Decretar a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro por uma visita à Embaixada da Hungria seria um excesso, segundo juristas ouvidos pela Gazeta do Povo. Provas de que houve um pedido de asilo político ao país europeu seriam necessárias para que a prisão preventiva fosse decretada. A possibilidade da aplicação da medida foi defendida por governistas depois da divulgação de um vídeo que mostra que Bolsonaro passou dois dias na Embaixada da Hungria. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator da investigação contra Bolsonaro, pediu explicações à defesa do ex-presidente no prazo de 48 horas.
Os advogados de defesa confirmaram a permanência na embaixada, mas afirmaram que foi apenas “para manter contato com autoridades do país amigo”. Bolsonaro é aliado do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán. A Polícia Federal, por outro lado, confirmou que deve abrir uma investigação para apurar a visita. Além disso, o Ministério das Relações Exteriores convocou Miklós Halmai, embaixador da Hungria, para prestar esclarecimentos. Halmai aparece nas imagens acompanhando o ex-presidente.
“Seria muito frágil essa hipótese de prisão preventiva por conta, tão somente, da permanência dele na embaixada. Seria um esforço de interpretação muito grande julgar isso como uma suspeita de fuga. Considero um exagero”, afirmou Adriano Bretas, professor de Direito Processual Penal do programa de pós-graduação da Escola Paranaense de Direito.
Até o momento, não há provas que houve tentativa de asilo político
Neste caso, a prisão preventiva seria, em tese, uma medida cautelar que serviria para garantir que Bolsonaro não fugisse para o exterior, caso fosse condenado. Em fevereiro, Moraes obrigou que o ex-presidente entregasse o passaporte e exigiu que ele permanecesse em território brasileiro. Os advogados do ex-presidente chegaram a pedir ao STF a devolução do documento.
Alexandre Queiroz, advogado criminalista e mestre em Ciência Política, avalia que é preciso ter provas contundentes de uma tentativa de fuga para decretar a prisão preventiva. “Se não ficar comprovado que houve ao menos uma tentativa de asilo político, na minha concepção, não existe nenhuma possibilidade de ser entendido como descumprimento da medida cautelar que impede a saída do país.”
Queiroz explica que, pelo Tratado de Viena, embaixadas não são consideradas territórios estrangeiros. A mesma convenção considera, por outro lado, que o espaço é tido como inviolável e haveria algumas restrições em relação ao cumprimento da jurisdição brasileira. “Pela literalidade da medida, que é proibi-lo de deixar o país, não houve descumprimento, pois ele efetivamente não deixou o Brasil”, complementa.
Juristas divergem se STF deveria investigar a visita
“Penso que essa visita não precisaria necessariamente perpassar por uma explicação. O ex-presidente não tem nenhuma cautelar que o impeça de fazer esse tipo de visita. Seja institucional ou particular, portanto, não há nenhuma necessidade de se justificar diante disso”, aponta Bretas.
Queiroz avalia que Moraes agiu acertadamente ao levantar informações dos advogados de Bolsonaro. “Eu sou, às vezes, crítico a algumas decisões do ministro Alexandre de Moraes, mas neste caso concreto, antes de tomar qualquer medida drástica, o ministro procurou ouvir a defesa”, pondera.
“Não se pode presumir que Bolsonaro tentou evitar a aplicação da legislação criminal brasileira, mas é preciso investigar. Então, a defesa vai apresentar a sua versão. Também já foi determinada a abertura de um procedimento investigativo. Na minha visão, caberia a Moraes também ouvir formalmente a embaixada”, contrapõe Queiroz.
Antes de decretar prisão, Moraes poderia impedir Bolsonaro de visitar embaixadas
“Se alguma medida cautelatória for necessária, a prisão é a última das hipóteses. A mais drástica delas. Caso fosse necessário se resguardar de qualquer necessidade cautelatória no processo, existem medidas menos gravosas do que a prisão”, ressalta Bretas.
“Moraes poderia acrescentar outra medida cautelar para impedir Bolsonaro de frequentar embaixadas”, destaca Queiroz. Segundo o advogado, o Código de Processo Penal permite a proibição de acesso ou frequência a determinados lugares como opção de medida cautelar (art. 319, inc II).
“A aplicação de qualquer outra medida já seria um extremo, já que em momento algum Bolsonaro se esquivou dos chamamentos da justiça. Muito pelo contrário, ele tem um histórico de comparecimento”, reforça Bretas.
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