Cerca de 180 mil multas de trânsito antigas aplicadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) estão tirando o sono de proprietários de veículos no Paraná. Embora as infrações tenham sido cometidas nos anos de 2004, 2005 e 2006, elas estão sendo cobradas somente neste ano. Isto porque as multas não estavam cadastradas no sistema do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) até o início deste ano. O motivo era a falta de convênio entre o Detran e a PRF, que ficou três anos fora do Registro Nacional de Infrações (Renainf).
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) do Paraná emitiu 261.660 multas entre janeiro de 2004 e o último dia 13, mas só as multas deste ano foram cadastradas em tempo hábil no site do Detran. Isso está trazendo problemas para quem comprou ou trocou de veículo nos últimos quatro anos. A descoberta dos débitos ocorre durante o licenciamento, que exige a quitação de tributos, multas e seguro obrigatório para a emissão do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo.
Esse é o caso do comerciante Maurílio Pinotti, que trocou de carro no início de 2006 mas só descobriu no mês passado que o seu veículo tinha três multas pendentes. As infrações haviam sido cometidas pelo proprietário anterior, ainda no ano de 2005. "Preciso pagar R$ 1,8 mil de licenciamento do meu Vectra", diz Pinotti. Segundo ele, são R$ 1,3 mil só de multas.
A dona da revendedora pagou no dia 16 as multas para o cliente. Segundo a proprietária, que pediu o anonimato, as lojas estão procurando os antigos proprietários e depois acertando com os clientes. "No caso do Vectra, eu não consegui receber do proprietário anterior, mas fiz o depósito para o cliente", afirma a empresária. Ela informa que já pagou cerca de R$ 5 mil do bolso.
A orientação da Associação dos Revendedores de Veículos Automotores no Paraná para seus 210 sócios é para que procurem o proprietário anterior do veículo, e, se ele não for encontrado, acertar com o cliente.
No entanto, um dos coordenadores da entidade, o empresário César Lançoni Santos, da Cabral Automóveis, está tentando um acordo com a superintendência da PRF no estado. "Fiz um acordo semelhante em 2003, para não cobrar as multas antigas dos novos proprietários. Espero que ele seja renovado agora", diz Santos.
Embora as revendedoras e os antigos proprietários estejam pagando as multas antigas, o advogado e professor de Direito de Trânsito da UniCuritiba Marcelo Araújo considera a cobrança uma "sacanagem". "A Polícia Rodoviária Federal está criando uma balbúrdia, que precisa da intervenção da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público Federal, porque é muito oneroso para o cidadão tentar discutir na Justiça o pagamento ou não dessas multas", afirma.
Araújo diz que a cobrança é questionável sob o ponto de vista legal. "O Código de Trânsito Brasileiro prevê no artigo 124, inciso VIII, que a transferência de veículos depende da quitação de débitos. Então, como é que ela pode ser autorizada sem o pagamento de débitos pendentes?", diz.
Marcelo Araújo considera que as multas antigas de veículos que não foram negociados também podem ser questionadas. "Se a PRF não expediu o aviso de autuação, a cobrança é indevida, por falta de notificação", diz. "Isso sem contar que os licenciamentos feitos anteriormente, sem as multas, geram uma presunção de regularidade", afirma.