Acostumada a ser vanguarda em soluções de mobilidade urbana, Curitiba passou por um período de poucas novidades na área. Agora, de uma vez só, aparece com duas mudanças que estão causando burburinho entre motoristas, ciclistas, pedestres e usuários de ônibus. A Via Calma, na Avenida Sete de Setembro, é a primeira proposta brasileira para incluir a bicicleta em uma via compartilhada. Já na Rua XV de Novembro, um trecho de 2,5 quilômetros está recebendo a primeira faixa exclusiva para ônibus da cidade, que deve beneficiar 11 linhas de ônibus.
Embora ainda não tenham sido oficialmente inauguradas, a pintura das faixas, os tachões e as placas de sinalização já instaladas nas vias têm gerado dúvidas sobre como usar os espaços. Para o presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), Sérgio Póvoa Pires, essas mudanças refletem uma opção de priorizar o ser humano. "A administração municipal apostou que a tolerância, espírito de cidadão e a possibilidade de usufruir a cidade vencem", comenta.
E as duas intervenções são apenas o começo. A tendência é de que mais vias calmas e faixas exclusivas para ônibus ganhem espaço na cidade. "A médio prazo, vamos ter o metrô e a parte de cima, onde o expresso está, será um parque linear e a ciclovia terá outra função. Isso vai mudar a paisagem urbana", diz Pires. O Ippuc já tem projetos para implantar a Via Calma em outras ruas por onde passam as canaletas do biarticulado. Caso a avaliação da iniciativa seja positiva, a Avenida João Gualberto será a próxima a receber essa intervenção.
Avenida central terá máxima de 30 km/h
A Via Calma, localizada na Avenida Sete de Setembro, ainda não foi inaugurada, mas já começou a gerar conflito entre motoristas e ciclistas. O trecho de 6,3 quilômetros entre a Rua Mariano Torres e a Praça do Japão está quase todo sinalizado e será inaugurado em breve. Por ali, as bicicletas têm uma faixa preferencial de tráfego por todo o lado direito da rua. A aposta é no compartilhamento do espaço com os carros. Qualquer veículo que trafegue na avenida terá como velocidade máxima 30 km/h.
Os motoristas alegam que o trânsito, até então conturbado, ficou pior. "Eu acho que atrapalhou muito porque antes era possível fazer duas filas de carros, e agora não", relata o taxista Moacir Janiska dos Reis, de 42 anos. A mesma opinião tem o motorista José Teixeira, 50 anos. "Olha, o trânsito ficou péssimo e estou atendendo 20% menos. A prefeitura deveria ter conversado com a gente antes."
A possibilidade de dois carros trafegarem no trecho é rebatida pela prefeitura. Para o coordenador do projeto de ciclomobilidade do Ippuc, Antonio Miranda, o argumento é falho porque a via é estreita. Para dois veículos trafegarem ali, a velocidade já seria naturalmente reduzida, sob risco de colisão. A implantação da Via Calma, com espaço para os ciclistas, apenas reforça o conceito do sistema trinário, em que há duas vias rápidas de acesso ao bairro e centro e uma via estrutural mais lenta ao centro.
"A bicicleta vai andar como outro veículo qualquer, mas a prioridade é para ela. O motorista pode circular na área na ausência do ciclista, mas não pode se aproximar da linha vermelha quando o semáforo estiver fechado, tem de dar espaço para que o ciclista se posicione", explica Miranda. Danilo Herek, coordenador de mobilidade urbana da Secretaria de Trânsito (Setran), ressalta que a faixa é preferencial ao ciclista, com exceção das bicicaixas, pintadas de vermelho. "O carro pode transitar ali para desviar, mas não a quadra toda", diz.
Já os ciclistas, que utilizavam as canaletas de ônibus para locomoção atitude passível de penalidade e multa, de acordo com o artigo 255 do Código Brasileiro de Trânsito , estão pulando de alegria. "Foi um sonho realizado. Meu tempo foi otimizado em 80%", conta o operador de máquina da Coca Cola Marcos Roberto da Luz, 43 anos, que usa a avenida para fazer pagamentos. Ele afirma, porém, que alguns condutores ainda não respeitam as delimitações. Mesmo com o espaço preferencial, Herek afirma que é um desafio tirar o ciclista da canaleta, mas o órgão também trabalha para chamá-los para ocupar o espaço na via acalmada.
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