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O ministro Alexandre de Moraes votou nesta quarta-feira (20) pela condenação do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) a uma pena de 8 anos e 9 meses de prisão, a serem cumpridas inicialmente em regime fechado, multa de R$ 192,5 mil e perda do mandato parlamentar.
Relator do processo, ele defendeu a condenação pelos crimes de coação no curso do processo, que consiste em “usar de violência ou grave ameaça contra alguma autoridade, a fim de favorecer a interesse próprio num processo judicial ou policial”; e também pelo crime de “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”.
Esse último delito substituiu um crime previsto anteriormente na Lei de Segurança Nacional, com redação semelhante, e pelo qual Silveira havia sido denunciado inicialmente. Como a LSN foi revogada, a Procuradoria-Geral da República (PGR) defendeu nesta quarta a substituição do tipo, argumentando que a conduta ainda é criminalizada.
Durante o voto, Moraes destacou algumas falas de Silveira gravadas por ele e que viralizaram nas redes sociais, e depois foram retiradas da internet por decisão do ministro.
Numa delas, citada várias vezes no julgamento, o deputado disse que queria “que o povo entre dentro do STF, agarre o Alexandre de Moraes pelo colarinho dele, sacuda aquela cabeça de ovo dele e jogue dentro de uma lixeira”.
Para Moraes, ao contrário do que alegou a defesa, declarações como essas não seriam “jocosas”, “críticas” ou de “desabafo”, mas seriam criminosas por conterem ameaças.
“A gravidade das intimidações ganhou relevante potencial especialmente pelo alcance de suas palavras, que foram disseminadas em ambiente virtual, amplamente divulgado pela mídia e pelos seus seguidores, tudo a potencializar a concretização das ameaças, inclusive físicas aos ministros. O réu citou de modo expresso a necessidade de modo expresso a necessidade de retorno do AI-5, com a cassação de ministros da Corte, com a provocação de uma ruptura institucional. Essa conduta é gravíssima”, disse.
O julgamento agora segue para a manifestação do voto dos outros 10 ministros. Kassio Nunes Marques, revisor da ação penal, votou pela absolvição do deputado.
O que diz a defesa
Desde fevereiro do ano passado, quando Daniel Silveira foi preso de ofício por Alexandre de Moraes, sem pedido prévio da PGR ou da Polícia Federal, medida apontada como inconstitucional por juristas, a defesa do deputado vem contestando, sem sucesso, junto ao ministro e seus colegas do STF, atos considerados abusivos na condução do caso.
A própria prisão, realizada dentro do controverso inquérito das fake news, foi questionada, pois a Constituição só permite que um parlamentar seja preso em flagrante por crime inafiançável. Moraes justificou a medida com o argumento de que, pelo fato de os vídeos estavam disponíveis por tempo indefinido na internet, havia um estado permanente de flagrante de supostos crimes da Lei de Segurança Nacional. Para ele, seria também um crime inafiançável porque estariam presentes os requisitos para uma prisão preventiva, sem apontar quais.
Silveira ficou preso por quase um mês, até meados de março de 2021, quando a medida foi substituída por prisão domiciliar com monitoramento eletrônico. Em abril, o STF aceitou por unanimidade a denúncia da PGR, e virou réu no caso – um tempo rápido para os padrões da Corte.
Em junho, Moraes determinou nova prisão, alegando que o deputado deixava a tornozeleira sem bateria propositalmente. Ao cumprir o mandado, um policial alegou que viu Silveira tentando pular o muro de sua casa. A defesa diz que o aparelho apresentava frequentes problemas de funcionamento e que, no dia da prisão, ele não tentava fugir, mas socorrer a mãe, que morava numa casa vizinha e estava passando mal.
Só em novembro, ele foi solto novamente, desde que não tivesse contato com outros investigados, não publicasse nada nas redes sociais nem concedesse entrevistas. Em março deste ano, após Silveira ter criticado o STF num evento, Moraes impôs novamente o uso da tornozeleira.
Silveira disse que a medida era ilegal, pois precisaria ser referendada pela Câmara dos Deputados, por interferir em seu mandato. O deputado disse que iria permanecer e dormir na Câmara, recusando-se a instalar o equipamento. Moraes impôs multa de R$ 15 mil por dia e bloqueou suas contas, medida não prevista no Código de Processo Penal, mas que mesmo assim foi referendada por 9 dos 11 ministros – votaram contra apenas Kassio Nunes Marques e André Mendonça.
Foi em meio a essa tensão institucional com a Câmara, que Luiz Fux marcou às pressas o julgamento desta quarta, que não estava na pauta original, definida no final do ano passado.
Ao longo de todo o processo, a defesa denunciou, em vão, o que considera arbitrariedades da condução do processo por parte de Alexandre de Moraes. Vários questionamentos ficaram pendentes de decisão. O advogado de Silveira, Paulo Faria, diz que Moraes deveria se considerar suspeito junto com todos os ministros que referendam suas medidas.
“O congressista não se utilizou de nenhum subterfúgio para se favorecer, apenas se valeu de sua liberdade de expressão, opinião e manifestação, além de estar coberto pelo manto da imunidade parlamentar, material e formal, que o afasta civil e penalmente de imputações, como estas. Coação consiste na ação de coagir, ou seja, forçar alguém a fazer algo contra a sua vontade. Do ponto de vista jurídico, o crime de coação é caracterizado como o ato de agir com pressão ou violência (física ou verbal) perante outra pessoa, com o propósito de obter algo contra a vontade desta. Não se tem notícia de algo tenha sido feito ou modificado a favor do denunciado, pelo contrário, tudo que ocorreu até esta data foi no sentido de prejudica-lo, nenhum a favor”, disse a defesa de Daniel Silveira em sua defesa final no processo.
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