Já faz algum tempo o sexo deixou de ser assunto restrito ao universo masculino. A revolução sexual dos anos 1960 ainda não acabou e vem derrubando tabus seculares, assegurando à mulher o direito de igualdade na vida conjugal, pondo fim à sua condição de inferioridade frente ao homem. Elas foram à luta em busca do prazer e já respondem por 70% do faturamento da indústria do sexo, um negócio que movimenta R$ 700 milhões por ano só no Brasil. Também por causa delas, as lojas de artigos eróticos deixaram de ter um caráter de "clandestinidade" para, literalmente, conquistarem um lugar ao sol. Há dez anos os irmãos Jorge e Evelise Belém abriam o primeiro sex shop de frente para a rua em Curitiba. Hoje são seis deles com vitrines e outros sete mais escondidinhos.
Jorge e Evelise são um claro exemplo da prosperidade nesse ramo. Foram abrindo lojas conforme a procura aumentava. Hoje eles têm três sex shops em Curitiba e dois em Porto Alegre. Quando Jorge abriu o primeiro, na Travessa Jesuíno Marcondes, no centro de Curitiba, o perfil dos clientes era uma incógnita. Não sabia se atenderia a um público masculino, feminino ou homossexual. Mas não tardou a descobrir que o filão estava entre as mulheres. Hoje, elas representam 85% da clientela. São, em geral, mulheres bem resolvidas emocionalmente que buscam alguma novidade para aquecer o relacionamento a dois.
Mas não é só atrás de lingeries e brinquedinhos que elas entram numa butique erótica. Os negócios começam a se diversificar porque já não há motivos para se esconder atrás de tabus e preconceitos. As arquitetas Patrícia Cassol, Val Ruon e Tatiana Marcassa sabem muito bem disso. Val e Patrícia organizaram a despedida de solteira de Tatiana dentro de um sex shop. "Queríamos algo diferente dos chás de panela convencionais, algo que não fosse chato nem muito caro", explica Val. Jorge e Evelise tinham exatamente o que elas procuravam, e o chá de panela foi realizado ontem à tarde na Muito Prazer Sex Boutique, na Marechal Deodoro.
Tudo começou com uma idéia simples, de pronto aceita pela noiva. "Os chás de panela têm sempre um artigo de sex shop, porque então não fazer dentro de um deles?", diz Patrícia. As amigas, também sócias em um escritório de arquitetura, não queriam aquelas lembrancinhas convencionais, como imã de geladeira, espremedor de alho, jogo de xícaras, escorredor de macarrão. Na despedida de solteira de Tatiana, cada uma das 40 convidadas ganhou dados eróticos. Os próprios artigos da butique erótica viraram objetos decorativos. Um dia antes da festa, as sócias e amigas ganharam o reforço de mais uma colaboradora, Caterine Moro, no trabalho de decoração.
Foi ainda na diversão dos preparativos da festa que Tatiana e as amigas se deram conta que estariam fazendo história. Este foi o primeiro chá de panela que se tem notícia realizado num sex shop no Paraná. "Quem sabe mais gente se anima", diz a noiva. Para Jorge também foi novidade a despedida de solteira, mas não a reunião de mulheres. Por cinco vezes ele já havia alugado o salão para encontros reservados do público feminino. Elas estão definitivamente quebrando tabus, como a noiva Tatiana, que se casará no próximo dia 21.
Tatiana conta que no início sentiu um certo receio de contar a novidade para a mãe e as tias, mas a idéia foi muito bem recebida depois de esclarecido que se trataria de uma festa de mulheres, não de um clube de mulheres, aquele onde há strip-tease masculino. O noivo, o designer Marcelo Franco, aceitou numa boa. Achou até divertido. Segundo Tatiana, algumas convidadas estavam ansiosas por conhecer um sex shop. Seguras do que procuram, movidas pela curiosidade ou de forma acidental, como no caso das convidadas de Tatiana, a verdade é que o público feminino está cada vez mais presente nas butiques eróticas.
A Associação Brasileira das Empresas do Mercado Erótico e Sensual (Abeme) estima que sete entre 10 clientes são mulheres. No sex shop de Jorge e Evelise a proporção é ainda maior, chegando a 85%, o que levou os irmãos a abrirem a loja da Marechal Deodoro toda ambientada para elas. Isso não significa que o começo tenha sido fácil para esses pioneiros nos sex shop com vitrine voltada para a rua em Curitiba. Mas aos poucos os clientes foram perdendo a vergonha e o preconceito. A mesma dificuldade inicial também foi percebida por Ivo Tamayose quando decidiu abrir a No Auge Produtos Eróticos e Sex Shop, há dez anos.
Hoje Tamayose tem até cliente cativo. Sua butique é freqüentada mais por casais, assim como na concorrente Delirious Produtos Eróticos. Nesta última, a gerente Nilza Refatti conta que pesquisou a concorrência antes de abrir a loja, há oito anos. Percebeu a presença de adolescentes curiosos, o que inibia uma mulher de comprar um vibrador, por exemplo. Por isso, optou por um sex shop menos exposto, com mais privacidade, e não se arrepende de manter a loja bem escondidinha. O público dela é mais de paulistas, cariocas e catarinenses que se estabeleceram em Curitiba. "O curitibano é mais conservador", constata.