Dormir sem saber se na manhã seguinte um oficial de Justiça baterá na sua porta, acompanhado de policiais federais, para despejá-lo. Essa sensação foi descrita por um morador da Vila Domitila, localidade entre o Ahú e o Cabral, em uma área considerada região nobre em Curitiba, que congrega alguns lotes que, juntos, somam 191 mil metros quadrados. Todo santo dia o motorista Oscar Ribeiro de Castro, 57 anos, pensa em ser obrigado a deixar sua casa, onde mora desde 1998. O terreno onde construiu sua vida é foco da disputa histórica, que está próxima do fim.
De acordo com o juiz da 2.ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, Claudio Roberto da Silva, já não há mais dúvida sobre a propriedade da localidade. O magistrado afirmou que é do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). “Está superado. Não há mais essa discussão quanto à propriedade da Vila Domitila. Não é mais matéria que vá voltar para Justiça”, afirmou o magistrado.
Apesar disso, os moradores seguem lutando para tentar ficar na área, onde construíram suas vidas. “É muito complicado viver assim sem saber se o oficial de Justiça vai chegar. Não dá nem pra investir na propriedade, ir arrumando a casa”, comentou. Ele mora com a esposa e mais um filho. Comprou o terreno em 1994.
Na chamada Vila Domitila – nome em homenagem a mulher do ex-proprietário da área Caetano Munhoz da Rocha -, são 250 famílias moradoras (cerca de 30 já foram despejadas por determinação da Justiça), como a do Oscar, que passaram décadas em guerra contra o INSS. “Estamos gritando socorro”, afirmou. Muitos compraram a área de terceiros, outros herdaram.
Perícia
Para os moradores da Vila Domitila, as ações reivindicatórias do INSS não levaram em conta uma primeira perícia geográfica determinada pela própria Justiça, em que teria sido comprovada há alguns anos que a área onde eles estão não é a demandada pelo INSS.
De acordo com os moradores, essa perícia foi realizada há vários anos nos processos em que se discutia a posse dos terrenos, em ações de reintegração de posse.
A presidente da Associação de Moradores da Vila Domitila, advogada Shirlei Bonfim, afirmou que a perícia da ação reivindicatória é real, mas não se refere ao local onde os moradores estão e o próprio perito levanta possibilidade de conter vícios. “O documento é válido, mas não é aqui”, afirmou ela.
A advogada Shirlei já foi despejada do local em janeiro de 2002, mas retornou a sua residência ainda naquele mês. “O que a gente discute aqui não é apenas a propriedade, é o lado social. Estamos aqui há 50 anos. A prefeitura cobrou imposto de vários moradores durante muito tempo”, explicou.
Esperança na CPI
Na desesperança de reverter o caso na Justiça, os moradores da Vila Domitila agora mantêm expectativas sobre o resultado da Comissão Parlamentar de Inquérito, aberta na Câmara de Vereadores, presidida pela vereadora Julieta Reis e com relatoria do vereador Edson do Parolin. “Queremos agora que os peritos fiquem frente a frente na CPI para explicarem. É possível que precisemos de mais perícia”, disse Shirlei.
Na última quarta-feira (15), na Comissão, os vereadores questionaram a prefeitura, provocados pelos moradores, onde estaria a planta da Vila Domitila de 1927. A presidente da CPI, vereadora Julieta Reis (DEM), pediu ao município um levantamento histórico dos documentos que definem a área.
Estevão pagou IPTU por mais de 20 anos
Estevão Pereira, morador da Vila Domitila
O bacharel em Direito e quase Geógrafo, Estevão Pereira, 64 anos, pagou por mais de 20 anos o IPTU para Prefeitura de Curitiba. Ele se formou em Direito em 2012 e abandonou a faculdade de geografia no quarto ano em 2000. As graduações foram iniciadas apenas com o objetivo de entender aquilo que mais o incomodava na vida: a discussão sobre a propriedade do terreno que entendia ser dele.
“Estou aqui há 41 anos, mulher, três filhos. O que vivemos aqui nesta disputa com o INSS é uma situação vergonhosa. Daqui podem me tirar, mas eu não vou sair nunca”, afirmou, ao receber a reportagem.
O vizinho da frente de Estevão foi obrigado a sair. No local, há uma placa, onde o INSS afirma que a área foi alvo de reintegração de posse e faz uma advertência alertando que invasão é crime. Estevão e sua família, ao saírem de casa, lembram todo dia que amanhã podem ser os próximos a ser alvo do despejo. “Paguei por mais de 20 anos. Parei de pagar porque pararam de cobrar. Não tenho para onde ir”, disse.
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