O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), quer a tramitação rápida de uma proposta que praticamente cria um novo Código Civil para o país, alterando o atual em sua essência e em grande parte de toda sua estrutura. Se aprovado tal como está agora, o documento promoveria uma revolução legal no Brasil, atendendo a demandas do abortismo, do identitarismo woke e dos defensores da ideologia de gênero, e alterando radicalmente os conceitos de família e de pessoa na legislação.
Na semana passada, uma comissão de juristas formada pelo Senado publicou o relatório de um anteprojeto para mudar o Código Civil, que está aberto para receber emendas. Em abril, o documento começa a tramitar na Casa. Algumas das mudanças mais graves previstas incluem:
- A definição do bebê em gestação como "potencialidade de vida humana pré-uterina ou uterina", que introduz no Código Civil a noção de que o bebê, antes de nascer, não teria vida humana.
- O reconhecimento de uma "autonomia progressiva" de crianças e adolescentes, que devem ter "considerada a sua vontade em todos os assuntos a eles relacionados, de acordo com sua idade e maturidade" – o que abriria caminho, por exemplo, para facilitar cirurgias de redesignação sexual sem a necessidade de anuência dos pais, entre outras coisas.
- A previsão de que o pai perderá na Justiça a sua autoridade parental caso submeta o filho a "qualquer tipo de violência psíquica" – a lei não especifica as atitudes classificáveis como "violência psíquica".
- A previsão de que os animais de estimação podem compor "o entorno sociofamiliar da pessoa", e que da relação afetiva entre humanos e animais "pode derivar legitimidade para a tutela correspondente de interesses, bem como pretensão reparatória por danos experimentados por aqueles que desfrutam de sua companhia" – o que elevaria o status jurídico da relação entre pessoas e animais, abrindo espaço para o reconhecimento legal daquilo que se tem chamado de "família multiespécie".
- A introdução do conceito de "sociedade convivencial", que poderia abrir caminho para abrigar na legislação brasileira, por exemplo, uniões poliafetivas (veja com mais detalhes no PDF ao fim deste artigo).
A comissão de juristas que elaborou o anteprojeto é presidida por Luis Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça e ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A relatoria do documento é de Rosa Maria de Andrade Nery e Flávio Tartuce.
As figuras mais diretamente envolvidas na elaboração do documento que está prestes a tramitar no Senado têm chamado o projeto atual de "revisão" ou "atualização" do Código. Entretanto, as mudanças são tão substanciais – o documento com as propostas tem 293 páginas – que o próprio site oficial do Senado já chamou o projeto de "novo Código Civil".
Criar novo Código Civil é medida rara; versão atual tem só duas décadas
O Direito Civil é o ramo do Direito em que se estruturam todas as relações estabelecidas pelas pessoas do nascimento à morte, e em que se discutem conceitos como os de pessoa, casamento, família e propriedade do ponto de vista legal. Por isso, o Código Civil é essencial dentro do ordenamento político e serve de base conceitual para boa parte das outras legislações do país.
Não por acaso, as democracias costumam preferir uma abordagem cautelosa em qualquer tentativa de revisão do Código Civil, com longo escrutínio público, participação dos diversos setores da sociedade civil e envolvimento direto de parlamentares com diferentes visões. A discussão da proposta atual, contudo, tem sido acelerada por figuras como Pacheco e Salomão.
O presidente do Senado já deixou claro no início do ano que o Código Civil seria uma de suas prioridades para 2024. A aprovação do documento é vista como um possível legado da sua Presidência, que o chancelaria, entre outras coisas, para indicar o próximo mandatário da Casa. A pressa por aprovar o Código também tem outra motivação: evitar a atenção e a resistência das bancadas conservadoras, que podem embargar o projeto.
O Brasil só teve, até hoje, dois Códigos Civis: o de 1916 e o atual, que é de 2002. Para a produção do Código Civil atualmente em voga, houve décadas de maturação e debate amplo. O anteprojeto do documento de 2002 começou a ser elaborado no fim da década de 1960, o que reflete a importância que era dada à parcimônia na reformulação do documento que rege as relações civis no país. Em outros países, a situação tende a ser semelhante. Na Alemanha e na França, reformas recentes de menor envergadura que a que deve tramitar no Senado brasileiro foram debatidas por mais de dez anos.
A abertura para sugestões sobre o anteprojeto do novo Código Civil foi feita na semana passada e terá seu prazo encerrado na sexta – ou seja, o Senado brasileiro deu somente duas semanas para a sociedade discutir o documento.
Veja um resumo das mudanças que podem impactar temas como vida, família e casamento
O arquivo em PDF abaixo contém um resumo das principais mudanças propostas no anteprojeto do novo Código Civil em assuntos relacionados a pessoa, vida, família e casamento. Confira:
- Pacheco pede para aguardar decisão do STF antes de pautar PEC das drogas
- Barroso diz que criminalização do aborto é “má política pública”
- “Divórcio surpresa” e “relações fluidas”: novo Código Civil subverte leis do casamento
- Novo Código Civil pode viabilizar reconhecimento jurídico de “famílias multiespécie”
O texto dizia anteriormente que a comissão de juristas criou um anteprojeto para mudar o Código Civil. Na verdade, o que a comissão já criou foi o relatório para o anteprojeto, que só se tornará oficialmente um anteprojeto em abril. Até lá, o documento pode receber emendas.
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