O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), multou em R$ 300 mil o influenciador digital Monark, sob a alegação de que ele teria descumprido uma decisão judicial – o que, para o magistrado, justifica a instauração de um inquérito por suspeita de crime de desobediência.
Juristas entrevistados pela Gazeta do Povo dizem que Monark não violou nenhuma lei. Segundo eles, do ponto de vista constitucional, além de ter sido sancionado injustamente em decisões anteriores, Monark também não poderia ser investigado por crime de desobediência.
Para Alessandro Chiarottino, doutor em Direito Constitucional pela USP, o caso revela a "normalização da censura no Brasil". "Não há nada nos pontos elencados pelo Moraes que possa ser considerado delito perante a legislação brasileira", diz.
Na visão dele, uma análise jurídica pormenorizada das decisões de censura tem cada vez menos sentido. "Temos uma situação realmente muito grave no país hoje em dia, que é o desfazimento do modelo que foi instaurado com a Constituição de 1988. E nós não sabemos para onde estamos caminhando. Isso me parece o cerne desse fato [da decisão sobre Monark]", observa.
Para Adriano Soares da Costa, ex-juiz de Direito, a decisão de Moraes "não cita uma única norma jurídica violada pela conduta do comunicador social" e empilha ilegalidades: foi proferida em um inquérito que é inconstitucional, configura censura prévia e elimina os meios de subsistência de Monark.
"São medidas extremas e inconstitucionais, sem previsão legal e com a supressão da liberdade individual sem a observância do devido processo legal, promovidas por juízo de exceção sem previsão legal", observa.
Soares da Costa explica ainda que, mesmo que as decisões fossem constitucionais, Monark não poderia ser enquadrado no crime de desobediência. Isso porque, em primeiro lugar, já havia uma sanção prevista para o caso de descumprimento da ordem judicial, o que impediria a Justiça de enquadrá-lo no tipo penal de desobediência.
"A jurisprudência do STJ [Superior Tribunal de Justiça] tem se formado no sentido de que, quando há sanções específicas para os casos de descumprimento de medidas protetivas de urgência, que seriam a multa e a possibilidade de prisão preventiva, afasta-se a incidência do tipo penal de desobediência. Desse modo, não há tipicidade na conduta de Monark, ainda mais porque a ordem de suspensão de perfis é destinada às plataformas digitais", explica o advogado.
Moraes já havia emitido decisão para que as redes sociais desmonetizassem todos os perfis de Monark – o que, para os juristas, também é inconstitucional.
Para Chiarottino, a reiteração de decisões judiciais desse tipo impede que o Brasil seja considerado uma democracia plena. "Nós já não estamos numa situação de Estado Democrático de Direito pleno. Estamos em situação híbrida, entre um regime autoritário e o regime do Estado de Direito. É um Estado de Direito que vai negando cada vez mais os seus fundamentos – como a liberdade de expressão, o devido processo legal e o respeito à integridade física das pessoas e às suas liberdades. Essa erosão do Estado Democrático de Direito é muito mais importante do que analisar individualmente cada caso. Porque a gente corre o risco de ficar falando eternamente, daqui a mil situações análogas a essa: 'aqui não existe delito', 'isto aqui deveria ser considerado liberdade de expressão', 'essa pessoa pode ser presa por este ponto específico' etc".
Soares da Costa diz que os relatórios de inteligência que embasam a decisão de Moraes lembram os produzidos na ditadura militar para perseguir e prender opositores do regime. "Ao bloquear os perfis de Monark em todas as plataformas digitais e redes sociais, faz-se um expurgo de críticos ao Poder Judiciário ou da democracia brasileira, baseado na alegação juridicamente vazia de 'liberdade com responsabilidade', sendo que a definição do equilíbrio desse binômio seria feita e escrutinada pelo aparelho de repressão comandado pelo próprio ministro", comenta.
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Moraes cita meios "delatores" para embasar decisão contra Monark
Na decisão, Moraes menciona meios de comunicação e agências de checagem que denunciaram o descumprimento de decisões anteriores e teriam embasado sua nova decisão.
"Há o registro de notícia veiculada na imprensa informando que Bruno Aiub tem se aproveitado das falhas de moderação do Spotify para se esquivar das decisões judiciais", afirma o ministro.
A decisão também contou com a ajuda da Assessoria Especial de enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que monitoram Monark para identificar eventuais críticas ao TSE. O órgão tem tido papel cada vez mais proeminente nas ordens de censura do Judiciário.
Ao site Boletim da Liberdade, Monark chamou a decisão de Moraes de "perseguição". "Se alguém achou que o negócio ia amenizar ou que o estado de exceção ia acabar, muito pelo contrário: a gente está indo a um aprofundamento do estado de exceção", afirmou.
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