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Monocondução de trens da ALL causa polêmica

Trabalho de retirada da locomotiva que tombou próximo ao centro de Almirante Tamandaré, em 2006 | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
Trabalho de retirada da locomotiva que tombou próximo ao centro de Almirante Tamandaré, em 2006 (Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo)

O Sindicato dos Maquinistas e Ferroviários do Paraná e de Santa Catarina (Sindimafer) pretende entrar na Justiça para tentar impedir que trens sejam conduzidos apenas por uma pessoa no Paraná. A prática conhecida como monocondução foi implantada pela empresa América Latina Logística (ALL), concessionária que administra a malha ferroviária Sul desde 1997. Antes disso, a extinta Rede Ferroviária Federal (RFFSA) mantinha o maquinista e um auxiliar nos trens. Na avaliação do sindicato e de engenheiros especializados em transporte ferroviário, a monocondução gera riscos e eleva a probabilidade de acidentes, pois apenas o maquinista não teria condições de cuidar de toda a composição. A ALL argumenta que o investimento em tecnologia feito ao longo de dez anos dispensa a presença do auxiliar.

O assunto é polêmico e já gerou ações em outros estados. Em Minas Gerais, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região já emitiu parecer contrário à moncondução, mas a principal motivação do Sindimafer é uma liminar concedida pela Justiça do Trabalho de Bauru (SP), que proibiu a prática na área de abrangência da Novoeste – outro trecho concedido à ALL e que inclui regiões dos estados de São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A ação foi ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, depois de ação civil pública protocolada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias de Bauru, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. A Novoeste/ALL ainda não havia implantado a monocondução e agora aguarda o julgamento do mérito da ação. Em agosto, o Tribunal Superior do Trabalho rejeitou um mandado de segurança impetrado pela empresa com o objetivo de derrubar a liminar.

No Paraná, a movimentação contra a monocondução começou oficialmente em 2001, quando o Sindimafer denunciou a prática ao Ministério Público do Trabalho (MPT). Um inquérito apura se o uso de apenas um maquinista oferece risco nas ferrovias que cortam o estado. O procurador do MPT da 9ª Região, Gláucio Araújo de Oliveira, solicitou dois laudos, encaminhados pelo Sindicato dos Engenheiros do Paraná (Senge-PR) e pela própria ALL, antes de decidir se entra ou não com uma ação. "Já fiz um levantamento de campo e conheço a situação real, fiz visitas à ALL e sei da condição dos equipamentos. Estou para analisar dois laudos técnicos, feitos por ambos os lados", afirma o procurador, que chegou a percorrer trechos em trens da ALL para observar as condições de trabalho.

O laudo do Senge-PR, assinado por um perito judicial, é categórico ao reprovar a monocondução e enumera as principais dúvidas em relação à prática. O documento sugere que há "áreas de sombra" no sistema de comunicação (em serras ou viadutos), que o maquinista só enxerga um dos lados da composição e que para apenas um profissional "fica impossível a realização dos trabalhos externos, e existem alguns aspectos externos na condução de uma composição que devem ser resolvidos, tendo a necessidade de intervenção humana direta". São também enumerados acidentes, como o choque entre trens ocorrido em Ponta Grossa no ano passado e o caso de uma "locomotiva fantasma" que teria percorrido cerca 150 quilômetros sem intervenção no interior da Argentina.

Os acidentes seriam a prova de que há falhas na "cerca eletrônica" da ALL – um sistema que permitiria parar qualquer trem, em 21 mil quilômetros de malha no Brasil e na Argentina, diretamente do Centro de Controle Operacional da empresa, localizado no bairro Vila Oficinas, em Curitiba. "Esses trechos (sem contato) são muito curtos", diz o gerente do Centro, René Silva, em meio a computadores e painéis nos três ambientes que compõem o cérebro da ALL (veja ao lado). Ele também contesta a afirmação de que seria necessário um auxiliar para identificar e solucionar problemas na composição. Imprevistos como descarrilamentos, segundo a ALL, são identificados por 1.870 detectores espalhados ao longo da malha. "Ao longo da via há equipes para socorrer os trens. Em uma situação emergencial, não vejo como outra pessoa poderia ajudar o maquinista", comenta Silva.

Com a experiência de 26 anos na RFFSA, o engenheiro e consultor Saulo de Tarso Pereira é um crítico da monocondução. "Há um excesso de confiança nos equipamentos eletrônicos. Às vezes os maquinistas se excedem confiando no que foi dito. Eles se tornam escravos do instrumento", afirma. "O auxiliar é quem vê qualquer anormalidade. É essencial à segurança do trem, é um custo muito pequeno em termos de operação ferroviária." Pereira também questiona a eficácia da cerca eletrônica – para ele, o sistema adotado pela ALL para que trens sigam em direções opostas em uma única via é errado. "Parar um trem exige de 400 a 800 metros, dependendo do comprimento e da velocidade. O centro de controle pode até identificar um trem em sentido contrário, mas não dá tempo de parar." Para Pereira, o acidente na Ponte São João, em julho de 2004 (maior acidente ferroviário na história do Paraná) seria uma prova de que o sistema de cobertura não funciona a contento.

Também com experiência na extinta Rede Ferroviária, o hoje gerente de Engenharia de Operações de Trens da ALL, Luiz Carlos Hohmann, acha que o auxiliar pode até ser prejudicial na nova realidade do transporte ferroviário, em que luzes e computadores substituíram agitadores de bandeiras nos pontos de intersecção. Para ele, a culpa não está no sistema – e as falhas humanas devem ser levadas em conta.

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