Eles não são puro-sangue. Mas do sangue de 50 cavalos que vivem em Piraquara, Região Metropolitana de Curitiba, é possível produzir por ano até 20 mil ampolas de 5 ml do antídoto para veneno de aranha-marrom. Quantidade suficiente para tratar 4 mil pacientes em estado moderado ou 2 mil em estado grave da picada cujo veneno, em 2015, causou uma morte e levou 815 pessoas ao consultório médico só em Curitiba, cidade que mais registra incidentes com a espécie Loxosceles.
IMAGENS: A produção de soro para aranha e cobra no CPPI
INFOGRÁFICO: Veja como é feita a produção do soro
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, de todas as picadas de aranha registradas até o início de novembro na capital, 76,5% foram de Loxosceles. Ou seja, 502 casos tratados com o soro produzido a partir dos equinos do Centro de Produção e Pesquisa de Imunobiológicos (CPPI) do governo do estado. Além dos 20 mil frascos do soro antiloxoscélico, o CPPI também produz anualmente 10 mil ampolas do soro de cobras da espécie Bothrops, entre elas, a jararaca. Uma escala industrial que não seria possível se os anticorpos do antídoto fossem retirados de outro animal.
“Sem o cavalo, não teríamos soro em quantidade suficiente. Como é um animal de grande porte, ele oferece sangue suficiente para a produção em grande escala, além de ser um animal dócil, que permite a coleta sem grandes contratempos”, explica o médico veterinário João Carlos Minozzo, chefe da Divisão de Pesquisa do CPPI. “Sendo mais enfático, esses cavalos salvam pessoas. Eles realmente dão mesmo o sangue por vidas”, ressalta.
A produção começa na coleta de aranhas para a extração do veneno a ser injetado no cavalo. Uma vez por mês, a equipe de agentes de saúde do CPPI coleta de 2,5 mil a 3 mil aracnídeos em municípios do Paraná e Santa Catarina. De cada aranha é possível extrair até sete vezes a substância tóxica. Entretanto, para produzir as três doses de 5 mg que são introduzidas no organismo do cavalo a cada ciclo, é necessário extrair manualmente o veneno de 300 aranhas.
“É um trabalho quase artesanal, porque é preciso dar eletrochoque em cada aranha individualmente”, explica o agente de saúde Milton Becker de Oliveira, que faz a coleta desde que o CPPI foi fundado há 25 anos. Junto com o veneno, é aplicado um adjuvante, substância que retarda o efeito do veneno, permitindo que o organismo do cavalo não sofra nenhum efeito da toxina aracnídea.
Se a quantidade de anticorpos for suficiente, 35 dias após a injeção do veneno é coletada a primeira bolsa de 6 litros de sangue. Com 37 dias, a segunda bolsa é coletada e aos 39 dias, a terceira, totalizando 18 litros de sangue. Após 24 horas da coleta, os glóbulos vermelhos se separam do plasma, a parte líquida do sangue, onde ficam os anticorpos usados no soro. Enquanto os glóbulos vermelhos são reintroduzidos no animal, o plasma é encaminhado ao Instituto Butantan, em São Paulo, onde é processado o antídoto.
Os 18 litros de sangue retirados do cavalo a cada processo rendem 12 litros de plasma, de onde é possível produzir, em média, 270 ampolas do soro antiloxoscélico. Quantidade suficiente para o tratamento de 54 pacientes em estado moderado ou de 27 em estado grave. Dois meses após a retirada de sangue, o cavalo está apto novamente a reiniciar o processo.
Mais cavalos
Para aumentar a produção, o CPPI pretende adquirir mais 30 cavalos. A maior parte da tropa atual é formada de animais inaptos para o trabalho de patrulha doados pela Polícia Militar ou adquiridos por licitação – em média, ao preço de R$ 4 mil.
Para entrar no time de salva-vidas, não pode ser puro-sangue, nem pangaré. Tem que preencher alguns pré-requisitos: ter no mínimo 500 kg, não apresentar nenhuma lesão grave e nem problemas cardíacos, respiratórios ou na arcada dentária. Precisa ter também características rústicas - para evitar problemas gástricos, como cólicas, comuns em cavalos que vivem em baias, os animais do CPPI vivem soltos no pasto, recolhidos apenas de noite. “O puro-sangue é muito sensível. É como comparar uma Mercedes e um jipe. A Mercedes corre, tem tecnologia, mas não foi feito para andar em estrada de chão. Já o jipe tem força e aguenta o tranco”, explica Rubens Gusso, também médico veterinário do centro.
“Ao mesmo tempo que coletamos o sangue, damos todo o conforto a esses cavalos: a melhor alimentação, medicamentos quando necessário e liberdade. Afinal, eles são como trabalhadores: não dá só para explorar, senão ele se esgota e não rende”, compara Minozzo. “Uma coisa bonita que gosto de ver é esses cavalos brincando. Em dia de chuva, por exemplo, eles deitam nas poças, o que não é comum. Para mim, isso é demonstração de felicidade”, diz Gusso.
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