Em 1924, moradores da Colônia Faria, em Colombo, na região metropolitana de Curitiba, começaram a construção da igreja que é o coração da comunidade. Em consagração à padroeira Nossa Senhora da Saúde, ergueram o santuário. O campanário veio dez anos depois. As construções só reforçaram o vínculo que aqueles imigrantes italianos, sobretudo , construíram com a terra aonde chegaram ainda nos idos de 1886 e tomaram por lar. Agora, os descendentes desses pioneiros e moradores, que se agregaram a comunidade, lutam para manter o patrimônio vivo por mais tempo.
Isso porque os impactos provocados pela chegada do trânsito de caminhões pesados já afetaram a estrutura da igreja. No altar, um pano azul esconde o presbitério, que passa por reformas devido às grandes rachaduras provocadas pelo tráfego. Para tentar amenizar o problema, uma lombada, que ficava na frente da igreja, foi retirada. Outras duas, antes e depois da construção, ainda causam vibrações que afetam a estrutura da quase centenária igreja.
O urbanista André Fort, que mora na colônia há 15 anos, atenta para o fato de que se essa construção já sofre com o trânsito de caminhões, que usam a Avenida Presidente Faria para encurtar caminho até fábricas instaladas na região, a situação tende a piorar se o projeto de construção do Contorno Norte seguir adiante. Da maneira como foi proposto, o contorno dividiria a comunidade e poderia condenar a igreja. "Não dá para passar uma rodovia federal no meio de uma cidade", diz Fort.
Assim como os pesquisadores da Embrapa, que teria pesquisas de décadas afetadas pelo contorno, a reclamação dos moradores não é pela obra, mas sim em relação a falta de diálogo com a comunidade e a ausência de opções de traçado. "Não houve audiências públicas para tomada de decisão sobre os traçados, não foi levada em conta a opinião da comunidade", diz Fort.
Critério econômico
Outro morador da região, o arquiteto e urbanista Pedro Paulo Feijó, tinha 27 anos quando se mudou para a colônia. Trinta e cinco anos depois, ele reconhece que muita coisa mudou: Curitiba cresceu e a própria região se desenvolveu e urbanizou. No entanto, a opção pelo traçado mais curto parece obedecer apenas um critério econômico, já que ambiental e socialmente haverá muito que perder. "O fator econômico não pode se sobrepor ao humano. Se a gente quer mudar as cidades, precisamos mudar esse paradigma", reflete.
Enquanto não há decisão sobre essa situação, os moradores protestam como podem. Por ora, estão espalhadas pequenas placas pela comunidade: "não", escrito em caixa alta e com tinta vermelha.
Medições são feitas à revelia dos moradores
Algumas marcações geodésicas piquetes que indicam por onde deve passar a estrada já foram feitas na região, apesar de muitos moradores não autorizarem a entrada da equipe de topografia em suas propriedades. Isso aconteceu com a família da professora Sibeli Colere. Seus bisavós foram um dos primeiros moradores da Colônia e, desde então, a família continua na região. Há cerca de um mês, ela negou a entrada de uma equipe, que tentou voltar na casa dela mais tarde. Não conseguiu.
Curioso foi o que aconteceu com o veterinário Antonio Henrique Strapasson, nascido e criado na comunidade. Proprietário de uma caminhonete rural, ele foi procurado para ajudar a desatolar um carro que ficou preso em uma estradinha da região. A surpresa foi descobrir que o carro era dessa equipe e a estradinha ficava dentro das terras da família.
No total, essas equipes de engenheiros e topógrafos entraram em três propriedades. Como reação, a associação de moradores entrou com uma ação na Justiça por causa da invasão. Nenhum morador autorizou a entrada das equipes.