À espera de "ok" do Incra, acampamento completa 10 anos
Entre as 5 mil famílias acampadas no Paraná está a da campesina Genessilda Lourenço Gotardo, que vive no acampamento Emiliano Zapata, em Ponta Grossa. Ela tem 61 anos e chegou a área há 10 anos. Somente de sete anos para cá conseguiu produzir hortaliças e vendê-las a entidades através do Programa de Aquisição de Alimentos do governo federal. Com a transformação do local em assentamento, previsto para acontecer ainda neste ano, ela pretende acessar outras iniciativas oficiais, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar.
Em sua horta no lote de oito hectares de terra, Genessilda produz 32 tipos de hortaliças e chás. Tem uma vaca que dá leite para a família e comprou mais três bezerras. Devido à falta de regulamentação do acampamento, a luz elétrica foi instalada há dois meses no local, por força de um acordo entre o Incra e a Copel. "Agora posso ter uma geladeira para guardar minha erva para o chimarrão. Assim dura mais", comenta. Com a luz, a ideia é comprar maquinário para iniciar a ordenha mecânica do gado e incluir o leite nos itens que são vendidos pela família.
O acampamento completou 10 anos em agosto. Há casas de alvenaria ao lado de residências de madeira espalhadas pela antiga fazenda. A demora para transformá-lo em assentamento, segundo o Incra, se deve à regularização na documentação. A fazenda de 630 hectares pertencia à Embrapa e tinha algumas áreas de litígio. O Incra pagou R$ 6 milhões e, atualmente, segundo o superintendente do Incra no Paraná, Nilton Bezerra Guedes, o processo está em fase de registro em cartório. Até o final do ano, a expectativa do Incra é que a área vire assentamento. Hoje há 48 famílias no local, do total de 100 que ocuparam a fazenda em 2003.
Assentadas
Ano passado, 23.075 famílias foram assentadas no Brasil, das quais 60 do Paraná. Nos últimos cinco anos, 210.230 famílias passaram a viver em assentamentos, sendo 1.027 do Paraná. O déficit, no entanto, persiste. A estimativa do Incra é de que existam 156 mil famílias em acampamentos no Brasil, das quais 5 mil estão no Paraná. Segundo Nilton Bezerra Guedes, do Incra, a existência de acampamentos não reflete em conflitos no campo no Paraná. "Não temos histórico de conflitos, existe uma mediação muito forte e um bom entendimento por parte dos movimentos sociais", considera.
Desapropriar terras parece ser coisa do passado. A reforma agrária praticada nos últimos cinco anos se baseou, principalmente, na compra de terras pelo governo federal. Para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), há cada vez menos terras improdutivas para serem desapropriadas, enquanto os movimentos sociais consideram que a queda é um reflexo do modelo político que incentiva o agronegócio.
INFOGRÁFICO: Confira o número de famílias acampadas no Brasil nos últimos cinco anos
Em 2008 foram feitas 243 desapropriações no Brasil. Em 2012, apenas 28. O último decreto de desapropriação que se tem registro no Paraná é de 2008. Apesar de as desapropriações estarem zeradas desde então, os trabalhadores rurais continuam sendo assentados. Entre 2010 e 2012, o Paraná assentou 861 famílias em 13.249 hectares de terras compradas pelo Incra. No Brasil, apesar de as desapropriações terem se mantido em ritmo reduzido, foram assentadas 210,2 mil famílias de 2008 para cá.
Para o superintendente do Incra no Paraná, Nilton Bezerra Guedes, entre as causas da queda nas desapropriações está o aumento de terras produtivas no Paraná e o maior rigor do Incra na classificação das terras para assentamentos. "Não podemos destinar para reforma agrária uma terra que não tem aptidão agrícola. Antes era comum pegar uma área e transformá-la em assentamento", afirma.
A valorização do preço da terra no Paraná é um indício da ausência de terras improdutivas. De 2003 para 2013, o valor do hectare em Cascavel subiu de R$ 11,5 mil para R$ 28,9 mil; em Londrina, a alta foi de R$ 8,2 mil para R$ 15,2 mil e a de Ponta Grossa passou de R$ 3,9 mil para R$ 15 mil o hectare, conforme dados da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento.
Segundo Guedes, a tendência do aumento da modalidade de compra é nacional. Ele cita que a região Nordeste tem mais terras consideradas improdutivas e, portanto, ainda ocorrem desapropriações, mas a prática vem sendo substituída pela compra de terras.
Prioridade
Para um dos líderes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) em Ponta Grossa, Célio Rodrigues, houve desaceleração na política da reforma agrária. "O governo preferiu apoiar o agronegócio. As consequências são o problema de sucessão no campo, a evasão dos jovens e o desabastecimento de coisas que são da agricultura familiar que não estão recebendo investimento e começam a faltar no Brasil", considera.
O padre Dirceu Luiz Fumagalli, da Comissão Pastoral da Terra, lembra que há oferta de terras, mas a prioridade é para o agronegócio. "Na planície se planta soja e nos morros se planta o eucalipto. O campo é um espaço de exploração para gerar lucros" analisa.
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