Ouça este conteúdo
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) determinou a abertura de procedimento investigatório criminal por causa das publicações feitas pelo bar Primata Parrilla, de Presidente Prudente (SP), nas redes sociais. Nelas, o estabelecimento faz "piadas" com crimes de repercussão nacional, com os assassinatos de Eliza Samudio* e Isabella Nardoni**. Outros posts tratam da fome na Etiópia e do uso de máscara para se proteger contra o coronavírus.
O bar apagou o post sobre a morte de Eliza Samudio e alegou que tomou essa atitude em respeito à mãe e ao filho da vítima. Segundo outro post feito pelo estabelecimento no Instagram, os dois eram os únicos que teriam “legitimidade de se ofenderem”. Mesmo com o pedido de desculpa, afirmou entender “se tratar apenas de uma piada”.
Mas esse não é o entendimento do MP-SP. O órgão salientou que o responsável pelo conteúdo postado nas redes sociais do bar, Daniel Arena Carrion, já responde a três processos por causa de postagens anteriores pelo crime previsto no art. 20, § 2º, da Lei 7.716/89. Diz o caput do artigo que é crime “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Em caso de condenação, o § 2º determina pena de reclusão de dois a cinco anos e multa, se o crime for “[...] cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza [...]”.
Como as postagens continuaram, o MP-SP agora determinou que seja instaurado novo procedimento investigatório pelos crimes de racismo e apologia a fato criminoso. A decisão foi informada por meio da portaria 01/2020, de 9 de dezembro, de autoria do 2.º promotor de Justiça auxiliar de Presidente Prudente, Claudinei de Melo Alves Júnior, que também acumula a 6ª Promotoria.
Uma das publicações que seguem no ar diz respeito à Etiópia (foto principal). Após a repercussão, o bar postou o seguinte texto: “Não almoçam juntos. Não jantam juntos. Vivem correndo. Receitas prontas pra vida, tá cheio de gente que sabem [sic] dar, uma pena não servir pra todos, né? Guarde pra vc suas opniões [sic] e suas dicas, estamos nem aí pra cada uma delas. Achou válido? Use-as, mas não me venha encher o saco querendo impor suas regras prontas. Sem mais Sr. Macaco, o amigo do Mário”.
Ao Yahoo Notícias!, Carrion reafirmou que os post se tratam de “piadas com humor ácido”, que considera que fazem parte da “liberdade de expressão”, mas que não é opinião do estabelecimento sobre os assassinatos.
“Não é a nossa opinião. Eu repudio esses tipos de crimes. Não é que eu ache que assassinato ou um feminicídio seja piada. (...) É um humor ácido, e que eu acho que as frases são engraçadas. (...) Você pode até achar de mal gosto, está ok, no seu direito. Mas isso não me tira o direito de fazer a piada que eu quiser. Se na semana que vem eu quiser fazer uma piada com a mulher da Yoki***, vou fazer”, disse Carrion, ao portal.
Homicídios citados
*Eliza Samudio desapareceu em 2010 e o corpo nunca foi encontrado. O goleiro Bruno Fernandes, com quem manteve relação extraconjugal e teve um filho, foi apontado como um dos autores do crime. Ele foi preso e condenado por homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, sequestro e cárcere privado de Eliza e da criança. O crime de ocultação de cadáver já prescreveu. Em julho de 2019, ele conseguiu progressão para o regime semiaberto. Neste ano, o goleiro assinou contrato com o Rio Branco (AC). Na época do crime, defendia o Flamengo (RJ). Outras três pessoas foram condenadas nesse caso.
**Isabella Nardoni morreu em 2008, com 5 anos, depois de ter sido jogada da janela do sexto andar de um apartamento em São Paulo. O pai da menina, Alexandre Nardoni, e a madrasta, Anna Carolina Jatobá, foram condenados por homicídio qualificado, com agravante pelo parentesco com a criança. Anna Carolina havia conseguido a progressão para o regime semiaberto em 2017, mas perdeu devido à um punição disciplinar em 2020. Nardoni obteve o mesmo benefício em 2019.
***Marcos Kitano Matsunaga, que presidia a empresa Yoki, foi assassinado pela esposa, Elize Matsunaga, em 2012. Ela deu um tiro no marido, esquartejou o corpo, colocou em uma mala e depois deixou em um matagal. Elize foi condenada por homicídio qualificado, destruição do corpo e ocultação de cadáver. Conseguiu redução da pena no Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2019 e, meses depois, progrediu para o regime semiaberto.