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Crise aérea

Nem só de avião circula a crise de infra-estrutura brasileira

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Curitiba – A crise dos últimos dez meses no transporte aéreo fechou os olhos dos brasileiros para outros problemas. Os aeroportos estão superlotados, é certo, mas as estradas também estão esburacadas, as ferrovias, abandonadas, e os portos assoreados. "Não temos apenas uma crise aérea. O problema está na infra-estrutura do nosso sistema de transportes, que não possui um planejamento forte", diz o professor da Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e PhD em Transportes, Luiz Afonso dos Santos Senna.

A Associação Brasileira da Infra-estrutura e Indústrias de Base (Abdib) fez um cálculo sobre as deficiências brasileiras no setor e chegou a um número forte: o Brasil precisa de R$ 87,7 bilhões de investimentos em infra-estrutura por ano para solucionar não apenas o caos aéreo, mas todos os problemas que enfrenta no setor de transporte. Esse valor representa 3,8% do PIB brasileiro de 2006, que foi de R$ 2,322 trilhão.

A necessidade de investimentos tão vultosos nada mais é do que o reflexo do abandono do sistema de transporte brasileiro nas três últimas décadas. Até os anos 70, cerca de 2% do PIB brasileiro era direcionado ao setor. Infelizmente, desde a década de 90, esse valor não passa de 0,2%. Para se ter uma idéia de como os transportes são importantes para o desenvolvimento de um país, concorrentes do Brasil perceberam isso e já fazem planejamentos para o ano de 2020. Por ora, seguem suas metas. O Vietnã investe 6% de seu PIB em transportes por ano, China, 4%, e a Índia, 2%. Os três crescem há anos duas a três vezes mais do que o Brasil tem crescido.

O professor Senna ressalta que a infra-estrutura precária que temos hoje é o resultado da falta de visão estratégica, de preparo e de investimentos de anos atrás. "Vejo muito improviso na questão de transporte, falta responsabilidade e visão estratégica, chega até a um certo amadorismo."

O mínimo

Como atingir os R$ 87,7 bilhões ainda é um sonho, o mínimo necessário para simplesmente evitar que a malha de transporte entre em colapso e prejudique o crescimento econômico seria de R$ 16,8 bilhões anuais, durante um período mínimo e ininterrupto de dez anos, segundo o presidente da Abdib, Paulo Godoy. "Esse valor não comporta os investimentos necessários para dar ao Brasil um sistema de transporte eficiente e competitivo, mas simplesmente para evitar racionamentos e gargalos de todos os tipos", diz ele.

Ainda de acordo com Godoy, com esse volume mínimo de investimentos seria possível reduzir significativamente o ônus que o setor produtivo paga para poder competir no mercado globalizado. "Nossos cálculos englobam a realização de serviços de conservação, manutenção, restauração em toda a extensão de rodovias federais pavimentadas e também em parte da malha estadual, bem como pavimentar, todo ano, cerca de 500 quilômetros de vias em terra."

Nesse cenário, o Brasil tem dois grandes desafios pela frente: investir para evitar colapsos e transformar a malha de transporte em um sistema realmente eficiente, que interligue os quatro modais (rodovias, ferrovias, aerovias e portos). E a superação desse desafio envolve um conjunto de diretrizes por parte do governo e da iniciativa privada. "O poder público precisa ser eficiente para gerir as obras que estão a cargo dele. Isso requer planejamento e mecanismos de gestão que permitam antecipar entraves e garantir que os empreendimentos sejam implantados dentro dos cronogramas e orçamentos esperados. Também é preciso atrair a iniciativa privada, pois sabemos que o Estado, sozinho, não tem recursos suficientes para suportar os pesados investimentos necessários", analisa Godoy.

Senna também aposta na privatização, que, segundo ele, pode ser uma maneira de minimizar os problemas e cita como exemplo o sucesso em outros setores como o de telefonia e de energia elétrica. "É claro que ainda há um risco de um novo apagão no setor elétrico, mas não é na parte de distribuição, nas mãos da iniciativa privada hoje, mas sim na de geração de energia que ainda está sob responsabilidade do governo", diz.

O pressuposto para isso é criar as condições que o capital privado requer. "Isso passa por um arcabouço regulatório estável e atrativo, incluindo agências reguladoras independentes e com responsabilidades bem definidas, até um sistema de licenciamento ambiental que ofereça previsibilidade aos investidores", ressalta o presidente da Abdib.

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