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Negociação

Após acordo, governo passou a apoiar projeto

Alvo de críticas dos Ministérios da Justiça e da Saúde, o Projeto de Lei n.º 7.663 passou a contar com o apoio do governo federal nas últimas semanas. A mudança de direção do primeiro escalão do governo se deu após reuniões entre o autor do texto, o deputado Osmar Terra (PMDB-RS); o relator Givaldo Carimbão (PSB-AL); e a ministra-chefe da Casa Civil Gleisi Hoffmann. Após esses encontros, o governo conseguiu abrandar pontos do texto original – como o que limitou a ampliação da pena mínima aos traficantes vinculados a organizações criminosas (antes era para todos os traficantes) e o que diminuiu o tempo máximo de internação involuntária, de 180 para 90 dias.

Deputados petistas, porém, mantiveram-se contrários ao projeto. A emenda mais discutida era do PT e pretendia excluir todo o artigo que trata do aumento da pena a traficantes. Como resultado dessa pressão, o relator aceitou incluir novo atenuante na lei – prevendo que, se a quantidade de drogas apreendida "demonstrar menor potencial lesivo da conduta", a pena deve ser reduzida de 1/6 a 2/3.

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Ofício

Paraná formalizou pedido para distinguir usuário de traficante

Maria Teresa Ulile Gomes, secretária de Justiça do Paraná (Seju), encaminhou, em outubro do ano passado, ofício ao ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, solicitando regulamentação da quantidade de drogas que caracterizaria o usuário. No documento, a secretária cita resultados de uma pesquisa realizada pelo Seju, no ano passado, no Presídio Hildebrando de Souza, em Ponta Grossa. O levantamento constatou que, do total dos presos por tráfico no local, 61% haviam sido condenados após serem flagrados com 20 gramas ou menos de droga.

"Hoje, o Juiz não sabe se a quantidade de droga apreendida é compatível ou não com o consumo pessoal. A definição [das quantidades] estabeleceria um critério objetivo", afirma Maria Teresa.

Como forma de conter o avanço das drogas, a secretária defende a criação de vagas no regime semiaberto, onde haverá uma estrutura de ressocialização. "A maioria dos traficantes presos se assemelha mais a um usuário do que ao narcotraficante."

Quantidade

Diversos países têm legislações que estabele- cem a quantidade de drogas que caracte­riza o uso pessoal. O Uruguai, por exemplo, estuda proposta que permite posse de até 40 gramas de maconha. Nos Estados Unidos, estados como Washington e Colorado consideram 28,5 gramas o limite para uso próprio. No Brasil, a legislação não é clara.

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O projeto de lei que amplia a pena mínima para o tráfico de drogas não ajudará a distinguir o usuário do traficante e poderá sobrecarregar ainda mais um sistema que já conta com um déficit de 203 mil vagas. A proposta (n.º 7.663/2010), aprovada na Câmara dos Deputados, segue agora para o Senado. Nos últimos cinco anos, a quantidade de internos por tráfico no Brasil aumentou quase três vezes e hoje esse crime é responsável pela prisão de um em cada quatro condenados.

INFOGRÁFICO: Um em cada quatro presos está condenado por tráfico de drogas

De acordo com dados do Infopen, base de dados do Ministério da Justiça, em 2006 – ano no qual foi instituído o Sistema Nacional de Políticas Públicas Sobre Drogas (Sisnad) – havia 47.442 presos por tráfico de drogas nos presídios brasileiros – 14,7% do total. Em dezembro de 2012, essa quantidade pulou para 131.198 (25,5%).

O projeto aprovado foi o substitutivo do relator Givaldo Carimbão (PSB-AL) ao texto de autoria do deputado Osmar Terra (PMDB-RS). Nele, amplia-se a pena mínima de cinco para oito anos ao traficante que comanda organização criminosa – definida pela reunião de quatro pessoas ou mais. A punição máxima continua sendo de 15 anos de reclusão. No texto original, essa pena seria aplicada para qualquer traficante.

Segundo especialistas, mesmo com o atenuante, a medida poderá sobrecarregar as penitenciárias brasileiras. "Não existe definição clara do conceito de organização criminosa. Corremos o risco de todos entrarem como membro de facção", diz André Giamberardino, professor da Universidade Federal do Paraná e especialista em Direito Penal.

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André Mendes, professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV), prefere não opinar sobre a definição dada pelo projeto ao chefe de organização criminosa, mas critica o aumento da pena. "A Lei de Drogas já havia aumentado as penas mínimas para o tráfico de três para cinco anos e, mesmo assim, esse crime não diminuiu. Essa operação de agora pretende aumentar ainda mais e é muito duvidoso que isso provoque redução."

Especialistas ainda lamentam o fato de o projeto de lei não distinguir o usuário do traficante. A Lei 11.343/2006, a que criou o Sisnad, prevê penas mais brandas a usuários de drogas, mas não os classifica com clareza por não definir as quantidades que caracterizam o porte para uso pessoal.

"A guerra às drogas é uma ideologia falida e foi perdida. O projeto não ajuda na distinção entre usuário e traficante e, por isso, só ajudará a aumentar o déficit no sistema carcerário", diz Paulo Amarante, coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial, da Fiocruz.

CapacidadeInternação involuntária vai demandar um número maior de leitos

Prática já adotada em estados como São Paulo e Rio de Janeiro, a internação involuntária também é tema do Projeto nº 7.663/10. Caso a lei seja sancionada, Diogo Busse, diretor do Departamento de Políticas Públicas Sobre Drogas, da Secretaria Municipal Antidrogas, acredita que Curitiba teria de ampliar consideravelmente sua estrutura para receber esses usuários. "Temos 259 vagas para internação, levando em consideração as vagas nos Caps [Centros de Atenção Psicossocial] e nos hospitais Dia e Integral. Precisaríamos ampliar essa rede", afirma Busse, que é crítico em relação ao projeto. "Não nego a internação involuntária, mas ela precisa ser encarada como medida extrema e não como política pública. Não são todos os pacientes que precisam de internação." O diretor da prefeitura ponderou, porém, que uma eventual sanção presidencial ao texto não significa uma mudança radical na política de tratamento adotada pelo município.

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Pelo texto, a internação involuntária, dependerá de avaliação do tipo de droga, padrão de consumo e de pedido familiar ou de servidor público das áreas de saúde ou de assistência social. Essa internação será em ambulatórios, unidades de saúde ou hospitais gerais. A pessoa poderá ficar internada por no máximo 90 e será liberada a qualquer momento se esse for o desejo da família. O projeto ainda prevê o uso de comunidades terapêuticas para reinserção social de dependentes, mas apenas por meio de internações voluntárias.