O tão aguardado novo Código de Processo Civil (CPC) começou o mês de junho em meio a muita movimentação. Nesta semana, o texto final do anteprojeto foi aprovado pela comissão de juristas designada pelo Senado Federal para elaborar o novo CPC sofrendo críticas vindas de dentro da própria comissão. "Constatei algumas imperfeições", escreveu o desembargador Elpídio Donizetti, um dos juristas escolhidos para elaborar o anteprojeto, em ofício encaminhado aos seus pares. A manifestação de Donizetti foi rebatida por nota oficial da comissão do novo CPC, segundo a qual o desembargador tece "críticas infundadas" ao anteprojeto leia matéria abaixo.Polêmica à parte, fato é que muita expectativa cerca o surgimento de um novo Código de Processo Civil o que vige atualmente data de 1973 e já sofreu tantas alterações (64, até agora), que carrega o apelido de "colcha de retalhos". Afinal, o CPC é o principal regulador do ambiente processual, e, tendo em vista as pilhas de processos que se acumulam no Judiciário brasileiro, parece evidente que o atual código não atende plenamente às necessidades atuais. Assim, o foco da comissão de juristas, ao elaborar a nova legislação, foi a racionalização do processo e a consequente celeridade processual. "O novo Código de Processo Civil vai reduzir em 70% o tempo do julgamento dos processos que se referem a questões repetitivas e em 50% os casos tradicionais. É um código para durar meio século", disse, por ocasião da aprovação do anteprojeto, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luiz Fux, presidente da comissão que elaborou o texto.
De fato, a palavra de ordem da comissão do novo CPC parece ter sido "reduzir". Para se reduzir o tempo de duração do processo, reduziu-se o número de recursos. Assim, pretende-se extinguir os embargos infringentes e diminuir a utilização dos embargos de declaração e dos agravos o agravo de instrumento ficaria restrito à impugnação, em primeiro grau, das decisões de urgência e de mérito, cabendo uma única impugnação da sentença final. Reduziu-se também o número de artigos do Código dos atuais 1.220 para 1.025.
Repetitivos
Mas a principal redução seria a do número de processos analisados em casos que tratam de questões repetitivas, por meio do que se chamou de "incidente de resolução de demandas repetitivas". Graças a esse incidente, será possível selecionar um número reduzido de processos-piloto em ações de massa para serem julgados pelos tribunais (estaduais, regionais ou superiores) os demais ficam parados. Uma vez julgados os processos-piloto, a decisão adotada se aplica a todos os outros casos idênticos, novos e em trâmite. Na prática, o novo instrumento adapta o previsto pela Lei dos Recursos Repetitivos, utilizado exclusivamente pelo STJ, para os demais tribunais.
Na próxima terça-feira, o documento será entregue ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). No dia seguinte, o ministro Luiz Fux, segundo o qual os efeitos do novo CPC começarão a ser sentidos um ano após sua vigência, debaterá a proposta de novo código com os senadores membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. E o que hoje é um anteprojeto passará a ser um projeto de lei. Se a intenção do novo CPC é dar mais celeridade à Justiça, resta torcer para que o Congresso também seja célere na apreciação do novo Código.
Desembargador critica anteprojeto
Nem ainda virou projeto de lei e o novo CPC já causa polêmica dentro do próprio grupo de juristas encarregado de elaborá-lo. Nesta semana, o anteprojeto foi alvo de duras críticas em ofício encaminhado à comissão do novo CPC pelo desembargador Elpídio Donizetti (do Tribunal de Justiça de Minas Gerais), presidente da Associação Nacional de Magistrados Estaduais (Anamages) e, ele próprio, membro da comissão. Primeiramente, Donizetti afirma ter recebido a versão final do anteprojeto apenas "no findar" do dia 30 de maio (o texto foi aprovado pela comissão no dia 1.º de junho), não tendo tempo para analisar mais profundamente o documento. "O tempo exíguo não me permitiu acurada análise de todos os 1025 artigos que integram o anteprojeto", escreve. Ainda assim, o desembargador levanta erros formais e imperfeições no texto.
O centro da discórdia é a forma como o novo Código estaria tratando os magistrados, representados por Donizetti. Detalhe: dos 12 membros da comissão, seis foram ou são magistrados. "A visão do magistrado como sujeito desconhecedor das leis e dos princípios que regem o processo, conquanto infelizmente reine na mente dos integrantes desta comissão, jamais poderá ser levada para um código democrático de processo", afirma o ofício. Para Donizetti, o anteprojeto do novo CPC estaria avançando equivocadamente em matérias de Direito Administrativo, alheias ao Processo Civil, ao tratar "de questões ligadas aos deveres e penalidades aplicáveis aos magistrados" que já são abordadas pela Lei Orgânica da Magistratura (Loman).
Por outro lado, segundo o desembargador, o texto do novo Código não se preocuparia com o mesmo rigor de regular a conduta de integrantes de outras carreiras, revelando "a desconfiança e o ânimo controlador desta Comissão em face da atividade judicante". E vai adiante: "Também questiono aos ilustres pares: por que não estender o tratamento dispensado aos magistrados aos demais agentes, públicos e particulares, que participam do processo? Afinal, pau que dá em Chico também dá em Francisco. Recuso-me a admitir que esta seja uma comissão anti-magistratura", oficia.
O presidente da Anamages reclama ainda que "as teratologias apontadas" já haviam sido destacadas por ele anteriormente, "mas que ou não foram lidas ou simplesmente desprezadas, o que dá no mesmo". E termina o documento afirmando que os magistrados brasileiros cerrarão fileiras "a fim de restaurar o equilíbrio e a dignidade da função judicante no âmbito do Congresso Nacional".
Resposta
A resposta da comissão de juristas ao ofício de Donizetti veio por meio de nota publicada anteontem no site www.senado.gov.br/sf/senado/novocp. Assinada pelo presidente em exercício da comissão, o consultor-geral do Senado, Bruno Dantas, a nota comunica ter sido aprovada uma moção de apoio ao ministro Luiz Fux, "pela condução democrática, isenta e plural dos trabalhos, em resposta à carta divulgada pelo desembargador Elpídio Donizetti Nunes, na qual se tecem críticas infundadas à direção dos trabalhos e às idéias preponderantes nos debates da comissão". Segundo a nota, "as proposições que prevaleceram nos debates são fruto do amadurecimento das teses levadas ao Plenário da Comissão por todos os seus membros, e acolhidas em votação democrática e participativa da maioria do Colegiado".
Serviço:
No mesmo dia em que ocorre a entrega do anteprojeto do novo CPC no Senado, próxima terça-feira (8), acontece em São José dos Pinhais a palestra Novos rumos do processo civil brasileiro, ministrada pelo advogado Luiz Rodrigues Wambier, um dos principais processualistas do país. A palestra será realizada às 19 horas, na Câmara Municipal de São José dos Pinhais Rua Veríssimo Marques, 699. Inscrições na Faculdade Metropolitana de Curitiba (Famec) Avenida Rui Barbosa, 5.881, em São José dos Pinhais. Informações: 0800-415881.