mais que evitar ser tragado politicamente pela tempestade que começava a envolver o governo Dilma, havia o vislumbre de uma porta que daria acesso indireto ao poder.
Ressentimento
Como vice, uma das maiores frustrações de Temer, casado com Marcella, de 32 anos, e pai de cinco filhos, foi não ter conseguido encontrar com seu análogo americano, Joe Biden. Foi excluído da reunião que Dilma teve com ele. Foi convidado para um encontro em Washington (EUA), mas teve que cancelar porque a data coincidiu com a convenção do PMDB que marcou a saída da sigla do governo.
Agora, seus amigos brincam que talvez o único encontro de Temer com Biden será como presidente brasileiro, a exemplo do que Dilma fez quando tomou posse. A vingança, dizem aliados de Temer, é um prato que se come frio.