Telêmaco Borba é considerado o último pouso dentro do circuito turístico da Rota dos Tropeiros. Mas o grande diferencial da cidade nem é tanto seus atrativos naturais, mas sim, sua história envolvida com o Rio Tibagi e a principal indústria da região, a Klabin.
Em 1941, o então presidente Getúlio Vargas comandava um estado muito dependente de importações, quando percebeu que o país deveria ser auto-suficiente na produção de diversos itens, dentre eles, o papel. A fabricação de papel ficou ao encargo das Indústrias Klabin do Paraná Papel e Celulose S/A. Segundo André Miguel Coraiola, Secretário de Cultura de Telêmaco Borba, tudo começou quando Maurício Klabin, nascido na Lituânia e refugiado na Inglaterra, desembarcou no Brasil em 1889. Sem nenhum patrimônio, carregava apenas a roupa do corpo, um pouco de tabaco, papel e ferramentas para enrolar cigarros. "Rapidamente ele vendeu todo seu estoque de cigarro de papel, que era novidade no país, uma vez que só se fumava tabaco enrolado em palha de milho", conta Coraiola, que também é autor do livro "Capital do Papel". Com o que recebeu pela venda de cigarros, Maurício encomendou novos materiais da Inglaterra e mais tarde abriu uma pequena papelaria. Hoje a Klabin é uma das maiores indústrias papeleiras do mundo.
No meio da indústria madeireira, Telêmaco Borba abriga mais de 400 artesãos que expõem seus produtos na Casa do Artesão, um dos grandes centros de artesanato do Paraná. Mas o que ainda traz muita gente para a cidade, em busca do sonho de uma vida melhor, do achado, da sorte, é a oferta de diamantes e ouro ao longo do Rio Tibagi. Uma história que envolve diferentes culturas e experiências de vida, unidas contra todos os perigos e incertezas dessa profissão em busca das pedras preciosas.
"Indústria"
Domingo ensolarado no centro de Telêmaco Borba. O dia amanhecia e o movimento perto da rodoviária era pequeno. Paraibanos com suas redes, artesãos e vendedores ambulantes descansavam na sombra. "Os garimpeiros costumam se hospedar no Hotel Primavera, do outro lado da praça", dá a dica o taxista Luís. O hotel é uma típica espelunca de centro. Na portaria disseram que todos haviam saído. "Está vendo aquele homem lá embaixo, cruzando a rodoviária? Ele é garimpeiro". Depois do susto inevitável provocado pela abordagem, o homem não titubeou. "Sou garimpeiro sim. Estou indo agora mesmo tentar vender um diamante na casa do Wesley", conta Marcelo Rodrigues Borges, 32 anos.
Wesley Carretero é um dos intermediários da indústria do garimpo. Dono das balsas e equipamentos para mergulho, o garimpeiro que trabalha para ele é obrigado a vender a pedra por um preço muito abaixo do mercado. "Recebo apenas 30% do valor do diamante. 10% fica com o gerente da balsa e o resto é do Wesley", conta Marcelo.
Domingo é o dia que o garimpeiro volta do rio para a cidade descansar e vender o que foi achado. Alguns ficam semanas dormindo na balsa, com medo de voltar de mãos vazias.
Marcelo trabalhou muito tempo no garimpo. Natural do estado de Goiás, já rodou todo o país em busca da pedra de sua vida. "Uma vez ganhei 5 mil reais catando diamante em Minas. O problema é que pagam muito pouco aqui no Paraná. O dinheiro que a gente consegue só dá para comer alguma coisa e comprar cachaça". Junto com Marcelo, mais três garimpeiros entram na conversa. Dentinho era o mais ressabiado. Já Sabiá não se importava em mostrar uma pepita de ouro que garimpou no Tibagi. "Vamos ali no Bar da Iona tomar uma branquinha", convida Sabiá. O bar localizado em frente à pracinha é ponto de encontro e diversão dos garimpeiros. A garçonete atrás do balcão não esconde a personalidade ao falar seu nome com uma voz grossa e masculina. "Meu nome é Beatriz di Mônaco, algum problema?".
O mais jovem dos garimpeiros era Devais de Oliveira, de 27 anos. "Se quiserem eu mostro uma balsa aqui perto para vocês". Distante a oito quilômetros do centro de Telêmaco Borba, uma grande barranca dá acesso ao Rio Tibagi. "Essas terras são da Klabin. Ela não permite que a balsa fique ancorada na margem. Mas os outros donos de terra chegam a cobrar 10% do diamante arrecadado só para usar as barrancas", conta Devais.
A balsa estacionada no meio do rio abrigava sete garimpeiros. Depois de hesitar um pouco, Wilson pegou a canoa e veio até a margem. O sol a pino castigava. Dentro da balsa, o funcionamento era simples. Cada garimpeiro mergulhava levando a mangueira de respiração e uma draga para a sucção do cascalho. O motor trazia as pedras para cima da balsa, que eram armazenadas em latões. "Fico uma, duas horas embaixo da água. Depois que termino o serviço, pego meu tacho e vou para peneira", conta o cristaleiro Marcus Cirolo Gomes. Com medo do "olho gordo", o garimpeiro não deixa que mexam no cascalho antes de ser lavado, na certeza de que a pedra que ali estiver desaparecerá.
Peneirada
O trabalho de procurar diamante no cascalho é feito manualmente. Depois de quatro tipos de peneirada, José Ernandes observa as pedras com a precisão de veterano, na esperança de ver um brilhante refletido em seus olhos. "Já tenho 12 anos de garimpo e nunca trabalhei com mercúrio. Aqui, nós pegamos o cascalho da natureza e depois devolvemos para ela". Na balsa, o cenário é de uma casa improvisada. De um lado beliche com redes adaptadas para servirem de cama e do outro uma pequena cozinha. O prato do dia: feijão, arroz, farofa e carne refogada, bem servidos. "Quem traz comida, material de limpeza e outras coisas do mercado é o Carlinhos", conta o garimpeiro Isonir Cardoso.
Renan Carlinhos é o gerente da balsa. Ex-policial, foi contratado pelo dono para fiscalizar o garimpo. "Não sei quem vocês são mas aqui todo mundo tem uma história de vida, de luta e resistência. Sabemos que o garimpo é ilegal. Quando a polícia aparece, é o pobre garimpeiro que leva a pior. Ao contrário das mineradoras, que fraudam concessões para explorar o rio e acabam por destruir o Tibagi".
Acostumados com as incertezas, os garimpeiros vivem da sorte para sobreviver. Sorte de não serem flagrados pela polícia. Azar de quem não teve estudos e oportunidades. A música que os acompanha é o barulho do motor e do cascalho sendo sugado. A paisagem comum é a muralha de pínus e eucaliptos da Kablin. O destino de cada um depende do sonho que precede o diamante. Do brilho no olhar de quem segura a bateia e da pedra preciosa que talvez nunca virá.
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