Não é difícil flagrar carros parados em cima das faixas de pedestres em Curitiba| Foto: Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo

Opinião

"Faixa deveria ser exceção"

Um minuto é o máximo de tempo que os cidadãos ingleses permanecem na beira da calçada antes de ficarem afoitos. A pesquisa, realizada por um instituto de políticas de trânsito da Inglaterra, ajuda a entender por que o uso da "corridinha" até a outra margem da rua se torna uma solução comum, apesar de perigosa.

A prática, derivada justamente da falta de respeito às faixas, poderia ser desestimulada caso o uso desse tipo de marcação no asfalto fosse usado de forma mais racionada, defende Paulo Moraes, mestre em Gestão Urbana e especialista em Trânsito. "A faixa de pedestres deveria ser uma exceção, colocada apenas em lugares especiais. Normalmente, o que vemos são quatro faixas por esquina, onde inclusive já existe o semáforo. Há um abuso da sinalização básica, que acaba caindo em descrédito", afirma.

Eduardo Daros, presidente da Associação Brasileira de Pedestres (Abraspe), entende que a faixa seja um lembrete dos direitos e da fragilidade do pedestre ante os veículos motorizados, mas defende um uso ponderado da sinalização. "Deve ser colocada apenas quando for evidente que vai facilitar a travessia", justifica.

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Infrações relacionadas à faixa de pedestres somaram cerca de 20 mil multas no PR
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Testemunhar um motorista ser multado por não dar a preferência na faixa de pedestres é quase tão difícil quanto encontrar um que respeite essa lei de trânsito. Dados do Departamento de Trânsito (Detran) do Paraná mos­­tram que, de janeiro a abril deste ano, foram aplicadas em todo o estado cerca de 20 mil multas relacionadas a alguma infração na faixa de pedestres – uma média de 170 por dia. Isso representa apenas 2,3% do total de punições a condutores emitidas nesse período.

VÍDEO: A reportagem da Gazeta do Povo contou, por cinco minutos, a quantida de carros que desrespeitam a faixa de pedestres em um cruzamento do Centro de Curitiba. Veja o resultado

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Essa porcentagem se mostra muito aquém da realidade do trânsito em uma grande cidade, onde o descumprimento passou a ser a regra. Uma "mini blitze" feita pela reportagem em dois cruzamentos sem semáforos, no Centro de Curitiba, precisou de apenas um minuto para flagrar alguns infratores. Na esquina das ruas José Loureiro e Mon­­senhor Celso, 17 motoristas deixaram de dar a preferência aos pedestres na faixa. No cruzamento entre a Rua Senador Alencar Guimarães e a Praça Osó­­­­rio, oito condutores não respeitaram a sinalização.

Imperceptível

A falta de rigidez na legislação relacionada aos direitos do pedestre é decorrente das prioridades adotadas pelos órgãos de fiscalização, avaliam especialistas. "É uma tradição nossa. Como o motorista não é multado, o direito de quem caminha acaba se tornando difuso, pouco perceptível", avalia Eduardo Daros, presidente da Associação Brasileira de Pedestres (Abras­­pe).

Tentando controlar a epidemia de desrespeito à faixa, a cidade de São Paulo, por exemplo, intensificou as fiscalizações. Na primeira semana de trabalho, os fiscais aplicaram 378 multas diárias contra motoristas que não respeitaram a faixa de pedestres. Somadas, elas ultrapassam o total de multas aplicadas em todo o ano de 2010 naquela cidade.

Para a Semana Nacional do Trânsito, que começa amanhã, o Detran do Paraná planeja uma ação parecida, mas de caráter informativo, sem a aplicação de multas. Tendo como parceiros a Urbanização de Curitiba (Urbs) e a Diretoria de Trânsito de Curitiba (Diretran), o órgão pretende alertar os motoristas que passarem pelos 50 cruzamentos com maior incidência de atropelamentos na capital.

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Lei do mais forte

A falta de fiscalização e punição explica esse desrespeito à faixa apenas em parte. Segundo especialistas, a adoção da "lei do mais forte" nas faixas, que seria entendida como natural até pelos próprios pedestres, contribui para a solidificação desse comportamento. "O carro tende a avançar sobre o pedestre, cujo para-choque é a roupa", ironiza Paulo Moraes, mestre em Gestão Urbana e especialista em Trân­­sito. "A menos que haja uma aglomeração de pessoas na faixa. Daí as forças se invertem", complementa.

Para Daros, a predominância do motorista é problemática. O trânsito escoa melhor, avalia ele, à medida que as condições de fluidez de veículos e pessoas a pé seja equilibrada. "A obrigação de quem anda a pé é procurar a faixa e a de quem dirige é dar a preferência. Assim, ambos poderão avançar sem encontrar grandes atrapalhos a cada esquina", afirma.