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Sem provas

Moraes e Dino querem 14 anos de prisão a pai da presidente da associação de presos do 8/1

Não há imagens das câmeras, amostras de perfil genético ou digitais que incriminem o idoso Miguel Fernando Ritter, de 61 anos, mas Moraes afirma que ele é culpado. Gabriela Ritter chama o caso de “perseguição” (Foto: Reprodução/Redes sociais)

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O laudo da Polícia Federal (PF) a respeito do idoso Miguel Fernando Ritter, de 61 anos, informa que não há nenhuma evidência pericial de que ele tenha cometido crime durante os atos do 8 de janeiro de 2023 — como imagens das câmeras de videomonitoramento, amostras de perfil genético ou digitais encontradas nos prédios dos poderes da República. No entanto, o ministro Alexandre de Moraes votou pela condenação dele a 14 anos de prisão.

O julgamento virtual iniciou na última sexta-feira (22) e, até essa quarta-feira (27), o voto do relator havia sido acompanhado pelos ministros Flávio Dino e Carmen Lúcia, que decidiram pela mesma pena. Os outros oito ministros têm até 3 de abril para se manifestar.

Segundo o laudo da PF, que a Gazeta do Povo teve acesso, o único dado referente ao idoso é de que seu nome consta na lista de passageiros de um dos ônibus que viajou de Santa Rosa, no Rio Grande do Sul, para Brasília, no dia 6 de janeiro de 2023, a fim de participar das manifestações.

“Isso coloca meu pai no mesmo patamar dos presos do 8/1 que receberam pena de três anos por não existir nenhuma prova contra eles”, afirma a advogada Gabriella Ritter, que é presidente da Associação dos Familiares e Vítimas do 8 de janeiro (Asfav) e questiona os votos. “Por que querem condenar meu pai a 14 anos de prisão se não há nada que o incrimine?”.

De acordo com ela, as informações citadas no processo são do próprio depoimento do idoso, preso dentro do Palácio do Planalto. “Ele não tinha armas e entrou no prédio para se abrigar [das bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha], então preenchia os requisitos para ser condenado, talvez, a três anos”, afirma, ao caracterizar a pena dada ao pai como “nítida perseguição”.

No depoimento do idoso, que é citado no voto do ministro, Miguel afirma que chegou ao Distrito Federal dia 8 de janeiro de 2023 com planos de retornar à sua cidade em até dois dias. Ele informa que participou das manifestações de forma pacífica e que teria subido a rampa do Planalto para “tentar conversar” com soldados do Exército que estavam no interior do prédio, momento em que teriam começado a estourar as primeiras bombas.

Além disso, ele afirmou que foi a Brasília com o objetivo de “orar pela pátria” e que passou por revista policial para confirmar que não estava armado. “Na mochila do meu pai só tinha água, roupas, um terço e um guarda-chuva”, escreveu a filha em publicação nas redes sociais sobre a possível condenação. “Moraes está sendo um ditador”, completou, ao referir-se ao voto do ministro.

Para condenar Miguel, Moraes cita “crime multitudinário”

Em seu voto, Moraes condena Miguel pelos crimes de associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado por violência e grave ameaça – com emprego de substância inflamável – e deterioração do patrimônio tombado. O argumento é que o idoso teria contribuído para um “crime multitudinário”, em que todos os presentes no local deveriam ser responsabilizados pelos danos.

Na “presença da materialidade de crimes multitudinários, a co-autoria de Miguel Fernando Ritter vem comprovada integralmente pela prova dos autos”, afirma o voto. “Portanto, fica evidenciado que ele estava na capital federal no dia 8/1 para participar de atos golpistas visando a extinção do Estado Democrático de Direito”, continua Moraes.

A defesa, entretanto, garante que Miguel não incitou a multidão e nem apresentou conduta criminosa.“O denunciado, pessoa de nenhuma influência na sociedade, não possuía e ainda não possui a mínima condição de tentar abolir o Estado Democrático de Direito”, argumenta em citação apresentada no voto do ministro.

Ainda segundo a defesa, afirmar que existiu tentativa de golpe devido aos danos causados nos prédios vazios dos Três Poderes “seria o mesmo que considerar que houve tentativa de sequestro em uma residência enquanto o dono do local sequer estava na cidade”, compara. “Ou seja, um crime impossível de ser executado.”

Advogados de réus do 8/1 criticam tese de “crime de multidão”

Outros advogados que defendem presos do 8/1 também já criticaram a existência de crimes multitudinários, pois depoimentos como o do major José Eduardo Natale mostraram que existiam “grupos heterogêneos”, com atitudes diferentes, durante os atos.

Além disso, “a figura do ‘crime multitudinário’ é inconstitucional, uma vez que viola o princípio da presunção de inocência e da individualização da pena”, afirma o advogado Ezequiel Silveira, ao explicar ainda que o fato de alguém estar nas proximidades de um crime não o torna culpado também. “Tal situação é incabível juridicamente, pois não existe adesão ‘geográfica’ à prática criminosa”.

Miguel Ritter também é alvo de outro processo relacionado ao 8/1

Além do julgamento por crimes cometidos nos prédios públicos de Brasília em 8 de janeiro, o pai da advogada Gabriela Ritter é investigado em um segundo inquérito relacionado aos fatos. O gaúcho foi um dos alvos de busca e apreensão efetuadas pela Polícia Federal (PF) dia 8 de janeiro deste ano, na 23ª fase da Operação Lesa Pátria.

Para Gabriela, a revista aos cômodos da casa do pai e o novo interrogatório foram tentativas de “pesca probatória” por não existir nenhuma prova que o incrimine. Inclusive, “a primeira pergunta que fizeram foi se ele tinha opção partidária, algo que é uma livre escolha das pessoas e jamais poderia ser questionado por ser algo de consciência”, aponta, ao denunciar a situação como “violação de direitos humanos e que direciona esse processo como extremamente político”.

A advogada afirma que ainda não teve acesso ao novo inquérito para entender o teor da ação, mas acredita que é mais uma tentativa de intimidar o trabalho daqueles que têm lutado contra as ilegalidades cometidas pelo Judiciário. Mas “eu não vou parar Alexandre. Não vou”, finalizou em manifestação no Instagram.

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