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O Ministério Público Federal, por meio do procurador Cleber Eustáquio Neves, protocolou uma ação civil pública, nesta quarta-feira (9), em que pede que enquanto não forem concluídas as fases 3 e 4 do desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19 e encerrados todos os estudos clínicos referentes aos imunizantes, a obrigatoriedade da vacinação contra o vírus para menores de 18 anos não seja incluída nos calendários vacinais, como o Programa Nacional de Imunizações (PNI) e o Plano Nacional de Operacionalização da vacinação contra a Covid-19 (PNO).
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O procurador também pede que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e todos os entes federados sejam proibidos de publicar notas técnicas ou atos administrativos que autorizem a vacinação de crianças e adolescentes sem a presença (ou expressa autorização por escrito) dos pais ou responsáveis. Também é solicitado que sejam disponibilizados, nos locais de vacinação, ao menos duas modalidades de vacinas contra o vírus, de tecnologias diferentes, dentre outras medidas, como o distanciamento mínimo de oito semanas entre uma dose e outra.
Na denúncia, pede-se que a Anvisa apresente nos autos relatório com todos os eventos adversos notificados em menores de 18 anos que tomaram as vacinas contra a Covid-19 até o momento, indicando o imunizante aplicado, as datas das doses, a descrição do evento adverso reportado e, na hipótese de falecimento, a data do óbito. O mesmo deve ser feito em relação a fetos com anomalias congênitas e abortos em mulheres que receberam a inoculação.
Quanto às fabricantes das vacinas Pfizer, Coronavac, Astrazeneca e Janssen, o procurador do MPF pede que pelos próximos dez anos as empresas mantenham, em todo o país, equipes de profissionais para monitoramento da evolução do quadro clínico de crianças e menores de 18 anos vacinados com seus produtos e que tenham apresentado eventos adversos.
Ainda segundo os termos da petição, União, Anvisa e fabricantes deverão criar um fundo para depósitos de valores em conta judicial para eventuais tratamentos e indenizações a crianças e adolescentes que apresentarem problemas de saúde relacionados às vacinas pelo prazo mínimo de 10 anos. Os depósitos mensais das empresas seriam referentes a 5% do valor de venda dos seus produtos no país desde janeiro de 2021.
Por fim, o procurador do MPF pede à União, Anvisa e às empresas fabricantes indenização de meio bilhão de reais a título de dano moral e coletivo devido à disponibilização dos imunizantes a crianças sem ter havido a conclusão de todas as fases de desenvolvimento das vacinas. São réus na ação: União, Anvisa, Fiocruz, estado de São Paulo e empresas fabricantes da Pfizer, Janssen e Astrazeneca.
Principais argumentos da denúncia
O argumento central da denúncia está na suposta negligência por parte da Anvisa quanto à aprovação das vacinas contra a Covid-19 para crianças num momento em que, de acordo com a petição, há baixos índices de hospitalização e mortes em crianças e que o processo de desenvolvimento dos imunizantes ainda se encontra na fase 3 (de um total de 4), ainda não sendo possível mensurar todos os efeitos colaterais dos produtos, assim como os fatores de risco relacionados. Em outras palavras, a denúncia cita que a Anvisa aprovou a vacinação para crianças sem a conclusão de estudos clínicos.
“Tentativas e erros são comuns nas etapas de pesquisa em laboratório e nos testes em modelos celulares e animais até chegar às quatro fases dos ensaios clínicos — quando a vacina finalmente é aplicada em seres humanos, para verificar segurança e eficácia. O tempo médio de desenvolvimento de um novo produto é de cerca de 10 anos”, aponta a denúncia. Citando fala de Expedito Luna, professor de epidemiologia da Faculdade de Medicina da USP, o procurador do MPF aponta que “pode haver graves consequências se o processo de desenvolvimento de uma vacina seguir por ‘atalhos’”.
Como as principais vacinas distribuídas em todo o mundo ainda estão na fase 3, que só será concluída a partir de 2023, os imunizantes foram aprovados de forma emergencial devido ao avanço em larga escala da Covid-19. Diante das possíveis limitações de dados referentes à eficácia e segurança, opositores da vacinação compulsória têm classificado os imunizantes contra o vírus de experimentais.
Paralelamente, o procurador cita estudos em diferentes países – incluindo do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e da Agência de Alimentos e Drogas (FDA na sigla em inglês), ambos dos Estados Unidos, que apresentam evidências de efeitos colaterais – principalmente relacionados a doenças cardiovasculares – em menores de 18 anos supostamente relacionados aos imunizantes contra a Covid-19 em distribuição no Brasil.
Ele cita que, dos 194 países que integram a Organização Mundial de Saúde (OMS), apenas 40 já autorizaram a vacinação na faixa etária de crianças de 5 a 11 anos, sendo que em parte deles a inoculação não é obrigatória e em outros são admitidas apenas uma dose ou são vacinadas apenas crianças que não contraíram Covid.
Por fim, denuncia que, mesmo diante do quadro de indefinições, órgãos do poder público têm interpretado a vacinação infantil como obrigatória e questiona a não responsabilização dos fabricantes por possíveis efeitos colaterais de seus produtos.
Especialistas avaliam segurança das vacinas na fase 3
De acordo com informações que constam no site do Instituto Butantan, das quatro fases para o desenvolvimento de uma vacina, a primeira corresponde à pesquisa básica; a segunda abrange testes pré-clínicos que têm por objetivo demonstrar a segurança e o potencial imunogênico do imunizante; a terceira contempla ensaios clínicos; e a quarta é a etapa em que a vacina pode ser disponibilizada à população com segurança.
Segundo Guilherme Ferreira Silveira, doutor em Biociências e pesquisador em Saúde Pública na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), há segurança suficiente para a administração das vacinas. Ele afirma que a segurança dos imunizantes é analisada nas fases 1 e 2, enquanto a eficácia é avaliada nas fases 2 e 3 e, na fase 4, são analisadas questões imunológicas da vacina – soro conversão, níveis de anticorpos, anticorpos neutralizantes. “Virtualmente, a fase 4 é finalizada quando se percebe as limitações imunológicas das vacinas. Por exemplo, a dose de reforço (terceira dose) foi indicada, justamente porque se percebeu a redução nos níveis de anticorpos circulantes em pacientes, especialmente acima de 60 anos”, diz Silveira.
Por outro lado, o infectologista Francisco Eduardo Cardoso Alves afirma que na fase inicial a segurança das vacinas é avaliada, porém nas etapas seguintes esse aspecto ainda permanece em avaliação, uma vez que os grupos que recebem os imunizantes são mais numerosos.
“Na fase 3 analisa-se a eficácia – se os anticorpos são eficazes e se não há efeito colateral relevante não visto nas anteriores, pois é feito em um grupo bem maior de pessoas. Essa fase leva mais tempo e é aqui que aceleraram a aprovação”, diz o infectologista. “Os estudos de fase 3 [da Covid-19] só vão terminar a partir de 2023. Mesmo assim, a Janssen, por exemplo [que recentemente anunciou a suspensão da produção de vacinas contra a Covid], já foi retirada do mercado sem sequer ter terminado essa fase e foi aplicada em milhões de pessoas”, afirma.
Outro lado
A Gazeta do Povo entrou em contato com todos os órgãos públicos e empresas que foram citados na denúncia, fez questionamentos a respeito da segurança dos imunizantes no atual cenário e abriu espaço para contrapontos aos argumentos da denúncia.
A Anvisa informou apenas que foi notificada nesta quinta-feira (10) para a apresentação de informações relativas aos questionamentos da ação e que responderá ao pedido do juiz responsável pelo processo no prazo definido de até 72 horas.
O Instituto Butantan encaminhou um dossiê de estudos científicos que aborda a eficácia e a segurança da Coronavac.
A Pfizer informou que as agências regulatórias exigem estudos clínicos de fase 1, 2 e 3 para aprovações de medicamentos e vacinas. “Os estudos de fase 3, chamados de pivotais, são os que possibilitam a aprovação e comercialização do produto. Estudos de fase 4 não são parte da etapa de desenvolvimento de vacinas e são feitos pós-comercialização de qualquer medicamento ou vacina, para acompanhamento do produto”, diz o comunicado. A nota completa da empresa encaminhada à reportagem pode ser acessada por este link.
Até o momento, o Ministério da Saúde, a Fiocruz e a Janssen não retornaram aos pedidos de informação. Assim que as respostas forem recebidas, as informações serão acrescentadas nesta reportagem.