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As mortes de três pacientes que receberam nebulização com hidroxicloroquina na cidade de Camaquã (RS) viraram assunto do momento nas redes sociais, mas, até o momento, não sabe se os óbitos estão ou não estão relacionadas com o uso da técnica. As vítimas morreram entre segunda-feira (22) e quarta-feira (24), depois de receberem o tratamento no Hospital Nossa Senhora Aparecida, onde estavam internadas.
A nebulização foi realizada pela médica Eliane Scherer, que dissolveu cápsulas de hidroxicloroquina para realizar a nebulização. Eliane foi afastada do hospital e está sendo investigada pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers).
Segundo um comunicado do hospital, os três pacientes que morreram já tinham documentado em prontuário “taquicardia, ou arritmias, algumas horas após receberem a nebulização”. Além disso, dois deles já estavam “em grave estado geral, com insuficiência respiratória em ventilação mecânica”. O outro estava estável, “recebendo oxigênio por máscara com boa evolução”, afirma o hospital.
De acordo com o médico e diretor-técnico do hospital, Tiago Bonilha, não é possível atribuir as mortes à nebulização com hidroxicloroquina administrada pela médica. Porém, ele analisa que o caso não se trata da chamada prescrição "off label", autorizada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). "Ao meu ver, esse tipo de terapia transcende o que chamamos de prescrição 'off label'. Não tenho experiência com ela e não encontrei referências seguras para aplicar ela, portanto optei por não fazer."
O tratamento só foi permitido porque os pacientes entraram na Justiça para garantir a nebulização com hidroxicloroquina. “Neste cenário de desespero, polarização e politicagem, diante de muita pressão da sociedade, permitimos que, via judicial e, de maneira formalizada, os pacientes que desejavam receber essa terapia, assim o fizessem”, afirma o hospital na nota.
Na sexta-feira passada (19), o presidente Jair Bolsonaro entrou ao vivo em uma rádio de Camaquã e defendeu o tratamento por meio da nebulização de hidroxicloroquina.
* Leia a íntegra da nota do Hospital Nossa Senhora Aparecida:
"O Hospital Nossa Senhora Aparecida (HNSA), de Camaquã, Rio Grande do Sul, vem a público prestar esclarecimentos, diante dos acontecimentos em relação aos óbitos de pacientes que se submeteram ao tratamento experimental de inalação de hidroxicloroquina, feitos pela Dra. Eliane Scherer.
A Dra. Eliane Scherer, até o dia 10 de março de 2021, compunha a escala médica do pronto socorro do HNSA. A pedido da direção do hospital, a profissional foi afastada da escala após ter tentado obrigar a equipe assistencial a administrar pela via inalatória uma solução com Hidroxicloroquina, de procedência desconhecida, não prescrita em prontuário, manipulada pela própria médica.
Após o ocorrido, houve grande mobilização em torno do seu desligamento da escala sob o pretexto de o tratamento estar salvando vidas, inclusive com o depoimento de um paciente em um veículo de imprensa local. Diante do ocorrido, a referida médica passou a ofertar o tratamento aos familiares e pacientes que chegavam ao Pronto Socorro do Hospital, bem como aqueles internados na instituição.
Assim, houveram[sic] famílias que face a seu desligamento da escala do Pronto Socorro, contrataram a referida médica para acompanhar os pacientes, solicitando assim, que fosse administrado o tratamento experimental. Como se tratava de terapia experimental, houveram [sic] médicos que se negaram a prescrever o tratamento aos pacientes sob seus cuidados, razão pela qual, as famílias buscaram o poder judiciário para permitir que fosse feito o tratamento com a inalação da solução de HCQ.
Houve deferimento de liminar para que fosse administrado o tratamento, sob a condição de que a médica assumisse a integralidade da assistência de seus pacientes. Por essa razão, o hospital firmou com outras famílias que tinham o mesmo interesse em aplicar o tratamento em seus familiares, termo de acordo no qual a médica e os familiares se responsabilizavam pelas consequências do tratamento, e tinham ciência de que não havia nenhuma comprovação cientifica quanto ao mesmo. Assim, além de dois pacientes que já haviam recebido o tratamento, duas outras famílias entregaram aos cuidados da Dra. Eliane Scherer seus familiares.
Dos quatro pacientes internados que receberam o tratamento por inalação de HCQ, três deles vieram a óbito. Por se tratar de um tratamento sem comprovação cientifica, o Hospital não pode afirmar que houve relação direta entre os óbitos e a inalação com HCQ, por sua vez, não verifica que a nebulização contribuiu para melhorar o desfecho dos pacientes. Os indícios sugerem que está contribuindo para a piora, porque todos os casos (de óbito) apresentaram reações adversas após o procedimento.
Assim, o Hospital informa que continuará envidando todos os seus esforços para atender os seus pacientes, respeitando os protocolos aprovados pelos órgãos de saúde nacionais e internacionais.
Estamos vivendo um verdadeiro furacão. No auge do agravamento da pandemia, quando os sistemas de saúde estão à beira de um colapso, enfrentamos essa situação tão desagradável. O Conselho Regional de Medicina já está ciente e estamos aguardando uma manifestação sobre o caso.
Afirmamos que esse tipo de terapia ( nebulização com cloroquina) aplicada pela Dra Eliane Scherer transcende o que chamamos de prescrição off label. A instituição não tem experiência com este tratamento experimental, já que não há referências seguras para a aplicação do mesmo, portanto, opta por não fazê-lo.
Infelizmente, nesse cenário de desespero, polarização e politicagem, diante de muita pressão da sociedade, permitimos que, via judicial e, de maneira formalizada, os pacientes que desejavam receber essa terapia, assim o fizessem.
Reafirmamos que não temos como atribuir melhora, ou piora relacionada diretamente ao procedimento experimental, mas de fato, o desfecho final de três pacientes submetidos a terapia foi óbito. Todos eles tem documentado em prontuário taquicardia, ou arritmias, algumas horas após receberem a nebulização. Dois deles já estavam em grave estado geral, com insuficiência respiratória em ventilação mecânica e um deles estava estável, recebendo oxigênio por máscara com boa evolução.
Acreditamos que a Dra Eliane Scherer e os familiares, em momento algum quiseram causar mal aos pacientes e que essa ou qualquer tipo de terapia deve passar por profunda investigação e pesquisa científica antes de ser aplicada.
Esperamos que haja mais entendimento por parte dos pacientes em tratamento de que, até o momento, estamos lutando com todas as armas que temos e fazendo o melhor que podemos."