O Movimento Advogados do Brasil – grupo formado por cerca de dez mil advogados, presente em todos os estados do país – iniciou recentemente um processo de seleção de candidatos para a formação de chapas para concorrer nas eleições das seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A decisão pelo lançamento das chapas ocorreu, de acordo com líderes do grupo, em reação a um processo crescente de uso da entidade máxima de representação dos advogados brasileiros para fins partidários, que divergem das funções institucionais da Ordem.
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As eleições para as seccionais (estados) e subseções (municípios) da OAB ocorrerão em novembro. Já as eleições para o Conselho Federal da entidade (CFOAB), cujo presidente em exercício é Felipe Santa Cruz, ocorrerão em 2022 de modo indireto, isto é, os conselheiros eleitos nas eleições das seccionais neste ano elegerão os integrantes do Conselho Federal no ano seguinte.
Inquérito do STF foi estopim para a decisão de lançar chapas, diz coordenador
De acordo com o advogado Emerson Grigollette, um dos coordenadores nacionais do movimento, a decisão de lançar as chapas está relacionada a uma percepção de atuação seletiva do CFOAB quanto à defesa de prerrogativas dos advogados associados, em alinhamento com interesses político-partidários. Ele argumenta que no último ano houve um salto de violações de direitos dos advogados, que não foram objeto de defesa da OAB.
Para Grigollette, a suposta parcialidade foi agravada após a eleição do presidente Santa Cruz, em janeiro de 2019. “Basicamente ele transformou a Ordem num ‘grêmio’ político. Por conta disso, lamentavelmente os direitos de muitos advogados são selecionados; escolhe-se quem defender e quem valorizar, e utiliza-se a própria Ordem para exercer pressões políticas, o que não deveria acontecer”, diz o advogado.
Ele explica que o fato que mais pesou a favor da decisão pelo lançamento das candidaturas por parte do movimento foi a atuação da OAB e de Santa Cruz (que tem sido acusado frequentemente por uso político-partidário da Ordem) em relação ao Inquérito 4.781 – o chamado “Inquérito das Fake News”. De acordo com Grigollette, a entidade fez pouco diante do suposto abuso por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), que conduz uma investigação na qual ele próprio é a vítima e não fornece aos advogados de defesa dos investigados acesso integral aos autos do processo, o que fere a Súmula Vinculante 14, do próprio STF.
“Recentemente completamos 400 dias sem que os 29 advogados de defesa tenham acesso aos autos na íntegra. Nunca aconteceu algo assim na história do Brasil, e diante desse caso, que cria um precedente perigosíssimo no Supremo para todos os advogados brasileiros, não houve uma atuação ativa da OAB”, diz o coordenador.
Segundo ele, há muitas pressões políticas também dentro das seccionais, o que por vezes faz com que advogados que não estão alinhados com o grupo à frente das entidades regionais não sejam ouvidos adequadamente. “As seccionais também devem socorrer os advogados, mas infelizmente isso nem sempre acontece. Às vezes, nem na subseção o profissional encontra apoio devido a divergências políticas. Isso é humilhante para o advogado”, observa.
Para Flavia Ferronatto, fundadora do Movimento Advogados do Brasil, além da pauta central da campanha promovida pelo grupo, que é a defesa ampla das prerrogativas profissionais, há outras reivindicações. Uma delas é a atuação institucional da OAB para incluir os advogados nos grupos que, apesar de não integrarem forças de segurança, têm direito ao porte de armas devido ao risco da profissão, assim como já ocorre para juízes e promotores de Justiça.
Quanto a esse ponto, ela cita que a medida tem grande importância para a profissão, uma vez que advogados estão expostos a riscos diversos, em alguns casos semelhantes a juízes e procuradores. Apesar de haver projetos de lei no Congresso Nacional que pretendem incluir advogados nos grupos que podem portar armas, a pauta não é prioritária na gestão nacional da OAB. “Pelo menos uma vez por mês vemos notícias de colegas que foram assassinados sem chances de defesa, mas não há preocupação por parte da Ordem em atuar para que isso avance e se torne lei”, diz Flavia.
A fundadora pontua, ainda, que o propósito do grupo é impedir a utilização da OAB como plataforma política e focar na missão elementar da entidade, que é a defesa dos associados. “Nosso compromisso é acabar com essa bagunça política e tornar a Ordem melhor para todos – advogados de direita e de esquerda. Todos devem ter os mesmos direitos. Não admitimos esse uso político da OAB de forma alguma”, afirma.
Mudanças no formato das eleições da OAB e desafios quanto ao sistema de cotas
A estratégia de ocupar espaços nas seccionais é também um caminho para que o grupo tenha mais espaço no Conselho Federal. De acordo com o estatuto da OAB, os conselheiros eleitos nas regionais votam para compor a representação nacional da entidade. A alteração no sistema de eleições indiretas, aliás, também integra o rol de mudanças almejadas pelo grupo. De acordo com Grigollette, o sistema de votação atual é confuso e com pouca transparência para os advogados. Ele explica que os profissionais se veem obrigados a votar em chapas com dezenas de membros, sendo que alguns deles compõem o grupo de candidatos a conselheiros que futuramente terão poder de voto.
“O sistema de votação atual é feito justamente para dificultar. O advogado não vota em uma pessoa, vota nos ‘chapões’, nos quais estão presentes os que vão ser nomeados para o Conselho. Essas figuras ficam ocultas nas eleições, isto é, o advogado vota, mas não sabe necessariamente em quem está votando”, explica. “Você acaba votando no chapão. Não tem transparência, não tem nada democrático nisso”.
Atualmente o grupo está em processo de seleção dos candidatos para compor as chapas nas seccionais – as subseções não estarão contempladas na estratégia do movimento para as eleições deste ano.
Diante do novo sistema de cotas estabelecido pelo Conselho Federal da instituição a partir deste ano, o movimento encara como desafio montar a composição das chapas, pois demandam grande número de candidatos. De acordo com resolução aprovada pelo CFOAB em dezembro do ano passado, as chapas inscritas para disputar as eleições deverão contar com pelo menos 50% de mulheres e 30% de negros.
“Dentro do sistema de cotas, fica mais difícil encontrar o número suficiente de pessoas que se encaixem em um determinado perfil. Isto é, que tenham a mesma adesão e a mesma união em relação a determinadas pautas, para formar as chapas”, diz. “Essa é uma das nossas maiores dificuldades hoje. Até porque a esquerda angaria muito as pessoas com essa formação de grupos ideológicos. Isso é péssimo, porque em vez de unir a advocacia, acaba formando cada vez mais grupos e, consequentemente, havendo uma segregação ainda maior”, ressalta.
Outro lado
A Gazeta do Povo abriu espaço à OAB Nacional para a publicação dos contrapontos às alegações apresentadas nesta reportagem, porém até o fechamento desta matéria não houve retorno.
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