“Estamos prendendo várias vezes as mesmas pessoas. Enquanto isso, tivemos queda nos crimes de furto qualificado, de roubos e de homicídios” - Valéria Padovani, delegada de Ponta Grossa (PR)| Foto: Josue Teixeira / Gazeta do Povo

Especialistas

Reincidência depende de outros fatores

O professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e advogado criminalista Daniel Laufer acredita que outros fatores estão relacionados à reincidência de crimes classificados dentro da lei da prisão preventiva. "O cidadão que furta não está cometendo o delito porque foi solto ontem. Há uma série de fatores envolvidos, como o fato de o ex-detento não ter acesso à reinserção na sociedade", considera.

Para ele, a modificação no Código de Processo Penal foi "lúcida" por considerar o risco da superlotação das cadeias brasileiras. "O Brasil não tem local para albergar todos os presos. Para quem pratica um furto simples, o local não é a prisão. Ele sai de lá devendo favor a presos perigosos", opina.

Impacto

Segundo o especialista em direito processual e professor da área na Universidade Federal do Paraná Jacinto Coutinho é difícil traçar uma relação entre a nova lei e a incidência de furtos. O juiz da 2ª Vara Criminal de Ponta Grossa, André Luiz Shafranski, acredita também que a modificação no CPP não trouxe alterações práticas. "Os juízes já determinavam outras medidas que não a prisão preventiva para os casos de crimes com penas inferiores a quatro anos", explica. (MGS)

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Ponta Grossa - A lei da prisão preventiva, como ficou conhecida a Lei n.º 12.403, completou seis meses em janeiro deste ano e ainda levanta discussões. Isso porque, para alguns delegados, ela flexibilizou a prisão feita em flagrante e, consequentemente, incentivou que mais crimes contra o patrimônio fossem cometidos. Hoje, quando a pessoa é presa em flagrante por cometer um crime cuja pena seja não exceda quatro anos, ela pode entrar em liberdade depois de até 48 horas para esperar, em casa, a sentença. A mesma lei prevê alguns condicionantes, como o acusado não ter sido condenado anteriormente por nenhum crime doloso e não oferecer riscos à sociedade.

"A nosso ver ela [a lei] é um retrocesso. A legislação tem que ser cada vez mais endurecida e não afrouxada. Fica a sensação de impunidade para nós policiais e para a vítima", afirma o delegado da Furtos e Roubos, em Curitiba, Rodrigo Brown. Especialistas, porém, dizem que ainda é cedo para tirar conclusões (veja nesta página).

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A "nova" lei modificou o Código de Processo Penal (CPP) e garantiu aos juízes um leque de 14 medidas cautelares em troca da prisão preventiva de pessoas detidas por crimes considerados leves. No caso da prisão em flagrante, o juiz aplica outras medidas, como o monitoramento eletrônico ou a suspensão de viagens. A legislação foi alterada na tentativa de reduzir a superlotação no sistema carcerário, que concentra presos que ainda aguardam condenação.

A Secretaria de Estado da Justiça no Paraná não apresentou balanço semestral sobre o tema, mas informou que 1,6 mil pessoas foram encarceradas no ano passado pela prática de furto (crime leve). Esse número representa 10,64% da população carcerária no estado.

Como a prisão, após a reforma do CPP, deixou de ser a alternativa para indivíduos que cometem alguns tipos de crime, a delegada de Ponta Grossa, nos Campos Gerais, Valéria Padovani, afirma que "vem prendendo várias vezes as mesmas pessoas." O furto simples, que é praticado sem o uso de violência ou de abuso de confiança da vítima, e cuja pena não ultrapassa quatro anos, é um exemplo. Os registros desse tipo de crime aumentaram 28% em janeiro desse ano, em Ponta Grossa, em comparação à janeiro do ano passado. Foram 155 furtos simples contra 121 do mesmo período do ano passado. "Enquanto isso, tivemos queda nos crimes de furto qualificado, de roubos e de homicídios", diz Valéria.

Impunidade

O relatório anual da violência no Paraná, divulgado no final de janeiro pela Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), demonstra que o segundo semestre do ano passado, quando a nova lei já estava em vigor, registrou um aumento de 2,6% nos casos de furtos consumados (incluindo furtos simples e qualificados) em relação ao segundo semestre de 2010.

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Na comparação entre semestres do mesmo ano, a alta também foi registrada. Nos primeiros seis meses de 2011 ocorreram 74,7 mil furtos consumados, enquanto que, no segundo semestre, o índice subiu para 76,8 mil (2,7% a mais).