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Lei do silêncio vale para vítimas e governo

Segundo informações extra-oficiais de policiais civis, os municípios mais violentos da região metropolitana de Curitiba (RMC) são Colombo, São José dos Pinhais, Pinhais, Almirante Tamandaré, Campina Grande do Sul e Piraquara. A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), por sua vez, não confirma a informação e não divulga estatísticas da criminalidade que comprovem ou refutem esse "ranking".

Na semana passada, a reportagem esteve na regiões apontadas como mais problemáticas em Colombo (os bairros Alto Maracanã, Guaraituba, São Miguel e Roseira) e constatou que a lei do silêncio impera nestes locais. "Dá até medo de falar", comentou a dona de uma mercearia. Um grupo de moradoras disse que era perigoso até mesmo ser visto perto do carro da reportagem. "É que sempre tem alguém (bandidos) de olho", disse uma delas.

Em Colombo, somente o bairro Alto Maracanã possui Conselho Comunitário de Segurança (Conseg). "90% dos crimes são relacionados ao tráfico de entorpecentes", afirma o presidente do conselho, Isaías de Oliveira Fonseca.

Juraci Ambrósio, presidente do Conseg do bairro Cachoeira, em Almirante Tamandaré, reclama da pouca presença policial na região. "Nosso problema é de viatura. São poucas e as que temos estão com problemas sérios. Não tem projeto Povo, só Patrulha Escolar." Segundo Ambrósio, os crimes mais comuns na região são furtos e assaltos, mas a população não tem procurado a polícia para registrar as ocorrências. "A pessoa fica com medo, às vezes conhece o bandido e tem medo de levar adiante. Os bandidos são sempre os mesmos."

Quadro geral: assaltos, tráfico e assassinatos

Assaltos a ônibus e a estabelecimentos comerciais, tráfico de drogas e homicídios. Estas são as principais ocorrências registradas na região metropolitana de Curitiba (RMC). No dia 24 de janeiro, a morte do motorista de ônibus Ricardo Germano Hopaloski, 37 anos, fez com que a população de Campina Grande do Sul fechasse durante sete horas a BR-116. Uma semana depois, um novo assalto voltou a traumatizar o cobrador Cristian da Cruz, 21, que trabalhava com Hopaloski no dia 24.

Casos como esses se repetem: o número de assaltos a ônibus cresceu 26% no ano passado em relação a 2005. Segundo o Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Curitiba (Sindimoc), das dez linhas mais assaltadas no ano passado, oito passam pela região metropolitana de Curitiba.

No último dia 2, até o governador Roberto Requião admitiu que a situação na RMC é crítica. Durante a inauguração da nova sede da Polícia Federal em Curitiba, Requião disse que os homicídios "ocorrem às dezenas" na região.

Um exemplo de como a falta de estrutura policial pode prejudicar uma investigação é o assassinato da menina Giovana dos Reis Costa, 9 anos, em abril do ano passado, em Quatro Barras. O crime chocou pela brutalidade (o corpo de Giovana foi abandonado em um matagal, dentro de um saco de lixo). Um suspeito chegou a ser preso na delegacia de Quatro Barras, mas foi solto por falta de provas. Ele e outros dois acusados (sua mãe e sua namorada) estão foragidos.

Casos

Segundo o Conseg de São José dos Pinhais, entre janeiro e junho do ano passado, foram registrados 120 homicídios e tentativas de homicídio na cidade. A Sesp informou que pretende implantar uma Patrulha Rural na cidade.

A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) pretende reforçar a segurança na região metropolitana de Curitiba (RMC). O projeto prevê a criação de um novo batalhão da Polícia Militar na região (que passará a ter dois batalhões), a ampliação do projeto Povo (Policiamento Ostensivo Volante) e a contratação de policiais civis, que reforçarão as delegacias dos municípios mais importantes da região. A reestruturação ainda está em fase de estudos e deverá ser anunciada em breve pelo secretário da Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari.

A criação de um novo batalhão da PM é uma antiga reivindicação de moradores dos municípios mais afastados de São José dos Pinhais, onde fica o 17.° Batalhão da PM, atualmente o único que atende os 24 municípios da RMC. A idéia é dividi-los em duas áreas (norte e sul), o que daria mais agilidade ao trabalho policial. A implantação da unidade metropolitana depende de autorização da Assembléia Legislativa e da abertura de concurso público para a contratação de policiais.

Outra proposta é expandir o Povo de acordo com a densidade populacional das cidades. Atualmente, o Policiamento Ostensivo Volante conta com 39 viaturas e está presente em apenas nove cidades da região (Almirante Tamandaré, Araucária, Campina Grande do Sul, Campo Largo, Colombo, Fazenda Rio Grande, Pinhais, Piraquara e São José dos Pinhais). De acordo com a Sesp, nos próximos dias o serviço será incrementado por 142 viaturas e 278 motocicletas para Curitiba e região metropolitana. Em relação à Polícia Civil, a meta até o fim do ano é contratar 542 policiais para atuarem em todo o estado. A Sesp não informou quantos policiais serão destinados à RMC.

Necessidade

Presidentes de Conselhos Comunitários de Segurança (Consegs) dos municípios da RMC apontam como urgente o reforço do policiamento na região, que nos últimos meses registrou várias ondas de violência. Segundo eles, a principal causa da sensação de insegurança vivida hoje na RMC é a baixa capacidade da Polícia Civil de investigar e solucionar casos. Segundo dados de 2006 da Secretaria Nacional da Segurança Pública (Senasp), o Paraná tem um policial civil para cada grupo de 2,4 mil habitantes (o Distrito Federal, por exemplo, tem um policial para cada 453 habitantes).

A situação é agravada pelo alto número de presos abrigados nas delegacias da região. "Ao invés de os policiais fazerem o trabalho de investigação, têm de cuidar da carceragem", diz o deputado estadual Tadeu Veneri (PT), membro da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa. Segundo a Sesp, em 2005 foram contratados 200 auxiliares de carceragem para as delegacias onde o problema era mais urgente. O objetivo é fazer um trabalho semelhante ao realizado em Curitiba, onde apenas três dos 13 distritos policiais ainda recebem presos. A secretaria, no entanto, não soube informar quantos detentos há atualmente nas delegacias da RMC.

O eventual aumento do policiamento é bem recebido pelos Consegs. "Curitiba tem uma viatura e dois policiais para cada bairro. Pinhais, por exemplo, tem duas viaturas para 13 bairros", compara Sérgio Skiba, presidente da União Estadual dos Conselhos de Segurança (Uniconseg) e do Conseg de Pinhais.

A situação atual tem levado a um problema mais grave: a falta de confiança da população nas instituições policiais. "A polícia precisa ir com mais humildade para a periferia", afirma José Augusto Soavinski, diretor de relações com a comunidade da Uniconseg. "Os moradores não têm respeito, têm medo. Ela discrimina, já chega dando borrachada. E quem dá com a língua nos dentes (denuncia os criminosos) não fica vivo 24 horas."

Com desconfiança na polícia e medo dos bandidos, são muitas as vítimas da violência que deixam de registrar ocorrências, como diz o advogado Jaiderson Rivarola, primeiro secretário do Conseg de São José dos Pinhais. "As pessoas são assaltadas, sofrem as maiores atrocidades e não registram queixa. Não buscam mais a Polícia Civil, porque não têm resposta ou não são atendidas." Segundo a Sesp, o policial civil que se negar a registrar uma ocorrência deve ser denunciado pelo telefone 0800-41-0900.

Obscuridade

Nos últimos anos tem sido difícil saber, com base nos números, quais são as regiões mais perigosas e os crimes mais comuns na RMC, já que a Sesp não divulga as estatísticas que diz dispor. A secretaria, inclusive, deixou de repassar estatísticas de violência para a Senasp. Em outubro do ano passado, um estudo divulgado pela secretaria nacional colocou, equivocamente, Curitiba como capital mais violenta do país. Após contestação de Delazari, a Senasp admitiu o erro. Depois disso, não obteve mais os números oficiais da violência no Paraná.

De acordo com a Sesp, no final do ano passado o Colégio Nacional dos Secretários de Segurança Pública do Brasil decidiu que as secretarias não repassariam mais dados à Senasp, já que os estados têm maneiras diferentes de coletar e tabular estatísticas. O repasse dependeria de o governo federal definir "uma estratégia de coleta e divulgação que permita a comparação justa entre os estados", informa a secretaria.

Vida real

Mesmo sem os números, é possível ter uma idéia de como anda a violência na região metropolitana. Os casos de mortes que chegam ao Instituto Médico Legal (IML) de Curitiba mostram que, em 15 dias (de 16 a 30 de janeiro), 24 pessoas foram assassinadas na RMC (22 delas baleadas). As cidades com mais homicídios no período foram São José dos Pinhais (nove mortes), Almirante Tamandaré (seis) e Fazenda Rio Grande (quatro).

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