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Trânsito

Motorista vive entre a paixão e o medo do futuro

O empresário Amauri do Vale, 43 anos, troca de carro, em média, três vezes por ano. É um hábito de nada menos do que duas décadas, que não lhe dá lucro nenhum. "Uma vez, ganhei quinhentão numa troca. E só", corrige. Em compensação, a alta rotatividade lhe permite experimentar todas as marcas a que tem direito – do primeiro fusca "milicão" às BMW, 14 ao todo até hoje. Em outros tempos, esbaldou-se de Opalas – 18, contando quatro Caravans. Há dez meses com uma pic-up estradeira, anda preocupado com a demora em fazer a fila andar. "Sim, tenho prazer em dirigir, principalmente em estrada", considera, com o cálculo na ponta do lápis: rodou cerca de 1,3 milhão de quilômetros em 20 anos de carteira, "incluindo os 400 mil quilômetros a bordo da Pluma. Só não somei as caronas."

Mas Amauri não anda lá muito contente. O especialista informal em automóveis tem saudade do tempo em que se dirigia com prazer. "O trânsito ficou violento demais. Os motoristas são desobedientes. Isso é mal", diz o profissional do setor de madeiras de reflorestamento. Ele anda 50 quilômetros por dia para ir ao trabalho, enfrenta rodovias e reafirma sua convicção de que o poder público anda mais lento do que a velocidade com que o trânsito se transforma. "Difícil dar conta."

Sua parte? Nas saídas de lazer com casal de amigos, garante, vão todos para um único carro. Os quatro automóveis da casa são regulados, para poluir menos. E, para o futuro, acredita que o sistema de rodízio seja adotado na capital. "Não tem saída", admite.

No quesito "saída", o estudante de Educação Física Vanderson Carmo da Silva, 24 anos, merece um crédito. Na qualidade de cidadão, mereceria um aparte com o poder público. Há sete anos, usa a bicicleta como meio de transporte. E tudo o que isso implica. De sua casa, no Hauer, até a faculdade, nas Mercês, gasta 25 minutos. De ônibus, levaria 45. Outro percurso é feito do Hauer à Água Verde, onde dá aulas – o que lhe custa mais dez minutos. Ao todo, circula entre 40 e 50 quilômetros por dia em 1h30 de pedalada. A 30/40Km/h – gastando, em média, 550 calorias a hora.

O aprendizado de Vanderson desmonta alguns mitos que trabalham contra a bicicleta. Um deles é de que sempre se chega suado ao trabalho ou à escola. "Não é verdade. Basta procurar caminhos planos, com sombra, e não pedalar além do moderado, o que previne aumento do calor corpóreo." Outra lenda é a da bagagem. O estudante carrega 8,5 kg numa mochila, tudo milimetricamente estudado: trocas de roupa, garrafa de água, toalha, material de higiene, apetrechos para as aulas da noite. "No fundo, há um preconceito com o ciclismo."

E falta de espaços. Vanderson está entre os que reivindicam ciclofaixas na cola das canaletas. Por serem as melhores linhas de acesso, costumam ser invadidas clandestinamente pelos bikers. Com a oficialização dessa convivência, acredita, aumentaria o número de ciclistas. Nos cálculos do Ippuc, apenas 1% da população de Curitiba (18 mil pessoas) usa bicicleta, em geral para passeio nos fins de semana. Os 105 quilômetros de ciclovia servem, em sua maioria, de ligação entre parques, sendo de pouca valia para circuito de trabalho.

Sair de casa com a "magrela" não é mesmo nada animador. Vencidas todas as prevenções, resta a falta de bicicletários, o não-reconhecimento da preferencial para o ciclista, as calçadas nada convidativas. "Não estamos incluídos", brinca o rapaz – que avisa não ter planos de tirar carteira de habilitação. Antes disso, está disposto a repassar todos os macetes para candidatos a bikers. Da curva, a como subir e descer nas calçadas, melhores horários e o que levar na mochila. Afinal... "um milhão de carros, que desastre", espanta-se Vanderson, o ciclista.

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